Os principais sindicatos franceses convocaram este ano mais de 265 comícios e manifestações por toda a França para esta quarta-feira (01/05), dia internacional dos trabalhadores. Na capital, cerca de 50 mil pessoas participaram do ato, segundo a Confederação Geral do Trabalho francesa (CGT). O protesto foi marcado por tensões em Paris e em outras cidades. Pelo menos sete policiais ficaram feridos e vitrines de lojas foram vandalizadas.
Em Paris, a principal manifestação começou sua concentração antes das 14h locais (9h horário de Brasília), na Praça da República, onde diversos grupos defendiam suas causas com frases de efeito e cartazes, antes do cortejo avançar em direção à Praça da Nação, quase duas horas depois. Muitos jovens, entre franceses e estrangeiros que vivem no país, participaram dos protestos em defesa de uma ampla gama de reivindicações.
Grupos representados por muçulmanos defendiam causas trabalhistas, enquanto jovens de partidos comunistas bradavam frases em defesa dos direitos humanos na Faixa do Gaza, cujo confronto entre o grupo islâmico palestino Hamas e o Exército israelense persiste há quase sete meses.
Brasil representado pelo PT
O Brasil esteve representado pelo Partido dos Trabalhadores (PT) junto a uma comitiva latino-americana com partidos políticos de países como México, Peru, Uruguai, Argentina, Colômbia e até o Haiti, que se manifestou de forma independente.
“Estamos unidos como América Latina reivindicando e denunciando coisas que têm acontecido no nosso continente, assim como os povos árabes que aqui estão hoje”, disse Esdras Ribeiro Silva, coordenador do PT em Paris. “Acho que é um momento de união onde temos voz, peso, quantidade e é extremamente importante esta data mundialmente”, opinou.
“O PT tem uma participação importante devido à comunidade brasileira aqui na França. Hoje passamos de 100 mil brasileiros” apontou Esdras, lembrando ainda que as Eleições Europeias, que acontecem em junho, se aproximam.
“Uma das estratégias de internacionalização do partido é apoiar candidatos europeus e nós somos muito alinhados e parceiros da Nova União Popular Ecologista e Social da França (Nupes, de esquerda) e da França Insubmissa (esquerda radical). Por isso estamos aqui hoje, para ter mais representatividade no Parlamento Europeu”, explicou Esdras.
Confrontos
Antes de seguir o cortejo, alguns manifestantes entraram em confronto com a polícia, que atuava em grande contingente com bloqueio de ruas e de estações de metrô. A polícia de Paris chegou a realizar mais de mil abordagens e houve detidos.
Alguns manifestantes precisaram de atendimento médico no local por terem sido atingidos na cabeça por cassetetes dos policiais. Em ruas próximas à concentração popular, vitrines de lojas e um ponto de ônibus foram quebrados. Em seguida, radicais chegaram a atear fogo em um veículo. A polícia usou gás lacrimogêneo para conter as depredações.
Apesar de os sindicatos terem informado a participação de 50 mil pessoas, as autoridades policiais confirmaram entre 15 mil a 30 mil manifestantes na capital.
A luta francesa
As principais organizações sindicalistas presentes foram a Confederação Francesa Democrática do Trabalho (CFDT), a União Nacional de Sindicatos Autônomos (Unsa), a Federação Sindical Unitária (FSU), a união sindical Solidaires, além da CGT.
O líder da esquerda radical francesa Jean-Luc Mélenchon, do partido França Insubmissa, fez um discurso antes no início do ato desta quarta-feira, no qual evocou assuntos desde a defesa da Previdência Social francesa e do sistema de ajudas sociais até o pedido de um cessar-fogo na Faixa de Gaza, além de ter feito críticas ao governo do presidente Emmanuel Macron.
Mélenchon defendeu que o 1º de maio “é a festa da luta dos trabalhadores” e pediu pela “segurança social, família e humanidade”. O líder de esquerda radical também criticou a economia de guerra, segundo ele, apoiada pelos Estados Unidos, e pediu um cessar-fogo na Ucrânia e na Faixa de Gaza.
“Nós queremos a paz na Europa. A Ucrânia e a Rússia precisam negociar e pararem de colocar todo um continente em perigo. Ambos precisam dar garantias mútuas. A Rússia precisa sair da Ucrânia. Queremos a paz no Mediterrâneo (…) Em Gaza, não é uma guerra, mas um genocídio, que mata uma população inteira”, declarou em meio aos aplausos e bandeiras palestinas.
Após o protesto contra a reforma da previdência, o que resta da unidade sindical?
Após a forte ação unificada em 2023 contra a reforma previdenciária, no dia 1º de maio de 2023, a França foi palco de um vasto movimento de protestos. Durante semanas, as várias organizações que representam os funcionários estavam convocando manifestações paralelas. Em vão, dois dias depois, o Conselho Constitucional confirmou definitivamente a reforma pretendida pelo governo.
Um ano depois, apesar do fracasso do movimento contra a reforma da previdência, os sindicatos mostram que continuam vivos, como afirma Karel Yon, sociólogo e pesquisador do laboratório de Instituições e da Dinâmica Histórica da Economia e da Sociedade (IDHES), em Nanterre, região metropolitana de Paris, que enfatiza a necessidade de os sindicatos “se manterem unidos”.
“Do lado dos empregadores, haverá uma recusa em negociar salários de forma séria; do lado das autoridades públicas, haverá uma sucessão de reformas apresentadas como necessárias a cada vez para reduzir os gastos públicos, que resultam em uma deterioração dos direitos dos empregados”, explica.
O sociólogo acredita que, em todas essas frentes, para os sindicatos, seja qual for sua inclinação para o diálogo social ou para o protesto, é quase uma necessidade vital para o sindicalismo que “todas as organizações sindicais – e elas estão bem cientes disso – devem se manter unidas”.
Uma única voz contra a extrema direita nas Eleições Europeias
Neste ano eleitoral na França, os sindicatos também estão falando em uma só voz para apontar o mesmo perigo: “A extrema direita é o pior inimigo dos trabalhadores” ou “a CFDT sempre foi clara: não debatemos com a extrema direita, nós a combatemos”.
Karel Yon acredita que “quando o movimento sindical avança unido e coloca as questões sociais em primeiro plano, os debates enjoativos sobre imigração e toda a retórica racista ficam completamente invisíveis”.
Além das questões sociais, como salários, a chegada de uma nova geração – mais jovem e mais feminina – à frente dos sindicatos também possibilitou enfatizar a luta contra a violência sexual e sexista no mundo do trabalho e a transição ecológica, que são novos vetores para a unidade sindical.