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Memória

O Trabalho: diálogo aberto e resistência à ditadura

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Apelidado de 'Balho', jornal deu voz aos movimentos populares que se reorganizavam no combate à ditadura no final dos anos 1970; publicação continua a circular como veículo de corrente do PT

Lucas Estanislau

2018-01-31T16:40:00.000Z

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Na segunda metade dos anos 1970, a ditadura civil-militar do Brasil começava a conhecer novas formas de resistência. O movimento estudantil reunia forças e buscava se recompor após anos de perseguição. Os operários colocavam fim às administrações "pelegas" dos sindicatos e assumiam uma postura progressista e reivindicatória. Era preciso trabalhar para resistir - e o jornal O Trabalho traduzia esse espírito. 

Leia aqui todas as reportagens da série Memórias da Imprensa Alternativa no Brasil

Lançado no dia 1º de maio de 1978, a publicação que circula até hoje e que cobria passeatas, comícios e greves de operários surgiu como expressão de um tendência trotskista, a antiga Organização Socialista Internacionalista (OSI), da qual a Liberdade e Luta (Libelu) fazia parte. O jornal foi tão importante para esse grupo político que, hoje, a corrente política que se chamava OSI leva o nome de O Trabalho.

A OSI havia sido criada em 1976 por grupos brasileiros trotskistas durante uma conferência clandestina realizada em Praia Grande (SP). Impulsionados pelas ideias do militante francês trotskista Pierre Lambert, seus membros buscavam a reconstrução da IV Internacional, fundada por Leon Trotsky em 1938. As atividades da organização iam desde campanhas pela anistia ampla, geral e irrestrita no Brasil, até apoios para sindicatos internacionais, como o Solidariedade, da Polônia. 

O combate ao lado dos operários contra a ditadura aproximou a OSI dos movimentos organizados de trabalhadores e levou o grupo a desempenhar um papel importante nas greves iniciadas em 1978. A OSI já previa em suas reivindicações uma central sindical única e independente e um partido construído e dirigido por operários. Nesse contexto, surge o jornal O Trabalho, com o objetivo de se contrapor às notícias da grande imprensa que visavam interesses patronais.

O Trabalho direcionava sua cobertura para as manifestações de resistência à ditadura e procurava dialogar abertamente com o público. O periódico sobrevivia de assinaturas, da circulação em bancas ou, mesmo, da venda de mão em mão por apoiadores do jornal. 

Edição nº01 do jornal O Trabalho. Foto: Reprodução'Balho'

No "Balho", apelido carinhoso dado por conta de um projeto gráfico inovador que imprimia a metade da palavra "trabalho" no cabeçalho do jornal, os trabalhadores encontravam um meio de comunicação que os ouvia. Além de contar com o dinheiro das vendas nas bancas e individuais, O Trabalho mantinha campanhas de assinaturas e apoio para que leitores e simpatizantes do jornal pudessem colaborar com a manutenção do periódico. 

Em 1978, na primeira edição do jornal, em um texto que pedia ajuda financeira aos leitores, lia-se que "no Brasil, desde sempre, a classe dominante tem seus arautos, para quem estão abertas as imprensas e fechados os cárceres. E também no Brasil os trabalhadores sempre tiveram seus porta-vozes e defensores, para quem estão fechadas as imprensas e abertos os cárceres. O Trabalho nasce da luta dos trabalhadores contra as mordaças e esses mesmos cárceres".

Repórter da revista Veja à época, o jornalista Paulo Moreira Leite participou da criação do periódico que, segundo ele, representava um "alívio" para os movimentos de resistência. "Naquele momento, a simples ideia de que você podia ler uma imprensa que não era censurada era um alívio", diz.

Ainda na primeira edição, o periódico deixava claro de que lado estava e para quem publicava, afirmando que "O Trabalho nasce assim, das entranhas da luta pela democracia que está hoje em andamento nas fábricas, nos sindicatos, no campo, nas escolas e nos  bairros".

Greves, operários e presos políticos

Moreira Leite também conta que O Trabalho teve uma participação relevante durante as greves de 1979 e 1980, quando o jornal permitiu que os trabalhadores do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo comandassem a redação e imprimissem um jornal feito por eles.

"Na primeira greve dos metalúrgicos de São Paulo, o jornal abriu suas portas e a redação para que os líderes da greve fizessem um jornal, não feito pela redação d'O Trabalho, mas um jornal feito por eles. Foi uma experiência muito interessante, tanto para eles, como para nós", conta o jornalista.

Outro colaborador envolvido na construção de um periódico de resistência foi o jornalista José Américo, que, além de escrever para a publicação, distribuía O Trabalho de mão em mão.

"Os apoiadores do jornal O Trabalho, os militantes da Liberdade e Luta e pessoas que apoiavam o jornal além disso, se dispunham a vender o jornal. Eu mesmo trabalhava no jornal, mas saía pra vendê-lo em pontos de concentração popular", afirma o hoje deputado estadual de São Paulo pelo PT.

Américo ainda destaca o caráter alternativo da publicação. "O jornal O Trabalho publicava matérias de greves estudantis, de movimentos operários pelo Brasil e era óbvio que você não via isso na grande imprensa". 

O jornalista conta que o periódico realizou uma campanha pela libertação dos presos políticos da Penitenciária Barreto Campelo, localizada na Ilha de Itamaracá, em Pernambuco. "O Trabalho publicava cartas, depoimentos de parentes, como uma forma de fazer a disputa pela democracia no Brasil", diz. 

Reprodução

"Saldo foi claramente positivo", diz Paulo Moreira Leite

"A coisa certa, na hora certa"

Para Moreira Leite, as greves e os movimentos populares "eram tratados com dignidade" pela publicação. "Ali os trabalhadores eram ouvidos, o jornal fazia entrevistas nas portas de fábrica, reunia os operários para debater sua condição e o jornal era reconhecido, era apoiado".

Segundo ele, jornais alternativos como O Trabalho souberam se posicionar durante um período difícil na história do Brasil e puderam fazer "a coisa certa, na hora certa". "Em vários momentos, eu acho que essa imprensa soube para onde a história estava andando. Esse é o problema, saber aonde a história vai e se colar nesse processo. O saldo disso é claramente positivo". 

OSI, PT e Corrente O Trabalho

Um ano antes da regularização do Partido dos Trabalhadores, em 1980, a OSI decide entrar no PT. Após a integração, a OSI desempenha um papel importante na estruturação do partido e na formação da Central Única dos Trabalhadores (CUT). No ano de 1983, a organização passa a integrar o Comitê de Reconstrução da IV Internacional, dirigido por Lambert. 

Em 1986, boa parte dos militantes da OSI deixou a organização e ajudou na construção da Articulação dos 113, tendência expressiva dentro do PT. A corrente que manteve suas relações com a linha trotskista passa a ser conhecida como Corrente O Trabalho, homônimo de seu jornal, e permanece até hoje como uma tendência dentro do partido.

O jornal O Trabalho continua a ser editado e veiculado até hoje. Disponível em versão on-line e impressa, O Trabalho prioriza em suas pautas coberturas do movimento sindical, manifestações pelo fortalecimento da democracia no Brasil e movimentos operários internacionais, destacando seu caráter internacionalista.

Reprodução

Edição de novembro de 2017 d'O Trabalho

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Direitos Humanos

Exército de Israel invade e fecha sete organizações de direitos humanos da Palestina

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Grupos entraram na lista de 'organizações terroristas' e sofreram ataque na madrugada desta quinta (18/08) na Cisjordânia

Michele de Mello

Brasil de Fato Brasil de Fato

São Paulo (Brasil)
2022-08-18T19:05:00.000Z

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Nesta quinta-feira (18/08), militares de Israel invadiram e fecharam a sede de sete organizações não governamentais e de direitos humanos palestinas nas cidades de Ramallah e al-Bireh, na região ocupada da Cisjordânia. Seis delas já haviam sido caracterizadas por Israel como organizações “terroristas”, em outubro de 2021, e acusadas de ter vínculos com a Frente Popular de Libertação pela Palestina (FPLP).

Os escritórios das organizações foram saqueados e seus equipamentos confiscados. As portas foram fechadas com solda, com uma ordem militar israelense declarando a "ilegalidade" das organizações.

As organizações atingidas são: Addameer (palavra em árabe para "consciência"), al-Haq (palavra para "justiça"), Defesa das Crianças da Palestina (DCI), União dos Comitês de Trabalho Agrícola (UAWC), Centro Bisan para Pesquisa e Desenvolvimento, Comitê da União das Mulheres Palestinas (UPWC) e o Sindicato das Comissões de Trabalho em Saúde (UHWC).

"Encontramos um documento colado na porta, apenas em hebraico, dizendo que esta é uma organização fechada, não temos permissão para entrar e nenhum período de tempo é especificado", denunciou o diretor do Sindicato das Comissões de Trabalho em Saúde, Mazen Rantisi. 

A ação militar aconteceu na madrugada, logo após o assassinato de  Waseem Nasr Khalifa, de 20 anos, no campo de refugiados de Balata, arredores da cidade de Nablus, norte da Cisjordânia ocupada. Outros  quatro palestinos ficaram feridos por arma de fogo, três  estariam em estado crítico. Os diretores das organizações de direitos humanos dizem que já esperavam a repressão das forças israelenses após serem classificadas como "organizações terroristas" e agora temem por possíveis detenções ou outras represálias.

Existem aproximadamente 4,5 mil palestinos detidos em prisões israelenses, deste total, cerca de 500 são presos administrativos - sem acusação formal ou julgamento.  

"Este ataque visa intimidar e reestruturar a sociedade civil palestina para parar de documentar e expor os abusos e violações da ocupação israelense", disse Shawan Jabarin, diretor-geral da organização de direitos humanos Al-Haq. 

As ONGs, no entanto, asseguram que continuarão seu trabalho. "Não é um trabalho para nós, é convicção, é fé", disse Jabarin. Os grupos afetados ainda convocaram um protesto em frente aos escritórios da Al-Haq no centro de Ramallah na quinta-feira ao meio-dia para protestar contra as incursões e o fechamento de seus escritórios.

Reprodução
Forças de Israel invadem sedes de organizações não-governamentais nas cidades de Ramallah e al-Bireh, na Palestina ocupada

O secretário-geral do Comitê Executivo da Organização pela Liberdade Palestina (OLP), Hussein al-Sheikh, condenou o fechamento dizendo que a decisão busca silenciar a "voz da verdade e da justiça". 

"Vamos apelar a todos os órgãos internacionais oficiais e instituições de direitos humanos para intervir imediatamente para condenar esse comportamento dos ocupantes e pressioná-los a reabrir as instituições para que possam exercer suas atividades livremente", publicou.

O presidente do Conselho Nacional Palestino, Rawhhi Fattouh classificou a ação como "um ato de intimidação e uma tentativa desesperada de encobrir as provas dos crimes e violações diários do ocupante contra civis palestinos".

Já o ministro de Justiça da Palestina, Mohammad Shalaldeh, disse que irá solicitar uma posição do secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, e do Conselho de Segurança. "Esse ataque fere o princípio internacional dos direitos humanos". 

Com a campanha "Stand we the six" (Apoie os seis) meios de comunicação palestinos e israelenses se solidarizaram com as ONGs palestinas. "Este regime [de Israel] considera a repressão violenta uma ferramenta legítima para controlar os palestinos, mas define a atividade civil não-violenta como terrorismo", declaram em comunicado.

As organizações palestinas também tiveram apoio de representantes da Missão Europeia e outros países, entre eles de Bélgica, Chile, Dinamarca, Finlândia, França, Irlanda, Itália, México, Holanda, Noruega, Polônia, Espanha, Suécia e Reino Unido. 

A Igreja Episcopal de Ramallah publicou uma declaração em solidariedade e exigindo uma investigação completa do caso. 

A relatora especial das Nações Unidas para a Palestina, Francisca Albanese, também condenou a ação de Tel Aviv. "Minha total solidariedade às ONGs palestinas que acabam de ter seus escritórios invadidos pelas forças israelenses. Esta nova ação ilegal é prova de seu excelente trabalho pela justiça e direitos humanos palestinos, e o pânico moral que estão causando ao ocupante", publicou.

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