Uma das obras mais representativas da arte grega, o Grupo de Laocoonte é uma escultura antiga conservada no Museu Pio-Clementino do Vaticano. Representa a figura mitológica do sacerdote troiano Laocoonte e seus dois filhos atacados por serpentes, cena descrita na Odisseia, de autoria de Homero, e na Eneida de Virgílio.
A escultura de mármore foi descoberta em Roma em 14 de janeiro de 1506, nas proximidades das Sete Salas das covas das Termas de Trajano, construídas no sítio da antiga Domus Aurea de Nero, residência do imperador em Roma, não longe do Coliseu.
A peça foi prontamente adquirida, após rude competição pelo papa Júlio II, que a colocou na Sala do Octógono do Palácio Belvedere, no Vaticano. A obra foi identificada pelo arquiteto Giuliano da Sanghallo como a descrita por Plinio, o Velho em sua História Natural (77-79 d.C.) : “(…) De um único bloco de pedra os grandes artistas Agesandros, Polydoros e Athénodoros de Rhodes esculpiram Laocoonte, seus filhos e serpentes magnificamente, combinando perfeitamente suas ideias (…)”.
Em 1515, o rei Francisco I da França pretendeu, em vão, adquiri-la. Em 1520, renovou o seu pedido, desta vez de uma cópia em bonze. Para contentá-lo, o papa Leão X pede ao escultor florentino Baccio Bandinelli uma cópia em mármore, acabando por guardá-la para si.
A escultura encontrada à época estava incompleta, pois faltava o braço direito da figura do próprio Laocoonte. A partir de 1523, Montorsoli, aluno de Michelangelo, completa o Grupo: as falhas são sanadas, o braço do sacerdote se esticaria numa diagonal, o que provocou a admiração do historiador da arte Johann Winckelmann. Em 1798, após o Tratado de Tolentino, a obra foi transferida a Paris até 1815, quando volta ao acervo do Vaticano.
Somente em 1905, o colecionador e arqueólogo Ludwig Pollak reencontrou o braço direito do sacerdote, dobrado, que encontraria seu espaço na escultura quando da restauração entre 1957-1960.
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O Grupo de Laocoonte inspirou fortemente a história da arte alemã na segunda metade do século XVIII. Além de Winckelmann, Lessing, Herder, Novalis, Goethe e Schopenauer comentaram a escultura. Numerosos artistas deram sua própria interpretação, como Ticiano, William Blake e Max Ernst. No álbum Asterix, uma dos escravos de Tifus movimenta seus músculos imitando a pose de Laocoonte, e cordas aparecem à guisa das serpentes.
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Escultura de mármore foi descoberta em Roma, nas proximidades das Sete Salas das covas das Termas de Trajano
A obra reflete a exímia maestria técnica de três escultores da ilha grega de Rhodes. A busca da reprodução perfeita de detalhes, notadamente na anatomia e na musculatura mostra a herança grega. Sua força encaixa-se na atmosfera bastante tensa da cena. O gosto pelo patético do mundo helênico encontra aqui um de seus grandes representantes.
Os escultores escolheram retratar um momento preciso do relato da Tomada de Troia. Trata-se de uma cena vívida em que a tensão dramática está exposta no rosto dos personagens, cuja expressividade é ressaltada pelos olhos arregalados, desesperados e desvairados. Laocoonte, músculos tensos, tenta se desembaraçar da serpente que o comprime.
Os escultores se permitiram bastante liberdade artística. Os três personagens estão representados nus, nudez esta tradicionalmente reservada aos deuses, aos heróis e aos atletas. Laocoonte e seus filhos estão retorcidos, torturados e isto se vê física e moralmente. As serpentes que se enrolam em torno dos personagens impotentes asseguram um liame lógico que harmoniza a leitura da obra.
Laocoonte e um de seus filhos estão encurralados junto ao altar, o que permite acentuar a noção de fatalidade. Foi um deus que enviou as serpentes, e não há escapatória possível. As pernas e os braços dos personagens estão aprisionados. Entretanto, os artistas não escolheram representar a morte de Laocoonte e sim o momento exato do seu sofrimento e de seus filhos.
Ademais, encontram-se certos traços característicos do gosto helenista. A cabeleira abundante e impetuosa com mechas ligeiramente cacheadas de Laocoonte, lembrando os retratos de Alexandre ou do Velho Ventauro. A expressividade e os rostos angustiados traduzem a mesma força, a mesma vontade de captar um ínfimo momento, o mais dramático.
Houve bastante dificuldade de precisar a data da escultura e mesmo de saber se houve uma versão feita originalmente em bronze. A composição frontal do grupo está destinada a ser contemplada não apenas de um único ponto de vista. Faz ressaltar a questão da localização, por exemplo, num átrio de forma circular e não sobre um pedestal montado num espaço aberto.
Acreditou-se durante muito tempo que se tratava de um original da época helenista. Entretanto, o mármore do altar sobre o qual Laocoonte está sentado é de origem italiana, datando no mínimo da segunda metade do século I d. C. Tratava-se, pois, de uma cópia ou adaptação. Todavia, essa descoberta não resolveu o problema da datação do original.
A datação não interessa apenas à história das artes plásticas, mas tem também repercussões sobre a história da literatura. Virgílio foi o primeiro autor a se estender sobre esse episódio. A escultura inspirou a Eneida ? Ou o contrário ? Virgílio representa Laocoonte como uma vítima inocente. Em outras tradições, como as de Sófocles em sua tragédia perdida, Laocoonte é punido por Apolo por ter se casado e haver transgredido seu dever de celibato, foi então condenado a ver seus filhos destroçados pelas serpentes.