O coordenador humanitário da ONU para o território palestino ocupado, Muhannad Hadi, afirmou nesta quarta-feira (12/03) que a população palestina na Faixa de Gaza está “em uma situação desesperadora” enquanto aguarda as negociações para a segunda fase do cessar-fogo entre Israel e o Hamas.
“Recebemos esperança quando o cessar-fogo foi alcançado. Começamos a trazer mais ajuda de todas as direções, mas agora estamos esperando por uma segunda rodada de negociações e esperamos que resultem em algo frutífero”, declarou em entrevista à Al Jazeera.
Segundo o agente humanitário, os civis palestinos querem “um cessar-fogo permanente para terem a chance de restabelecer suas vidas”. “As pessoas agora estão extremamente preocupadas com as negociações”, completou.
O também coordenador especial adjunto para o Processo de Paz no Oriente Médio falou ainda que a trégua possibilita a entrada de alimentos, que estão em escassez no enclave. A entrada de assistência humanitária em Gaza está interrompida há mais de nove dias consecutivos, com todas as passagens fechadas para a entrega de cargas.
“Não é como se as pessoas tivessem a oportunidade de estocar alimentos. As pessoas não têm renda, na verdade não há moeda, não há dinheiro em Gaza, e é só um desafio atrás do outro”, acrescentou Hadi.
Durante sua entrevista com a emissora catari, o funcionário da ONU declarou que nunca viu “nada parecido” como a situação em Gaza. “Nunca estive em um lugar onde tudo é necessário, onde banheiros eram o tópico [de discussão] de todos. Muitas vezes, as mulheres me disseram que, se têm acesso a água potável, não a bebem – nem mesmo as grávidas – porque ir ao banheiro é uma agonia, é uma jornada que pode acabar em uma catástrofe”, afirmou Hadi, descrevendo Gaza como “dois milhões de histórias tristes”.
O agente ainda alertou contra um “desastre” na Faixa de Gaza caso o bloqueio de eletricidade anunciado por Israel no último domingo (09/03) não seja suspenso.
O restabelecimento da energia elétrica no enclave palestino já foi exigido inclusive pelos familiares de reféns israelenses que ainda estão em Gaza. Segundo eles, a medida coloca “seus entes queridos em perigo”.
“Eu nem quero imaginar o cenário em que as negociações de cessar-fogo em Doha fracassem. Como humanitário, não consigo imaginar que seremos confrontados com essa situação”, concluiu.

Entrada de assistência humanitária em Gaza está interrompida há mais de nove dias consecutivos
OMS alerta contra poliomielite
A interrupção do cessar-fogo também arrisca a saúde pública em Gaza, em especial sobre a poliomielite, doença provocada por um vírus que pode levar à paralisia infantil.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), na última campanha, realizada no final de fevereiro, cerca de 550 mil crianças palestinas foram vacinadas contra a doença. Contudo, é essencial que o cessar-fogo seja alcançado para evitar o risco de propagação do vírus.
Hamid Jafari, diretor de erradicação da pólio na OMS, informou que apesar de 95% da meta de vacinação ter sido realizada em Gaza, ainda há detecção do vírus da poliomielite nas amostras de esgoto do enclave palestino.
“Esperamos que esse cessar-fogo realmente dure, porque não se trata apenas da poliomielite, mas da sobrevivência de crianças e comunidades”, declarou à Al Jazeera.
Corte de ajuda pode reverter cessar-fogo
O subsecretário-geral de Assuntos Humanitários da ONU, Tom Fletcher, pediu na última terça-feira (11/03)que a entrada de ajuda humanitária em Gaza seja retomada imediatamente, ressaltando que quaisquer atrasos adicionais “reverterão ainda mais qualquer progresso alcançado durante o cessar-fogo”. Fletcher também apelou a ambas as partes pela manutenção da trégua e libertação dos reféns.
Por sua vez, Phillipe Lazzarini, comissário-geral da Agência da ONU de Assistência aos Refugiados Palestinos (UNRWA) expressou atual no enclave que “a situação é semelhante à que prevaleceu em outubro de 2023”, após os ataques do Hamas contra Israel e as subsequentes ações militares na Faixa de Gaza.
Lazzarini destacou ainda a crise na Cisjordânia, onde as operações de segurança israelenses levaram ao maior deslocamento de palestinos desde 1967. Cerca de 40 mil pessoas, muitas delas refugiadas, foram forçadas a fugir de suas casas, com comunidades inteiras esvaziadas devido à intensificação das atividades militares.
(*) Com ONU News e informações da Al Jazeera