Nos 60 anos do golpe militar no Brasil (1964-1985), o livro Cachorros (2024), do repórter e historiador Marcelo Godoy, publicado pela Editora Alameda, investiga segredos e mentiras que continuam a assombrar a democracia brasileira, incluindo as redes de infiltração do regime que levaram à morte e ocultação do corpo do ex-deputado Rubens Paiva, trazendo aspectos inéditos sobre a repressão da ditadura
O assassinato de Rubens Paiva, uma das histórias e pessoas mais marcantes do período da ditadura militar, voltou a ser pauta com o lançamento de Ainda Estou Aqui (2024), filme dirigido por Walter Salles e estrelado por Fernanda Torres e Selton Mello, aclamado no Brasil e no exterior.
Um dos pontos tratados em Cachorros é o papel do Centro de Informações e Segurança da Aeronáutica (CISA), inicialmente dedicado a monitorar o Movimento Revolucionário Oito de Outubro (MR-8), guerrilha envolvida em sequestros de aviões para Cuba. Com o tempo, o CISA ampliou suas operações, incluindo a vigilância sobre outras figuras, como Rubens Paiva.
Godoy explica que a Aeronáutica, por meio do centro de informações, mantinha contato com o Serviço de Informações do Ministério das Relações Exteriores, que fornecia dados vindos de fora do país. A partir desta rede, o CISA obteve a pista crucial para a captura do político: uma mensagem interceptada no Chile, vinda de Santiago e endereçada ao então deputado cassado pelo regime.
“Por meio do grupo do Santos Moura, chegou a informação do Chile, que estavam embarcando de Santiago para cá, pessoas com mensagens para integrantes do MR-8 aqui no Brasil”, relata Godoy. As mensagens eram transportadas por duas mulheres, que foram presas ao desembarcarem no Galeão, no Rio de Janeiro.
Com a informação em mãos, a Aeronáutica se dirigiu à casa de Rubens Paiva e o prendeu. “E leva ele primeiro para a Aeronáutica, para uma detenção na Aeronáutica, antes de entregá-lo para o Exército”, detalha Godoy.
O relato destaca uma rede de colaboração entre diferentes órgãos repressivos naquele momento, como a Aeronáutica, Exército e o Ministério das Relações Exteriores.
Godoy também trouxe mais informações sobre o episódio no aeroporto: “essas pessoas eram dos carregadores do Viveiro de Castro, que era um militante do MR-8 em Santiago. Logo que o avião pousa, o CISA prende as duas mulheres e, em revista, encontra uma mensagem dirigida ao Rubens Paiva”, explica.
Além disso, o autor esclarece como as informações chegaram até a Aeronáutica, que teve papel decisivo na captura do deputado. “A informação chegou ao CISA, e a Aeronáutica foi até a casa de Rubens Paiva, levando-o para a detenção antes de entregá-lo ao Exército”, acrescenta. A colaboração entre as forças militares foi essencial para a prisão e interrogatório dele.
Cachorros revela, ao tratar de casos como este, como a repressão da ditadura foi orquestrada por uma rede de colaboração entre diversos setores militares. Por meio de uma pesquisa minuciosa e documentos inéditos de arquivos de cinco países, o livro visita histórias essenciais, e que ainda não haviam sido contadas.
Marcelo Godoy concedeu, em março deste ano, uma entrevista a Opera Mundi. Veja o vídeo abaixo:
Sobre o livro:
Cachorros: A História do Maior Espião dos Serviços Secretos Militares e a Repressão aos Comunistas Até a Nova República
Autor: Marcelo Godoy
Lançamento: julho de 2024
Número de páginas: 552