No final de 1947, o alarido da “Ameaça Vermelha” (Red Scare) nos Estados Unidos chegava ao auge e punha em marcha sua engrenagem esmagadora. Em Washington, um comitê do Congresso norte-americano dava início a uma investigação sobre a influência comunista numa das comunidades mais ricas e glamorosas do mundo: Hollywood.
Logo depois do término da Segunda Guerra Mundial, a Guerra Fria começou a se acirrar entre as duas superpotências – a capitalista, Estados Unidos, e a socialista, União Soviética. Em Washington, os cães-de-guarda do conservadorismo operavam para afastar dos cargos governamentais quem manifestasse simpatias pelo socialismo antes de voltar seus olhares para os “vermelhos” instalados na indústria cinematográfica.
Comitê de Atividades Anti-Americanas do Congresso
O Comitê de Atividades Anti-Americanas do Congresso (HUAC, na sigla em inglês) abriu suas investigações sobre a infiltração comunista na indústria cinematográfica norte-americana em 20 de outubro de 1947. Presidido pelo congressista Joseph McCarthy, as sucessivas sessões focaram-se em identificar subversivos entre atores, atrizes, roteiristas e diretores de Hollywood.
Apesar de inicialmente um grupo de pesos-pesados da indústria do entretenimento, como Humphrey Bogart, Lauren Bacall e Gene Kelly, terem se oposto às investigações, as audiências prosseguiram. Interrogaram um grande número de famosos, perguntando-lhes asperamente e sem rodeios: “Você é ou foi alguma vez membro do Partido Comunista?”; “Conhece alguém em Hollywood que nutra simpatias ou pertença ao Partido Comunista?”.
Seja por patriotismo, deslealdade, medo ou simples delação, algumas das testemunhas – inclusive o diretor Elia Kazan, atores como Gary Cooper e Robert Taylor e donos de estúdio como Walt Disney e Jack Warner da Warner Bros. – entregaram ao comitê nomes de colegas que suspeitavam serem comunistas ou simpatizantes, além de denunciar a influência comunista na indústria cinematográfica.
Outro grupo de testemunhas, que incluía escritores e roteiristas como Dalton Trumbo e Ring Lardner Jr., foi menos cooperativo. Reclamaram abertamente que as audiências eram ilegais, que violavam a primeira emenda à Constituição dos EUA e que o questionamento quanto às lealdades políticas era impróprio. No final, foram acusados de desacato ao Congresso, receberam voz de prisão e foram parar na cadeia.
Wikicommons
Comitê de Atividades Anti-Americanas do Congresso é produto do combate à ‘ameaça vermelha’
O destino dos “Dez de Hollywood” como essas testemunhas críticas viriam a ser conhecidas, aterrorizou muita gente do cinema. Quando as sessões do Comitê foram retomadas, em 1951, Hollywood rapidamente curvou-se às suas imposições.
Pressionado pelo Congresso dispôs-se a elaborar listas negras, o que terminou por banir de seus empregos e atividades cerca de 325 roteiristas, atores, diretores, cenógrafos, figurinistas, técnicos de som, fotógrafos e câmeras. Constaram da lista negra o compositor Aaron Copland, escritores e roteiristas como Dashiell Hammett, Lillian Hellman e Dorothy Parker, dramaturgos como Arthur Miller e cineastas como Orson Welles. Os atores Zero Mostel e John Garfield viram suas carreiras destruídas por se recusarem abertamente a cooperar com o comitê.
Vítima indireta da “Red Scare”, o genial Charles Chaplin resolveu abandonar os Estados Unidos para só voltou muitos anos depois, a fim de receber um Oscar especial. De seu lado, o ‘establishment’ hollywoodiano submeteu-se a ponto de rodar um conjunto de filmes de conteúdo acentuadamente anticomunista como I Was a Communist for the FBI (1951), Big Jim McClain (1952), and My Son John (1952).
Alguns dos escritores e roteiristas continuaram a trabalhar valendo-se de pseudônimos, enquanto outros escreveram scripts creditados a escritores amigos. No começo dos anos 1960, depois da queda de McCarthy, a face escancarada do anticomunismo, o macartismo começou a ceder lentamente. Em 1997, o Sindicato dos Escritores dos Estados Unidos aprovou por unanimidade a mudança dos créditos de roteiro de 23 filmes produzidos durante o período das listas negras, revertendo – mas não apagando – parte dos danos feitos durante o pânico da “Ameaça Vermelha”.
(*) A série Hoje na História foi concebida e escrita pelo advogado e jornalista Max Altman, falecido em 2016.