EUA e Rússia iniciam discussão sobre negociações de paz para fim da guerra na Ucrânia
Rubio diz que Washington aproveitará qualquer 'oportunidade de avançar' no acordo
Uma delegação de altos funcionários dos governos norte-americano e russo se reúnem nesta terça-feira (18/02) na Arábia Saudita para preparar um encontro entre os presidentes dos dois países. Um dos temas principais serão as negociações para o fim da guerra da Ucrânia, embora não participem da reunião nem representantes do governo ucraniano nem da União Europeia, o que gerou protestos e desconfiança em ambos.
A delegação dos Estados Unidos é liderada pelo enviado especial para o Oriente Médio, Steve Witkov, e pelo Conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, Mike Waltz. O secretário de Estado norte-americano Marco Rubio também estará presente. Já a delegação russa é liderada pelo ministro das Relações Exteriores do país, Sergei Lavrov, e pelo diplomata veterano Yuri Ushakov, ex-embaixador em Washington (de 1998 a 2008) e conselheiro do presidente russo.
Embora as discussões girem em torno do fim da guerra na Ucrânia, o secretário de Estado dos Estados Unidos procurou diminuir as expectativas. “Um processo de paz não é algo que se resolve numa reunião. Não será fácil acabar com o conflito (…) A União Europeia tem as sanções; os ucranianos obviamente estão lutando nesta guerra. É o país deles e eles estão na linha de frente (…) Mas se surgirem oportunidades de avançar, nós as aproveitaremos”, disse Rubio em entrevista à emissora norte-americana CBS, no domingo (16/02).
‘Quando a negociação for séria, Europa e Ucrânia participarão’
Buscando desfazer o mal estar gerado entre os aliados europeus, Rubio ressaltou que quando ficar claro que as negociações são reais, tanto a Ucrânia, “porque é o país invadido”, como os europeus, “que têm sanções contra a Rússia e contribuíram no esforço”, terão que participar. “Nós simplesmente não chegamos a esse ponto ainda”, disse o secretário de Estado.
Na mesma direção, a porta-voz do Departamento de Estado, Tammy Bruce, reiterou na segunda-feira (17/02) que o encontro tem como objetivo averiguar se os russos realmente querem a paz para só então dar início a negociações detalhadas.
A despeito dessas declarações, o presidente norte-americano Donald Trump já descartou a possiblidade de que a entrada da Ucrânia na Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) faça parte das negociações e disse que a Rússia não estará disposta a retroceder às fronteiras de antes da invasão da Crimeia.
Em contraste com as declarações de Rubio, Lavrov rejeitou categoricamente a participação da União Europeia nas negociações de paz na Ucrânia. “Se eles vão insinuar sorrateiramente algumas ideias para congelar o conflito enquanto próprios, por seus costumes, caráter e hábitos, estão pensando em continuar a guerra, por que convidá-los?”, questionou o chefe da delegação russa depois de uma reunião com o ministro das Relações Exteriores da Sérvia, na segunda-feira (18//02).

Ministro das Relações Exteriores russo Sergei Lavrov
Moscou descarta abrir mão de territórios conquistados
O arquiteto da política externa de Putin e líder da delegação russa descartou completamente a possibilidade de Moscou abrir mão de qualquer parcela de seus ganhos territoriais na Ucrânia, dizendo que “nem estava na mesa” de negociações.
Lavrov se reveria às declarações feitas no domingo (16/02) pelo presidente da Finlândia, Alexander Stubb, durante a Conferência de Segurança de Munique. Na ocasião, Stubb disse que nesta primeira fase de pré-negociações “é um momento em que precisamos rearmar a Ucrânia e colocar pressão máxima sobre a Rússia com sanções”.
O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, disse na segunda-feira (17/02) que Putin só reconhece a Ucrânia como um apêndice nas negociações que começam hoje na Arábia Saudita. Segundo Peskov, a reunião se concentrará, principalmente, em restaurar “todo o espectro das relações russo-americanas” e na preparação de “possíveis negociações sobre a questão ucraniana e de uma reunião entre os dois presidentes”. Esse encontro também deve ocorrer na Arábia Saudita.
O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, reiterou que seu país não reconhecerá nenhum acordo de paz do qual não tenha participado.
Europa busca consenso difícil sobre como garantir a paz
Enquanto isso, nesta segunda-feira (17/02), oito países europeus, se reuniram para discutir uma proposta de paz conjunta para a Ucrânia. Ainda perplexos por terem sido completamente colocados de lado pelo tradicional aliado do outro lado do Atlântico, as nações do velho continente buscam se articular para garantir seu lugar na mesa de negociações.
No centro das discussões na Europa também está a necessidade de aumentar os investimentos europeus em defesa, uma exigência de Trump. Ele já disse que seu país não vai mais ajudar a Ucrânia na guerra e já ameaçou, até, abandonar a OTAN. Nas ajudas à Ucrânia, os Estados Unidos são o maior contribuinte e no financiamento à OTAN, o maior junto com a Alemanha. Ele também disse que não aceitará o envio de tropas da organização para garantir a paz na Ucrânia depois de um acordo e chegou a afirmar também que a Ucrânia deverá pagar toda a ajuda que os Estados Unidos lhe destinaram e até que “poderá se tornar russa”.
Nesse contexto, os países europeus tentaram chegar a um posicionamento conjunto. Participaram do encontro Alemanha, Polônia, Espanha, Itália, Holanda Dinamarca e o Reino Unido que, a despeito de ter saído da União Europeia, vem participando de todas as suas reuniões relacionadas com a segurança do continente. Estiveram presentes ainda os presidentes do Conselho Europeu e da Comissão Europeia, assim como o secretário-geral da OTAN.
Mas houve pouco consenso na reunião, criticada por não incluir os 27 países da União Europeia, principalmente os que estão mais próximos do conflito.
Envio de tropas divide os países
O primeiro-ministro britânico Keir Starmer reiterou sua disposição de enviar tropas para a Ucrânia caso se chegue a um acordo de paz duradouro. Mas condicionou isso à permanência do apoio norte-americano, considerado por ele como “o único meio de dissuadir a Rússia de atacar novamente a Ucrânia”.
Starmer afirmou que os Estados Unidos não estão preparados para deixar a OTAN, mas que era urgente que houvesse uma divisão de tarefas dentro da aliança. Autoridades britânicas da área de defesa disseram que mesmo que seu país enviasse 30 mil soldados para garantir a paz na Ucrânia, que eles precisariam de cobertura aérea e logística que somente os Estados Unidos poderiam fornecer.
Na mesma direção foram as colocações do chanceler alemão, Olaf Scholz, que, entretanto, saiu da reunião antes do final. Ele defendeu que as regras orçamentárias da Europa deveriam ser relaxadas para que o continente invista em defesa que os 2% do PIB proposto até hoje, mesmo que o déficit público superasse os 3%.
Ele exemplificou dizendo que se o freio à dívida alemã não se aplicar aos gastos com defesa, seu país poderia investir nisso 30 milhões de euros adicionais a cada ano.
Rearmar o continente é o único consenso
Olaf Scholz considerou financiar o rearmamento do continente por meio da emissão de dívida, como foi feito depois da pandemia da covid-19 para reativar a economia. Sobre o envio de tropas, o chanceler, que enfrenta eleições no próximo domingo (23/02) com sua coalizão como terceira colocada, disse que é ainda é cedo para se discutir.
Mas concordou com o primeiro-ministro britânico que o continente tem que agir em uníssono com os Estados Unidos. “Não pode haver dissociação de responsabilidades entre a Europa e Washington”, disse Scholz.
O primeiro-ministro polonês, Donald Tusk, também defendeu o aumento do gasto europeu em defesa, mas descartou o envio de soldados europeus para a Ucrânia.
A França, que tem o maior exército da Europa depois da Polônia, também defende a posição do envio de tropas, embora queira uma maior autonomia com relação aos Estados Unidos.
O único consenso na reunião foi com relação à necessidade da Europa aumentar seu gasto militar.
