Com muito pouco você
apoia a mídia independente
Opera Mundi
Opera Mundi APOIE
  • Política e Economia
  • Diplomacia
  • Análise
  • Opinião
  • Coronavírus
  • Vídeos
  • Podcasts
Opinião

Islândia mostrou o caminho ao rechaçar a austeridade

Encaminhar Enviar por e-mail

País nórdico recusou receituário do FMI, deixou bancos quebrarem e condenou os responsáveis pela crise

Salim Lamrani

2012-10-11T18:32:00.000Z

Receba nossas notícias e novidades em primeira mão!


Quando, em setembro de 2008, a crise econômica e financeira atingiu a Islândia – pequeno arquipélago no norte da Europa, com uma população de 320 mil habitantes –, o impacto foi desastroso, tal como no resto do continente. A especulação financeira levou os três principais bancos à falência, de modo que seus ativos representavam uma soma dez vezes superior ao PIB do país, com uma perda líquida de 85 bilhões de dólares. A taxa de desemprego se multiplicou por nove entre 2008 e 2010, ao passo que, antes, o país gozava de pleno emprego.

A dívida da Islândia representou 900% do PIB e a moeda nacional se desvalorizou 80% em relação ao euro. O país caiu em uma profunda recessão, com uma diminuição do PIB em 11% em dois anos. (1)

Diante da crise

Em 2009, quando o governo quis aplicar as medidas de austeridade exigidas pelo FMI em troca de uma ajuda financeira de 2,1 bilhões de euros, uma forte mobilização popular o obrigou a renunciar. Nas eleições antecipadas, a esquerda ganhou a maioria absoluta no Parlamento. (2)

Leia outros artigos do colunista:
Pacto orçamentário europeu atenta contra independência da França
As razões da Venezuela em deixar a CIDH
Cuba, a ilha da saúde
A nova vida dos opositores cubanos na Espanha
A história da dívida pública europeia: como os bancos privados enriqueceram às custas da população

Como resolver a crise grega
Imigração na França: da retórica xenófoba à realidade dos números

No entanto, o novo poder adotou a lei Icesave – cujo nombre provém do banco online que quebrou e cujos correntistas eram, na maioria, holandeses e britânicos – com a finalidade de reembolsar os clientes estrangeiros. Essa legislação obrigava os islandeses a reembolsar uma dívida de 3,5 bilhões de euros (40% de seu PIB) – nove mil euros por habitante – em quinze anos e com uma taxa de juros de 5%. Diante dos novos protestos populares, o presidente se recusou a assinar o texto parlamentar e o submeteu a um referendo. Em março de 2010, 93% dos islandeses rechaçaram a lei sobre o reembolso das perdas do Icesave. Quando foi submetida novamente a referendo em abril de 2011, 63% dos cidadãos voltaram a rechaçá-la. (3)

Wikimedia Commons

Cerca de seis mil pessoas protestaram em frente ao Parlamento islandês contra a salvação dos bancos, em novembro de 2008

Uma nova Constituição, redigida por uma Assembleia Constituinte de 25 cidadãos eleitos por sufrágio universal entre 522 candidatos, composta por nove capítulos e 114 artigos, foi adotada em 2011. Ela prevê o direito à informação, com acesso público aos documentos oficiais (Artigo 15), a criação de uma Comissão de Controle da Responsabilidade do Governo (Artigo 63), o direito à consulta direta (Artigo 65) – 10% dos eleitores podem pedir um referendo sobre as leis votadas pelo Parlamento –, assim como a nomeação do primeiro-ministro pelo Parlamento. (4)

Assim, ao contrário das outras nações da União Europeia na mesma situação, que aplicaram escrupulosamente as recomendações do FMI que exigiam medidas de austeridade severas, como na Grécia, Irlanda, Itália ou Espanha, a Islândia escolheu uma via alternativa. Quando, em 2008, os três principais bancos do país – Glitnir, Landsbankinn e Kaupthing – desmoronaram, o Estado islandês se negou a injetar neles fundos públicos, tal como havia feito o resto da Europa. Em vez disso, realizou sua nacionalização.

Do mesmo modo, os bancos privados tiveram que cancelar todos os créditos com taxas variáveis que superavam 110% do valor dos bens imobiliários, o que evitou uma crise de subprime, como nos Estados Unidos. Por outro lado, a Corte Suprema declarou ilegais todos os empréstimos ajustados a divisas estrangeiras que foram outorgados a particulares, obrigado assim os bancos a renunciarem a seus créditos em benefício da população. (5)

 


Quanto aos responsáveis pelo desastre – os banqueiros especuladores que provocaram o desmoronamento do sistema financeiro islandês –, não se beneficiaram da mansidão que se mostrou diante deles no resto da Europa, onde foram sistematicamente absolvidos. Com efeito, Olafur Thor Hauksson, Procurador Especial nomeado pelo Parlamento, os perseguiu e prendeu, inclusive ao ex-primeiro-ministro Geir Haarde. (6)

Uma alternativa à austeridade

Os resultados da política econômica e social islandesa têm sido espetaculares. Enquanto a União Europeia se encontra em plena recessão, a Islândia se beneficiou de uma taxa de crescimento de 2,1% em 2011 e prevê uma taxa de 2,7% para 2012, além de uma taxa de desemprego de 6%. (7) O país até se deu ao luxo de realizar o reembolso antecipado de suas dívidas ao FMI. (8)

O presidente islandês Olafur Grímsson explicou este milagre econômico: “A diferença é que, na Islândia, deixamos os bancos quebrarem. Eram instituições privadas. Não injetamos dinheiro para salvá-las. O Estado não tem por que assumir essa responsabilidade”. (9) 

Agindo contra qualquer prognóstico, o FMI saudou a política do governo islandês – o qual aplicou medidas totalmente contrárias às que o Fundo preconiza –, que permitiu preservar “o precioso modelo nórdico de proteção social”. De fato, a Islândia dispõe de um índice de desenvolvimento humano bastante elevado. “O FMI declara que o plano de resgate ao modo islandês oferece lições nos tempos de crise”. A instituição acrescenta que “o fato de que a Islândia tenha conseguido preservar o bem-estar social das unidades familiares e conseguir uma consolidação fiscal de grande envergadura é uma das maiores conquistas do programa e do governo islandês”.

No entanto, o FMI omitiu omitiu a informação de que esses resultados só foram possíveis porque a Islândia rechaçou sua terapia de choque neoliberal e elaborou um programa de estímulo econômico alternativo e eficiente. (10)

O caso da Islândia demonstra que existe uma alternativa crível às políticas de austeridade que são aplicadas na Europa. Estas, além de serem economicamente ineficientes, são politicamente custosas e socialmente insustentáveis. Ao escolher colocar o interesse geral acima do interesse dos mercados, a Islândia mostra o caminho ao resto do continente para escapar do beco sem saída.

(*) Doutor em Estudos Ibéricos e Latino-americanos da Universidade Paris Sorbonne-Paris IV, Salim Lamrani é professor responsável por cursos na Universidade Paris-Sorbonne-Paris IV e na Universidade Paris-Est Marne-la-Valée e jornalista, especialista nas relações entre Cuba e Estados Unidos. Seu último livro se intitula Etat de siège. Les sanctions économiques des Etats-Unis contre Cuba, Paris, Edições Estrella, 2011, com prólogo de Wayne S. Smith e prefácio de Paul Estrade. Contato: Salim.Lamrani@univ-mlv.fr.  Página no Facebook: https://www.facebook.com/SalimLamraniOfficiel

Referências bibliográficas
(1) Paul M. Poulsen, ‘‘Como a Islândia, uma vez à beira do precipício, se restabeleceu’’, Fundo Monetário Internacional, 26 de outubro de 2011. http://www.imf.org/external/french/np/blog/2011/102611f.htm (site acessado em 11 de setembro de 2012).
(2) Marie-Joëlle Gros, « ‘‘Islândia: a retomada de uma dívida suja’’, Libération, 15 de abril de 2012.
(3) Comissão de cancelamento da dívida do Terceiro Mundo, «Quando a Islândia reinventa a democracia», 4 de dezembro de 2010.
(4) Constituição da Islândia, 29 de junho de 2011. http://stjornlagarad.is/other_files/stjornlagarad/Frumvarp-enska.pdf (site acessado em 11 de setembro de 2012).
(5) Marie-Joëlle Gros, «Islândia: a retomada de uma dívida suja», op. cit.
(6) Caroline Bruneau, «Crise islandesa: o ex-primeiro-ministro não está aprovado», 13 de maio de 2012.
(7) Ambrose Evans-Pritchard, «A Islândia ganhou no fim», The Daily Telegraph, 28 de novembro de 2011.
(8) Le Figaro, «A Islândia já reembolsou o FMI», 16 de maço de 2012.
(9) Ambrose Evans-Pritchard, «Islândia oferece uma tentação arriscada à Irlanda terminada a recessão», The Daily Telegraph, 8 de dezembro de 2010.
(10) Omar R. Valdimarsson, «FMI diz que resgate ao estilo da Islândia traz lições em tempos de crise», Business Week, 13 de agosto de 2012.

Você que chegou até aqui e que acredita em uma mídia autônoma e comprometida com a verdade: precisamos da sua contribuição. A informação deve ser livre e acessível para todos, mas produzi-la com qualidade tem um custo, que é bancado essencialmente por nossos assinantes solidários. Escolha a melhor forma de você contribuir com nosso projeto jornalístico, que olha ao mundo a partir da América Latina e do Brasil.

Contra as fake news, o jornalismo de qualidade é a melhor vacina!

Faça uma
assinatura mensal
Faça uma
assinatura anual
Faça uma
contribuição única

Opera Mundi foi criado em 2008. É mais de uma década de cobertura do cenário político internacional, numa perspectiva brasileira e única. Só o apoio dos internautas nos permite sobreviver e expandir o projeto. Obrigado.

Eu apoio Opera Mundi
Política e Economia

Em 1º discurso após posse, Petro promete reforma na política contra as drogas na Colômbia

Encaminhar Enviar por e-mail

Ao lado da espada de Simón Bolívar, novo presidente colombiano disse que a política antidrogas 'fracassou profundamente', afirmando que a 'paz é possível' no país

Redação Opera Mundi

São Paulo (Brasil)
2022-08-07T22:35:00.000Z

Receba nossas notícias e novidades em primeira mão!

Ao som ovacionado das milhares de pessoas reunidas na Praça Bolívar, em Bogotá, Gustavo Petro realizou seu primeiro discurso neste domingo (07/08) como novo presidente da Colômbia. Petro reafirmou o compromisso de uma reforma na política contra as drogas no país.

"A política contra as drogas fracassou profundamente. A guerra fortaleceu a máfia e debilitou Estados, levando-os a cometerem crimes e evaporou o horizonte da democracia. Chegou o momento de mudar a política antidrogas no mundo para que seja a vida ajudada e não a morte", disse.

Durante seu discurso, Petro pediu que a espada de Simón Bolívar fosse deixada no palco, ao seu lado. Para ele, o objeto significa "toda uma vida, uma existência" que o auxiliou no processo que culminou em sua eleição à Presidência.

Petro disse não querer que a espada esteja "enterrada", que ela seja a "espada do povo". "Chegar aqui implica recorrer uma vida, uma vida imensa que nunca é sozinha. Aqui estão todas a mulheres colombianas que lutam para superar o machismo e construir uma política do amor. As mãos humildes dos operários, dos campesinos, o coração dos trabalhadores que me apoiam sempre quando me sinto débil", declarou.

Segundo o novo mandatário, os colombianos, "muitas vezes", foram "condenados ao impossível e a falta de oportunidades". No entanto, Petro declarou a "todos que estão me escutando" que, agora, "começa nossa segunda oportunidade". 

"Nós ganhamos, vocês ganharam. O esforço de vocês valeu a pena. Agora é hora de mudança, nosso futuro não está escrito e podemos escrever juntos e em paz. Hoje começa a Colômbia do impossível", disse durante a posse, declarando que sua eleição é uma história contra aqueles que não acreditavam, "daqueles que nunca queriam soltar o poder. Porém o fizemos".

Redistribuição de riqueza

Petro afirmou que a "igualdade será possível" na Colômbia, para que a desigualdade e a pobreza não "sejam naturalizadas", já que, segundo o novo presidente, o país é uma das "sociedades mais desiguais em todo o mundo", afirmando ser necessário mudar este paradigma "se queremos ser uma nação e viver em paz". 

Reprodução/ @FranciaMarquezM
Petro e Márquez tomaram posse neste domingo como o primeiro governo de esquerda na Colômbia

"Vamos ser uma Colômbia mais igualitária e com mais oportunidades a todos. A igualdade é possível se formos capazes de gerar riqueza e capazes de distribuí-la. Para isso, é necessário uma reforma tributaria que gere justiça", afirmou durante o discurso.

O presidente reafirmou que seguirá os Acordos de Paz, assinados em 2016, e também as resoluções da Comissão da Verdade em relação à violência no país. Ele declarou que é preciso terminar "para sempre" com os conflitos armados, convocando "todos as pessoas armadas para buscar um caminho que permita a convivência, não importando os conflitos que existam".

"Encontrar soluções através da busca por mais democracia para terminar a violência. Convocamos todos os armados a deixarem as armas, aceitar jurisdições pela paz, a não repetição definitiva da violência, para que a paz seja possível. Precisamos dialogar, nos entender e buscar os caminhos comuns e produzir mudanças. A paz é possível", afirmou.

Posse de Petro

Petro tomou posse neste domingo em uma cerimônia na Praça Bolívar, em Bogotá. Aos 62 anos, ele é o primeiro mandatário de esquerda a assumir o poder na história do país.

O presidente do Senado colombiano, Roy Barreras, foi o encarregado de ler o juramento a Petro, que fala em "cumprir fielmente a Constituição e as leis" do país. Na sequência, a senadora María José Pizarro, filha de Carlos Pizarro assassinado em 1990 e que foi companheiro do agora presidente na guerrilha Movimento 19 de Abril (M-19), entregou a faixa presidencial ao novo chefe de Estado.

Também na posse, a vice-presidente eleita Francia Márquez realizou juramento, que foi lido pelo agora mandatário da Colômbia.

Você que chegou até aqui e que acredita em uma mídia autônoma e comprometida com a verdade: precisamos da sua contribuição. A informação deve ser livre e acessível para todos, mas produzi-la com qualidade tem um custo, que é bancado essencialmente por nossos assinantes solidários. Escolha a melhor forma de você contribuir com nosso projeto jornalístico, que olha ao mundo a partir da América Latina e do Brasil.

Contra as fake news, o jornalismo de qualidade é a melhor vacina!

Faça uma
assinatura mensal
Faça uma
assinatura anual
Faça uma
contribuição única

Opera Mundi foi criado em 2008. É mais de uma década de cobertura do cenário político internacional, numa perspectiva brasileira e única. Só o apoio dos internautas nos permite sobreviver e expandir o projeto. Obrigado.

Eu apoio Opera Mundi
Receba nossas notícias e novidades em primeira mão!
Opera Mundi

Endereço: Avenida Paulista, nº 1842, TORRE NORTE CONJ 155 – 15º andar São Paulo - SP
CNPJ: 07.041.081.0001-17
Telefone: (11) 4118-6591

  • Contato
  • Política e Economia
  • Diplomacia
  • Análise
  • Opinião
  • Coronavírus
  • Vídeos
  • Expediente
  • Política de privacidade
Siga-nos
  • YouTube
  • Facebook
  • Twitter
  • Instagram
  • Google News
  • RSS
Blogs
  • Breno Altman
  • Agora
  • Bidê
  • Blog do Piva
  • Quebrando Muros
Receba nossas publicações
Receba nossas notícias e novidades em primeira mão!

© 2018 ArpaDesign | Todos os direitos reservados