Após ataques, Irã deve modernizar inteligência e defesa aérea, avaliam especialistas
Segundo Pedro Paulo Rezende e Bruno Lima Rocha, reforço da cooperação militar com Rússia ajudaria República Islâmica a evitar episódios como o sofrido no dia 13 de junho
O cessar-fogo iniciado na última terça-feira (24/06) significou uma pausa no conflito entre Israel e Irã, mas a possibilidade dos dois países voltarem a trocar agressões continua latente, já que o governo de Tel Aviv afirmou que insistirá em atacar o que chama de “ameaça nuclear iraniana”. Para evitar que uma futura ofensiva tenha impacto contra importantes estruturas, o governo iraniano deveria modernizar seu sistemas de inteligência e defesa aérea, segundo a avaliação de especialistas consultados por Opera Mundi.
Segundo o cientista político e professor de Relações Internacionais Bruno Lima Rocha, a doutrina iraniana dá preferência para a defesa anti-aérea e preserva seus caças. “Existem uns 50 MIG, dos quais 29 estão operacionais, e o país espera receber em breve novos caças de padrão chinês (via Paquistão) ou russos, mas isso precisa ser reforçado”, disse.
Outro ponto importante que o Irã pode desenvolver melhorias é a sua capacidade de abastecer o arsenal de ataque, no mesmo nível do seu principal inimigo.
“No confronto com as forças de Israel, o Irã tem um problema, porque o volume de bombas que os Estados Unidos entregam a Tel Aviv é infindável. Desta forma, uma guerra de atrito necessita de uma linha fixa de rearmamento, financiada com o petróleo vendido para a China. No médio prazo, a defesa aérea sionista perde, o Domo de Ferro não aguentaria mais uma semana. A população sionista é estrangeira em sua maioria e sai fugindo do país. Essa crise pode gerar ingovernabilidade”, analisou Lima Rocha.
Pugilista
O jornalista Pedro Paulo Rezende, especialista em Relações Internacionais e responsável pelo site Arsenal Geopolítica e Defesa, acredita que o Irã deverá fazer uma reavaliação de decisões que favoreceram Israel durante a primeira agressão lançada pelas forças do país sionista, em 13 de junho.
“O Irã mostrou nesta guerra que é como um pugilista com pouca capacidade de defesa. Quando ele dá um soco é um soco pesado, machuca o adversário, mas quando toma um soco ele sente muito o golpe”, analisou o especialista.
No entanto, Rezende recordou que “há alguns anos, a Rússia ofereceu ao Irã a modernização do sistema de defesa antiaérea e o país não aceitou, e a oferta incluía radares capazes de ver além do horizonte, incluía mísseis mais modernos, aviões de caça mais modernos, e a avaliação da Guarda Revolucionária foi de que isso tudo era dispensável”.
“Teerã deve modificar esse pensamento e reforçar o seu poderio aéreo o antes possível, assim poderá enfrentar Israel de igual para igual”, avaliou.

Farzad Menati / Tasnim
Reforçar inteligência
Outro ponto destacado pelos especialistas foi a questão da inteligência, já que aquela primeira agressão israelense, em 13 de junho, foi realizada graças à atuação de diversos agentes do país infiltrados no território iraniano.
Para Pedro Paulo Rezende, a capacidade de inteligência do Irã “já foi muito boa”, mas desta vez falhou, e ampliar isso vai ser uma tarefa complexa.
“O Irã tem que lidar com diferentes problemas para, por exemplo, impedir a entrada de agentes estrangeiros em seu território. É um país de grande dimensão, com fronteiras terrestres muito extensas e, portanto, é vulnerável. A melhor coisa que faz é interferir eletronicamente dentro da inteligência israelense”, comentou o jornalista.
Rezende recordou que, no passado, durante a invasão de Israel ao Líbano, em 2008, a inteligência iraniana foi capaz de se infiltrar dentro da inteligência israelense e definir as rotas de ataque, “o que causou perdas bastante significativas às forças de Israel”. Segundo ele, o país teria condições de recuperar a capacidade de inteligência que demonstrou naquela ocasião.
Já Bruno Lima Rocha acredita que “se não fossem as infiltrações israelenses, o primeiro ataque aéreo teria surtido menos efeito e os físicos nucleares não teriam morrido”.
“O principal problema a ser solucionado é o de ampliar o controle nas fronteiras e nas relações intra familiares de nativos falantes de farsi (o idioma oficial do país) e idiomas regionais, especialmente nas regiões de maioria balochi, azeri e curda”, acrescentou o acadêmico.
Para Lima Rocha, “vigiar não é o suficiente, é preciso aumentar canais de interlocução interétnica e ampliar a penetração da estratégia nacional dentro do dia a dia das famílias”.
Danos sofridos
Com relação aos custos em termos estruturais que a guerra trouxe ao Irã, especialmente após o ataque norte-americano às instalações nucleares, no último domingo (22/06), Rezende acredita que “ainda não é possível avaliar a dimensão dos danos sofridos”. “O que eu sei é que as estruturas de pesquisa nuclear iranianas são muito bem protegidas, mas não saberia afirmar o que foi atingido e o que não foi”, frisou.
Por sua parte, Lima Rocha afirmou que “ao que tudo indica, foram estragos capazes de serem reparados, e o material mais sensível teria sido retirado antes do ataque”.
Ele também ressalta que a usina de Busher, que é uma parceria com a Rússia, “parece que está intacta, e na reunião de segunda-feira (23/06), entre Putin e o chanceler (Seyed) Abbas Araqchi, um dos compromissos de Moscou foi o de ajudar a levar adiante o programa nuclear iraniano”.