Oscar pede ‘sinceras desculpas’ por ignorar violência sofrida por cineasta palestino
Diretor de 'Sem Chão' denunciou que posicionamento veio 'após pressão'
Dias após o sequestro do cineasta palestino Hamdan Ballal, um dos diretores do documentário Sem Chão (No Other Land), por colonos e soldados israelenses, a Academia do Oscar se desculpou por ignorar a violência.
Veiculado por outro diretor de Sem Chão, o israelense antissionista Yuval Abraham, o comunicado da Academia, primeiramente lamentou o fato de “não ter reconhecido” Ballal e o filme “por nome” em seu comunicado anterior.
The American Academy just apologized to Hamdan for not mentioning his name after he was attacked by Israeli settlers. This came after intense pressure from 600+ principled academy members appalled by the initial response. pic.twitter.com/RwRD6BGUg9
— Yuval Abraham יובל אברהם (@yuval_abraham) March 28, 2025
O texto assinado pelo CEO e a presidente da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, Bill Kramer e Janet Yang, respectivamente, faz referência ao primeiro posicionamento da entidade, emitido na última quarta-feira (24/03).
Sem mencionar o nome de Ballal, que foi torturado pelos sionistas, o comunicado original apenas dizia que a Academia “condena que artistas sejam prejudicados ou suprimidos por causa de seu trabalho ou opiniões”.
O texto que evitou emitir uma opinião sobre a violência sofrida por Ballal também disse “compreender” quando pedem que a Academia se posicione sobre “eventos sociais, políticos e econômicos”, mas alegou que o Oscar representa “cerca de 11.000 membros globais com muitos pontos de vista”.
O Oscar ainda pediu “sinceras desculpas ao senhor Ballal e a todos os artistas que não se sentiram apoiados por
nossa declaração anterior”.
“Queremos deixar claro que a Academia condena a violência desse tipo em qualquer lugar do mundo. Abominamos a supressão da liberdade de expressão em qualquer circunstância”, finalizou o comunicado.
Por sua vez, Abraham afirmou que a resposta da Academia só aconteceu “após intensa pressão de mais de 600 membros íntegros da academia, horrorizados com a resposta inicial”.
O diretor israelense aproveitou para denunciar um novo ataque contra a aldeia palestina de Masafer Yatta, na Cisjordânia ocupada. “A vítima, Qussai, 17, não é um vencedor do Oscar, então as pessoas não vão ouvir sobre isso, mas aqui está o vídeo de colonos mascarados espancando-o com barras de metal enquanto sua mãe grita ao fundo”.
by the way, today another attack happened in masafer yatta. the victim, qussai, 17, isn’t an oscar winner, so people won’t hear about it, but here’s the video of masked settlers beating him with metal rods as his mom screams in the background, just in case pic.twitter.com/7Wh16Ugg7J
— Yuval Abraham יובל אברהם (@yuval_abraham) March 28, 2025

Em vídeo veiculado pela Fepal, Ballal afirma que esta foi “a primeira vez” que foi atacado “tão brutalmente”
Ataque ‘foi para matar’
Em vídeo veiculado pela Federação Árabe Palestina (Fepal) na última quarta-feira (26/03), Ballal afirma que esta foi “a primeira vez” que foi atacado “tão brutalmente” e “exposto a tamanha truculência”.
“Esse ataque foi feito para me matar. E foi feito depois que ganhei o Oscar. Eu não esperava ser submetido a um ataque tão brutal. Mas penso que depois do prêmio, nos tornamos o foco dos ataques. É uma ameaça, inclusive contra nossas vidas”, declarou o palestino.
O profissional de cinema foi sequestrado na segunda-feira (24/03) e libertado na terça (25/03). A denúncia original foi feita pelo seu colega Yuval Abraham. Conforme o relato do cineasta israelense, Ballal estava “sangrando”, apresentava “ferimentos na cabeça e no estômago”, e nessas condições teria sido sequestrado e levado a um local desconhecido.
“Após o ataque, Hamdan foi algemado e vendado a noite toda em uma base do exército enquanto dois soldados o espancavam no chão, segundo sua advogada Leah Tsemel, depois de falar com ele agora há pouco. Ele ainda está retido na delegacia de polícia de Kiryat Arba”, detalhou.
As IDF confirmaram terem prendido Ballal e justificaram o sequestro sob o argumento de que ele estava entre um grupo de palestinos que arremessaram pedras contra colonos israelenses. Entretanto, negaram tê-lo retirado à força de uma ambulância onde estava para tratar as feridas após ser agredido, conforme a denúncia de Abraham.
Sem Chão (No Other Land)
Vencedor do Oscar 2025 na categoria de Melhor Documentário, Sem Chão conta a história das dificuldades que o palestino Basel Adra, co-diretor do filme, enfrenta enquanto documenta a destruição dos vilarejos de Masafer Yatta na Cisjordânia ocupada. O trama também retrata sua amizade crescente com um segundo diretor, o israelense Yuval Abraham, que passa, neste processo, a compreender as restrições, a discriminação que Adra enfrenta e a importância da resistência palestina.
Durante o discurso na principal premiação estadunidense de cinema, após a entrega do prêmio, Adra e Abraham (os outros dois diretores são Rachel Szor e Hamdan Ballal), realizaram uma forte denúncia das ações militares do regime sionista em Gaza e na Cisjordânia.
“Há cerca de dois meses, me tornei pai, e minha esperança para minha filha é que ela não precise viver a mesma vida que vivo agora — sempre temendo a violência dos colonos, as demolições de casas e os deslocamentos forçados que minha comunidade, Masafer Yatta, enfrenta todos os dias sob a ocupação israelense”, disse Adra.
Sem Chão já havia conquistado outros importantes prêmios. Foi escolhido o melhor documentário no Festival Internacional de Cinema de Berlim, em fevereiro de 2024, e Melhor Filme Não-Ficcional do Círculo de Críticos de Cinema de Nova York.
