A exemplo de seu ancestral Ivan, o Terrível em 1480, Pedro I assume em 22 de outubro de 1721 sob o título de “Czar de toda a Rússia”. Buscando se aproximar ao máximo das grandes potências ocidentais, ele iria “ocidentalizar” a Rússia. Passou a não querer mais ser chamado de czar e sim de imperador. Todos os homens deveriam ter a sua barba cortada, e o uso do calendário cristão se tornaria obrigatório.
A capital do país seria doravante localizada no porto de Petersburgo, à margem do rio Neva. A cidade se chamaria mais tarde São Petersburgo (cidade de São Pedro, em alemão), como lembrança do homem que a fundou, o imperador Pedro I.
Em 1914, por ocasião da Rússia entrar em guerra contra a Alemanha, a cidade “russificaria” seu nome passando a se chamar Petrogrado. Em 1924, alguns dias após a morte de Lênin, ela assumiria o nome de Leningrado. Por fim, em 1991, um referendo popular decidiu o retorno à antiga denominação.
Ao brincar num veleiro abandonado no lago Pleshcheevo, o czarevitch Pedro fascinou-se pelas coisas do mar e pelo universo da mecânica. Não demorou a verificar que nascera no lugar errado, pois o seu império, ainda que imenso, quase não tinha praias e nenhuma vocação para a indústria. Pedro, então um jovem de mais de dois metros de altura, que se tornara o soberano aos 10 anos, partiu para uma longa viagem ao Ocidente.
Lá, impressionou-se com os moinhos de vento e as fileiras de mastros e guindastes com que se deparou nas margens do rio Zaan, na Holanda. Maravilhou-se com as manufaturas e serralharias inglesas quando chegou ao Reino Unido. Que contraste com o preconceito que existia na Rússia com o trabalho manual, tarefa entregue aos servos e aos tártaros.
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Pedro I, imperador russo, buscou ‘ocidentalizar’ o país
Ao retornar a Moscou em 1698, vinha com um propósito: a Rússia teria que se ocidentalizar. Não mais queria deparar-se com os sinais evidentes do atraso e rudeza do povo, gente com pouca higiene, enfiada em camisolões e com aquelas barbas bíblicas que lhes chegavam à cintura. Enfurecia-o a “dvoryantsvo”, a nobreza vadia e beberrona que tratou de disciplinar e pôr a serviço do Estado. A Rússia deveria se tornar um país europeu. Dos suecos importou regras administrativas, dos ingleses as manufaturas, dos holandeses os estaleiros e dos alemães a ciência, que, por sugestão do filósofo Leibniz, levaram-no a fundar a Academia Científica Russa.
Para garantir a segurança daquele território colossal, institucionalizou um exército regular e uma marinha de guerra, além de estabelecer uma nova divisão administrativa para o país inteiro, depois de ter subjugado a Igreja Russo-Ortodoxa à sua vontade.
Faltava-lhe um símbolo, um marco da ocidentalização. Alcançou-o em 16 de maio de 1703, com a fundação, nas beiras do Mar Báltico, da cidade de São Petersburgo que passou a ser “a janela para Europa”, uma antítese barroca e moderna a Moscou bizantina e medieval.
Pedro não economizou. Atraiu para lá mais de dois mil artesãos e negociantes, recorrendo para pô-la em pé sobre um vasto pântano que se espalhava na cabeceira do rio Neva, a arquitetos e urbanistas italianos, tais como Domenico Trezzini, e de outras partes. Esses artistas erigiram uma das mais belas cidades do mundo. Estima-se que mais de 150 mil trabalhadores deixaram seus ossos naqueles pântanos.
Não o perdoaram. Pedro despertou contra si forças primitivíssimas, simbolizadas pelos “skóptsi”, os “santos eunucos”. Era uma seita de fanáticos que pregava uma vida próxima ao evangelho e consideravam Pedro, o Anticristo. Os eslavófilos por sua vez, gente conservadora, apontaram-no como o destruidor da essência russa, tradicionalista, beata, e orgulhosa da sua pobreza cristã, assentada na figura do aldeão.
Em São Petersburgo, lá se encontra, à beira do Neva, a enorme estátua de Pedro – “o Cavaleiro de Bronze”, em que se vê a mão direita estendida para o Ocidente.