Em 6 de janeiro de 1930, um decreto de Stálin sobre os kolkhozes suprime a exploração agrícola individual. Com isto, pôs fim à NEP (Nova Política Econômica) inaugurada por Lênin 9 anos antes.
Ao flexibilizar as obrigações que pesavam sobre as pequenas empresas russas e ao pôr fim a uma gigantesca escassez alimentar, a NEP salvou o poder comunista. Seu sucesso, em contrapartida, ameaçava doravante o mesmo poder ao convidar os cidadãos a estender sua esfera de liberdade.
Stálin restabelece a ortodoxia comunista nacionalizando a agricultura e o conjunto das atividades econômicas. A forte reação de opositores contrária obriga o Estado a estender a repressão.
O que foi a NEP
Idealizada por Lênin, a NEP entrou em vigor em 1922. Ela restabelecia práticas capitalistas vigentes antes da revolução e revertiam em parte as políticas econômicas adotadas no “Comunismo de Guerra”, como a suspensão da estatização de fábricas, o abandono da requisição forçadas de víveres agrícolas e matérias primas, a interrupção do racionamento de alimentos e produtos industrializados, o fim da distribuição de tíquetes e talões de racionamento.
Os camponeses agora venderiam uma pequena parcela da sua produção para o Estado a preço fixo e o restante da produção poderia ser lançado no mercado. Permitiu-se também a criação de empreendimentos capitalistas na pequena indústria e no comércio. O estímulo pelo ganho pessoal foi reintroduzido e o igualitarismo teve que ceder temporariamente à hierarquia e aos privilégios materiais.
A NEP deveria ser acompanhada pela formação de uma tecnocracia eficiente forjada nos quadros operários e ideologicamente ligada aos ideais da revolução e baseada nos seguintes princípios: liberdade de comércio interno; liberdade de salário aos trabalhadores; autorização para o funcionamento de empresas particulares; permissão de entrada de capitais estrangeiros para a reconstrução do país.
O país passou a ter uma estrutura produtiva anacrônica, medidas socialistas convivendo com medidas capitalistas. Deu-lhe, no entanto, uma sobrevivência e folga necessária para a reordenação de forças. O próprio Lênin classificava a NEP, ironicamente, como “uma mistura de czarismo com práticas capitalistas besuntadas por um verniz soviético”.
Lentamente a produção agrícola foi sendo restabelecida; o sistema viário voltou a funcionar com maior regularidade e as pequena indústrias começaram a lançar seus produtos no mercado.
Todavia, surgiram críticas à NEP, apontando suas limitações e concluindo que a continuidade das liberalizações aos negócios privados poderia levar a URSS a graves crises. Segundo elas, a permanência da NEP também deveria levar ao fortalecimento do kulak (camponês rico) e à emergência de uma burguesia rural. Defendiam o fim da NEP e que se deveria implantar o planejamento centralizado e a industrialização acelerada pelo Estado soviético.
Em março de 1922, Ievguêni Preobrajenski, Comissário de Finanças, apresenta ao Comitê Central um conjunto de teses sobre o problema agrário, defendendo a formação de fazendas estatais e de grandes cooperativas e o estímulo a complexos coletivos agro-industriais inseridos no conjunto de uma economia planificada, como forma básica de transformação de uma economia camponesa em economia socialista. Desenvolve inclusive um plano de industrialização do país. Paradoxalmente, visto que o comissário era ligado a Trotsky, esse plano seria parcialmente aproveitado, anos mais tarde por Stálin no I Plano Quinquenal e na política de industrialização.
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Medida adotada por Stálin põe fim à Nova Política Econômica estabelecida por Lenin nove anos antes
Em 1923 estourou a primeira crise econômica da NEP, já em vigor fazia dois anos, que implicou reduções dos salários e supressões de empregos, motivando uma onda de greves espontâneas. Havia uma defasagem entre os preços dos produtos agrícolas e manufaturados decorrente da recuperação da produção agrária e o volume de produtos das indústrias soviéticas, dependentes da atuação do Estado.
A situação econômica grave levou a graves tensões dentro do Partido. De um lado Preobrajenski e outros líderes bolcheviques importantes em torno de Trotsky, e de outro a Troika, composta por Stálin, Zinoviev e Kamenev.
Surge assim em 1923 a Oposição de Esquerda e em 1926 a Oposição Unificada dentro do Partido Comunista, cujo diagnóstico no campo ideológico era que a NEP colocava em risco a Aliança Operário-Camponesa. Os problemas de inflação e do financiamento do investimento que a União Soviética viveu ao longo da década de 1920 seriam resolvidos pela industrialização, financiada pela transferência do excedente da agricultura e do pequeno comércio para o investimento industrial.
Grupos oposicionistas, acusavam que se o Estado Soviético não realizasse logo a coletivização, os kulaks continuariam se fortalecendo, e a aliança operário-camponesa se romperia no sentido cidade campo – e não no inverso como os stalinistas afirmavam – , à medida que os camponeses não seriam atraídos em oferecer produtos agrícolas à cidade diante da carência de produtos industriais oferecidos ao campo.
Para a Oposição havia outro grupo social inimigo do socialismo, os NEPmen, indivíduos que eram autorizadas a instalar negócios privados, tornando-se empresários e ameaçando a preservação da Revolução e de seu caráter socialista.
A alternativa seria a aceleração da industrialização e a planificação para viabilizar a acumulação socialista primitiva, que marcaria os passos de transição da economia soviética de uma economia capitalista subdesenvolvida em uma economia socialista. Defendiam a necessidade de coletivização para resolver os problemas agrários e permitir a captação de recursos excedentes da agricultura para a industrialização. Embora defendessem que o processo se desse em bases progressivas, mediante concordância dos mesmos e fossem efetuados por meio de incentivos econômicos e ideológicos, e não por meio da ação violenta do Estado.
Em 1924, Bukharin se tornou um dos maiores incentivadores da NEP, que acabou abandonada em 1928 por Stalin para a adoção dos Planos Quinquenais, visando a ráida industrialização do país. Dessa forma se deu início à econ omia planificada. Stálin, quando os rumos do desenvolvimento socialista estava sendo alvo de enorme polêmica dentro do Partido, sempre se colocou contrário à ideia de uma coletivização dos pequenos produtores, especialmente os agrícolas, afirmando que isso causaria o rompimento da aliança operário-camponesa (a Smytcha). Opôs-se também às teses da oposição, tachando-as de “superindustrialismo”.
Em 1928, após uma nova e forte crise agrícola e uma série de ataques de setores ligados aos NEPmen e aos kulaks, Stalin põe em prática o Primeiro Plano Quinquenal, baseado na industrialização acelerada, na coletivização forçada e na planificação centralizada.
As empresas comerciais e industriais foram estatizadas e se deu início a grandes empreendimentos de infra-estrutura – geração de energia, mineração, transportes, etc. – e de grandes fábricas de bens de capital – máquinas-ferramentas, tratores, locomotivas – e indústrias metalúrgicas pesadas. Grande parte do capital para esses vultosos empreendimentos foram obtidos com a exportação de alimentos confiscados.
(*) A série Hoje na História foi concebida e escrita pelo advogado e jornalista Max Altman, falecido em 2016.