Arquivo pessoal
Alemanha, Suíça, Itália e Bélgica saem, Japão ainda é incerto. Todos os demais 27 países que hoje operam usinas ficam, incluídos aí EUA, Canadá, Brasil, Grã-Bretanha, França, Rússia, Índia, China. Outros 45 países estão ativamente considerando entrar nesse setor, dos quais pelos menos 6 conseguiriam. Vamos aos fatos.
A questão da geração elétrica nuclear é complexa, na medida em que não envolve somente os típicos aspectos econômicos e ambientais, mas se reveste também de uma série de fatores políticos e sociais, além dos psicológicos, numa escala sem comparação com as demais indústrias. Buscarei oferecer algumas ideias sobre a situação atual.
Primeiramente, a geração elétrica nuclear no mundo tem apresentado uma ligeira queda. Após um recorde de produção de 2006 (cerca de 2.750 TWhora), os anos subsequentes não indicaram crescimento. Em 2011, a geração foi de 2.600 TWhora. Note-se que toda a geração elétrica brasileira é pouco superior a 500 TWhora. Existem, porém, duas tendências em curso:
1. Os países que foram os primeiros a adotarem a geração nuclear, isto é, os EUA, Europa, Japão e Rússia, têm tido uma geração praticamente constante. Os únicos que apresentam reduções significativas são o Japão e Alemanha, como consequência de Fukushima.
2. Os países que adotaram a geração nuclear mais tarde, particularmente os países em desenvolvimento, continuam a mostrar crescimento. A China e a Índia em particular, têm adicionado significativa geração nuclear. O Brasil, com o recorde de produção de Angra 1 e 2 em 2011 e a construção de Angra 3 segue essa tendência, reafirmada pelo Plano Decenal de Energia PDE-2021, colocado em consulta pública em 24 de setembro de 2012.
O que prevalecerá no longo prazo depende de como estas duas tendências opostas se equilibrarão. Existem novas instalações em construção e alguns “uprates” de antigas instalações existentes entre os países que possuem grandes parques de geração nuclear. Esse é caso dos EUA e França, mas principalmente da Rússia, que desenvolve um programa de construção de maior porte.
A geração elétrica nuclear fornece uma parcela significativa da produção de eletricidade do mundo, muito maior do que qualquer nova alternativa. Fazer uma mudança da geração nuclear para eólica ou solar fotovoltaica é muito difícil, especialmente dado às diferenças no seu regime de operação (nuclear na base, eólica e solar requerendo complementação pelas sazonalidades). Se o uso de eletricidade nuclear for reduzido, o resultado mais provável parece ser uma redução da oferta global de eletricidade ou um aumento no uso de combustíveis fósseis.
A geração nuclear é a maior fonte de eletricidade mundial depois de combustíveis fósseis e das hidrelétricas e constituem cerca de 12% da eletricidade mundial total. A eólica corresponde a cerca de 2% e a solar eleva-se a um quarto de um por cento (0,25%). Dentre as outras renováveis, incluindo a energia geotérmica, biomassa e lenha queimada, chega-se a cerca de 3%. Essas fontes certamente podem ainda ser muito ampliadas, mas não parece razoável crer que elas possam efetivamente substituir as três parcelas hoje predominantes.
NULL
NULL
Note-se que mesmo com o crescimento das energias renováveis, ainda tem havido um crescimento muito substancial na utilização de combustíveis fósseis nos últimos anos. Se o uso de eletricidade nuclear for reduzido, o uso de combustíveis fósseis poderá ter um crescimento ainda maior, como tem sido o caso do Japão e da Alemanha.
Para os países que planejam reduzir sua geração nuclear, suas percentagens na geração total de eletricidade em 2010 foram: Alemanha, 22%; Suíça, 37%; Bélgica, 52%; e Japão 25%. A menos que esses países possam contar com importações, será difícil gerar-se toda a quantidade de eletricidade perdida através da redução da demanda, eficiência energética ou através de uma mudança para as energias renováveis.
As centrais nucleares para as quais os custos de capital já estão amortizados geram eletricidade muito barata, com custos operacionais estimados em 2-3 centavos de dólar por quilowatt-hora (kWh). Qualquer tipo de mudança muito provavelmente irá requerer substituição por fontes de geração mais caras. Se a geração nova é adicionada para substituir a nuclear, é quase certo que isso aumentará as tarifas de eletricidade. Esses preços mais elevados serão considerados pelas empresas em suas decisões sobre onde localizar novas instalações e, talvez, resultar em mais de uma mudança na produção para países em desenvolvimento.
O interesse pela geração de todos os tipos será muito maior nos países em desenvolvimento, onde a economia está crescendo e a demanda por eletricidade está aumentando, do que nas economias estagnadas dos EUA, Europa e Japão. A expansão nuclear ocorrerá na Ásia-Pacífico, Oriente Médio, América Latina, Norte e Sul da África, Europa Oriental e Ásia Central, onde se encontram economias em crescimento, preocupadas com segurança energética.
O abandono do nuclear é uma tendência tipicamente da Europa Ocidental, por razões fortemente condicionadas pela política local, e do Japão, pelas conseqüências de Fukushima. Existem atualmente 64 usinas nucleares em construção no mundo (Argentina – 1, Brasil -1, China – 26, Taiwan – 2, Finlândia – 1, França – 1, Índia – 7, Japão – 2, Coréia do Sul – 3, Paquistão – 2, Rússia – 11, Eslováquia – 2, Ucrânia – 2 e EUA – 3). Novas construções na Grã-Bretanha, Canadá, Lituânia, Belarus e Emirados Árabes Unidos são esperadas em breve. Isso somará mais de 60GW ao parque nuclear mundial, ou seja, muito mais que todo o parque nuclear dos países que decidiram pelo abandono do nuclear, exceto Japão, que, afinal, ainda não tem uma decisão definitiva.
(*) Leonam dos Santos Guimarães é doutor em engenharia, assistente da Presidência da Eletronuclear e membro do Grupo Permanente de Assessoria da Agência Internacional de Energia Atômica