Faz agora um ano que entrei nessa embaixada [do Equador, em Londres], buscando refúgio porque estava sendo perseguido. Resultado dessa decisão: tenho conseguido trabalhar em relativa segurança, protegido contra os agentes dos EUA que investigam uma acusação de espionagem. Mas hoje, está começando o suplício de Edward Snowden.
Dois perigosos processos foram postos em movimento na última década, com consequências fatais para a democracia. O sigilo dos governos expandiu-se numa escala aterrorizante. E, simultaneamente, a privacidade dos seres humanos foi erradicada, em segredo. Há poucas semanas, Edward Snowden revelou ao mundo a existência de um programa secreto – que envolve o governo [Barack] Obama, a comunidade de inteligência e gigantescas empresas que vendem serviços de internet – para espionar todos, em todo o mundo. Resposta automática, como mecanismo de um relógio: Edward Snowden foi acusado de crime de espionagem pelo governo Obama.
O governo dos EUA espiona todos e cada um de nós… Mas é Edward Snowden quem é acusado de espionagem, porque nos alertou. Estamos chegando ao ponto em que a honra internacional por serviços prestados à humanidade não recai sobre quem tem um prêmio Nobel da Paz. Recai, isso sim, sobre quem seja acusado de espionagem pelo Departamento de Justiça dos EUA.
Agência Efe (17/06/2013)
Julian Assange aparece para discursar na embaixada do Equador em Londres
Edward Snowden é o oitavo vazador de informação secreta a ser acusado de espionagem no governo do presidente Obama. Na segunda-feira, o julgamento-show de Bradley Manning entrará na quarta semana. Depois de uma lista enorme de crimes e perversidades cometidas contra ele, o governo dos EUA tenta condená-lo por “ajudar o inimigo”.
A palavra “traidor” foi muito usada nos últimos dias. Mas quem é realmente o traidor, aqui? Quem prometeu “esperança” e “mudança” a uma geração, para imediatamente trair as próprias promessas, dando à população só miséria crescente e estagnação? Quem jurou defender a Constituição dos EUA, para imediatamente se pôr a alimentar a besta-fera de uma lei secreta, que vai devorando viva a Constituição dos EUA, de dentro para fora?
Que fim levou a promessa de fazer o governo mais transparente da história, mas que não faz outra coisa que perseguir um vazador depois do outro, nessa sequência macabra, esmagando-os sob o peso de acusações de espionagem? Quem assumiu, com mão de ferro, no Executivo, os poderes de acusador, juiz e carrasco, tentando fazer-se de dono do planeta, sobre o qual vai impondo todos esses poderes ilegítimos? Quem se arroga o poder de espionar o planeta inteiro – cada um de nós – e, quando é apanhado com as mãos sujas de sangue, explica que “teremos de escolher”? Quem é esse homem? Não pode haver dúvida alguma sobre quem declaramos “traidor”.
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Edward Snowden está conosco. É um de nós. Bradley Manning é um de nós. São jovens interessados em tecnologia, inteligentes: são a própria geração que Barack Obama traiu. São da geração que cresceu na Internet, modelada pela internet.
O governo dos EUA sempre carecerá de analistas de inteligência, de administradores de sistemas, e terá de buscá-los nessa geração e nas gerações posteriores. Um dia, essa geração comandará a NSA (Agência de Segurança Nacional), a CIA (central de inteligência dos EUA) e o FBI (polícia federal dos EUA). Não é fenômeno passageiro. É absolutamente inevitável. Ao tentar esmagar esses jovens vazadores, acusando-os de espionagem, o governo dos EUA ataca mortalmente uma geração inteira. E essa batalha, os EUA perderão.
Acusar, prender, matar, não é o modo certo de consertar coisa alguma. O único modo de consertar o que deva ser consertado é: mudem suas políticas! Parem de espionar o mundo. Ponham fim às leis secretas. Ponham fim à prisão por tempo indefinido, sem processo e sem acusação. Parem de matar gente. Parem de assassinar. Parem de invadir países e de mandar milhares de jovens norte-americanos para matarem e serem mortos. Parem de ocupar terras dos outros. Ponham fim às guerras clandestinas. Parem de destruir os jovens: Edward Snowden, Barrett Brown, Jeremy Hammond, Aaron Swartz, Gottfrid Svartholm, Jacob Appelbaum e Bradley Manning.
A acusação formalizada contra Edward Snowden visa a intimidar qualquer país que esteja pensando em ajudá-lo a defender seus direitos. Não se pode admitir que essa monstruosidade se consume.
Todos temos de intensificar os esforços para encontrar um país que dê asilo a Edward Snowden. Que país valoroso o defenderá, reconhecendo o inestimável serviço que prestou à humanidade? Diga ao seu governo, onde você estiver, que se apresente. Apresente-se você mesmo. Defenda Snowden!
Julian Assange é fundador do Wikileaks e se encontra retido na Embaixada do Equador em Londres desde 19 de junho de 2012. Artigo traduzido pelo blog Outras Palavras.