A queda de Bashar Al Assad na Síria e a instalação de um novo governo pelo grupo jihadista Tahrir al-Sham (HTS), com a nomeação de Mohammed al-Bashir como primeiro-ministro interino não encerrou a guerra no país, que perdura desde 2011, avaliou o membro da comissão de inquérito de Damasco na ONU, Paulo Sérgio Pinheiro.
“A guerra não acabou na Síria. Ela acabou ou foi limitada no eixo principal onde os rebeldes conseguiram conquistar. Mas dentro do país e fora dessas grandes cidades a guerra não terminou”, afirmou.
Segundo o professor e também cientista político em entrevista ao programa 20 MINUTOS de Opera Mundi no YouTube, nesta quinta-feira (12/12), o cenário de conflito não se encerra, nem há “nenhuma garantia de estabilidade” no novo governo devido ao “caleidoscópio de grupos pequenos dentro da Síria”.
Segundo ele, há organizações menores que antes atuavam como oposição a Assad que são “muito mais jihadistas” do que o HTS, também há grupos não-islâmicos e os cristãos sírios que devem ser levados em conta. Na análise de Pinheiro, “seria injusto não levar em conta” todos esses atores para pensar no futuro da Síria.
Para o professor, outro ponto que deve ser considerado é a relação dos Estados Unidos com este novo governo em Damasco, uma vez que em 2013 o serviço de inteligência norte-americano (CIA) impôs um prêmio de U$10 milhões como recompensa pela vida de Abu Mohammad al-Jolani, o líder do HTS, mas agora comemora seu feito contra o governo de Assad.
Israel
A entrevista realizada pelo jornalista e fundador de Opera Mundi, Breno Altman, também abordou as ações de Israel desde a queda de Assad, no último domingo (08/12). Momentos após a tomada de Damasco pelo HTS, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu ordenou que as Forças de Defesa Israelenses (FDI) avançassem sobre a fronteira entre os dois países, área conhecida como Colinas de Golã, sob o argumento de prevenção contra o grupo jihadista.
Na análise de Pinheiro, a ocupação de 400 quilômetros da área é “escandalosa no direito internacional”, ressaltando que em 50 anos a região, que é território sírio, não havia sido palco de incursões militares.
“Não há nenhuma norma internacional que autorize essa intervenção preventiva. É também uma posição esquizofrênica porque Netanyahu comemorou a queda de Assad, mas tenta se prevenir do HTS. Isso é escandaloso e a comunidade internacional acha isso natural”, avaliou.
Segundo o professor, outra participação de Israel na crise síria decorre porque o país chegou a abrigar 500 mil palestinos, permitindo estudos e trabalhos à população. “A Síria era o único país com um exército convencional, sendo uma potência nuclear, capaz de dissuadir Israel de avançar” contra este povo.
Desta forma, considera que a luta palestina perde com a situação que se desenrolar na Síria. “A Palestina já perdeu pela atenção. Parece que o mundo esqueceu que o genocídio continua em Gaza. Quem está perdendo é a luta palestina”, pontuou.