O Exército sírio confirmou nesta quinta-feira (05/12) que perdeu o controle de Hamã, cidade estratégica no centro do país, após uma intensa ofensiva liderada por grupos extremistas islamistas.
A municipalidade, a cerca de 220 quilômetros ao norte de Damasco, é considerada um ponto crucial para a segurança da capital síria e tem sido palco de confrontos há vários dias – a perda dela marca mais uma reviravolta na guerra civil síria, em um momento de crescente fragilidade para o regime de Bashar al-Assad.
Conforme uma declaração do Exército sírio, os confrontos com os insurgentes, que intensificaram seus ataques nos últimos dias, resultaram na quebra das defesas do regime. “Nas últimas horas, com a intensificação dos confrontos entre nossos soldados e grupos terroristas, esses grupos conseguiram romper uma série de eixos na cidade e entraram nela”, informou o comunicado.
A perda de Hamã é particularmente significativa, já que o município está localizado em um ponto estratégico entre Aleppo, já sob controle rebelde, e Damasco, e tem sido considerado essencial para a proteção da região central do país.
Segundo o jornal britânico Guardian, se trata da primeira vez, desde o início da guerra civil em 2011, que o regime de Assad perde o controle de uma cidade como Hamã. O centro foi palco de revoltas populares contra o regime, especialmente em 2011, e desde então tem sido um local de grande simbolismo, com uma série de batalhas pela sua posse ao longo dos anos.
Mais sobre a ofensiva contra Hamã
A tomada de Hamã é liderada pelo grupo extremista Hay’at Tahrir al-Sham (HTS), um dos principais movimentos insurgentes que combatem o regime sírio.
Os rebeldes cercaram a cidade por vários dias antes de realizar um ataque decisivo, capturando pontos estratégicos, incluindo um aeroporto militar nas proximidades. “Esta vitória será sem vingança, sem rancor”, disse o líder do HTS, Abu Mohammad al-Julani, em mensagem aos moradores de Hamã, conforme reportado pelo Guardian.
Ele ressaltou, ainda, que a conquista, para eles, não se trataria de uma revanche, mas de uma tentativa de “limpar a ferida que perdura na Síria há 40 anos”, referindo-se à repressão de uma revolta em 1982, feita por forças leais ao pai de Bashar al-Assad, Hafez al-Assad.
Os extremistas também liberaram prisioneiros de uma prisão de segurança máxima localizada em Hamã, que abrigava opositores do regime.
A situação em Hamã se agrava, com relatos de que o município está “isolado e sem internet”, de acordo com moradores locais. Um deles, identificado como Mahmud, informou à Ansa que “estamos trancados em casa”, enquanto as milícias insurgentes invadiam instalações militares e a prisão central da cidade.
Segundo o Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH), mais de 720 pessoas já morreram nos combates recentes, que se intensificaram desde o final do mês de novembro. Tais ataques ocorreram pouco após o início de um cessar-fogo entre Israel e Hezbollah no Líbano, enquanto a violência cresce no território sírio.
Hamã, Aleppo e as perdas do regime sírio
A queda de Hamã ocorre poucos dias após a perda de Aleppo, uma das maiores cidades do norte da Síria, também tomada por rebeldes. Com a ofensiva de HTS e a perda de áreas-chave, a ONU reporta que mais de 280 mil pessoas foram deslocadas devido aos combates, agravando a já grave situação humanitária no país.
Além disso, o avanço extremista tem colocado a Síria em uma posição cada vez mais vulnerável, com o governo de Assad lutando para manter o controle sobre grandes áreas de seu território.
Em resposta à perda de Hamã, as forças do regime sírio, com apoio da Rússia e do Irã, lançaram uma série de ataques aéreos visando reverter a situação.
Milícias apoiadas pelo Irã também cruzaram a fronteira iraquiana para reforçar as tropas de Assad, mas, até o momento, esses esforços não têm sido suficientes para impedir o avanço extremista.
As forças de Assad enfrentam uma grave crise interna, com relatos de deserções e falhas no comando. Analistas procurados pelo Guardian apontam que o regime não estava preparado para a ofensiva dos insurgentes, que, além de atuar com maior coordenação, se beneficiaram de apoio militar de diferentes facções e países, incluindo a Turquia e outros grupos seculares da região.
A falta de apoio substancial de Moscou e Teerã, que estão envolvidos em outros conflitos, como a guerra na Ucrânia e a situação no Iraque, tem dificultado a resistência do regime sírio.
O governo sírio, que depende do apoio militar e financeiro de seus aliados, continua a enfrentar uma resistência crescente, e muitos analistas acreditam que a situação atual pode enfraquecer ainda mais o controle de Assad sobre o país.
Mesmo com a contraofensiva do regime, a possibilidade de recuperar o território perdido permanece incerta, enquanto o conflito continua a arrasar a população civil e a infraestrutura do país.
(*) Com Ansa.