As eleições legislativas na Colômbia para renovar a Câmara e o Senado são o cenário que historicamente apresentam os mais altos níveis de infiltração mafiosa e fenômenos de compra de votos. Essa última eleição não foi exceção.
Opera Mundi percorreu, durante a última semana de campanha eleitoral, a costa colombiana desde o departamento de Córdoba, de origem pecuarista, onde nasceram os paramilitares das AUC (Autodefesas Unidas da Colômbia, o principal grupo terrorista paramilitar de extrema-direita do país) até o departamento do Atlântico e sua capital, Barranquilla. Toda essa região de costa caribenha do país tem sido historicamente um centro enorme de compra e negociação de votos, e, a partir desses Departamentos saíram muitos dos chamados “parapolíticos”, isto é, aqueles congressistas hoje condenados por terem mantido relações com os paramilitares.
Nesta região do país, os comícios eleitorais não têm nada de democráticos. Um relatório publicado poucas semanas antes da eleição, pela Fundação Paz e Reconciliação, analisando todos os candidatos à Câmara e ao Senado e calculando o risco de os candidatos herdarem estruturas da “parapolítica” ou de até de terem vínculos diretos com organizações criminosas, mostrou que 131 candidatos tinham esse risco.
Agência Efe
Presidente Juan Manuel Santos vota em eleições legislativas do domingo
Os departamentos de Bolívar, Cesar, Córdoba, Antioquia e Atlântico, isto é, a costa atlântica inteira, eram os departamentos com o mais alto número de candidatos em risco. Dos 48 citados entre os que se candidataram ao Senado, 22 foram eleitos, vários com número de votos bem altos, e, dos 80 candidatos à Câmara, 36 obtiveram uma cadeira.
Esse fenômeno é explicado com a facilidade e o costume de comprar votos: “aqui” — conta Diógenes Rosero, coordenador da MOE (Missão de Observação Eleitoral) do Atlântico — “as pessoas não dizem que votaram pela primeira vez, mas que venderam o voto pela primeira vez”. Opera Mundi pôde constatar que o custo da compra de um voto está por volta de 25 dólares em toda a costa colombiana.
O vice-presidente do país, Angelino Garzón, questionado sobre as numerosas denúncias de compra de votos, declarou: “os órgãos estatais devem rejeitar e condenar todos os atos relacionados a fraudes eleitorais, principalmente a compra e venda de votos”.
Mas, a realidade é que nenhuma autoridade se mexe. Em Barranquilla, Opera Mundi verificou que, no dia do voto, a quarta maior cidade do país ficou paralisada, porque os candidatos contrataram 70% dos ônibus de transporte público para trasladar seus eleitores para uma única mesa de votação. “Reúnem, como o gado, as pessoas que compraram o voto, para poderem controlá-las com mais facilidade, e as autoridades sabem e não fazem nada”, diz Rosero.
O governador do Departamento do Atlântico, José Antonio Segebre, comentou a Opera Mundi, que, de seu ponto de vista, não havia irregularidades, a não ser que os candidatos oferecessem um serviço de transporte ilegal aos seus eleitores.
Por outro lado, a alternativa a esses políticos, que normalmente representam partidos de direita como os Conservadores, o Partido de la U e o Centro Democrático, do ex-presidente Álvaro Uribe, é praticamente invisível.
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Mariano Guerra, candidato do partido UP (União Patriótica) em Montería, capital do Departamento de Córdoba, que não foi eleito, conta que teve de enfrentar, sem dinheiro, maquinarias políticas que chegaram a gastar até 1,5 milhão de dólares. Mas esse não é o único problema: “Não podemos pregar cartazes ou fazer campanha” — continua Mariano — “porque não permitem que utilizemos os espaços públicos e vivemos sob a constante ameaça de atentados.”
Partido dos brancos e nulos
Nesse cenário, que não é novo na Colômbia, os resultados eleitorais têm de ser vistos, além disso, levando em conta que houve abstenção de 57% dos eleitores. Dos que votaram, a soma de votos em branco e votos nulos chega a 21%, formando o maior partido do país.
O Senado tem, sem dúvida, os resultados mais interessantes, porque é lá que o futuro de processo de paz com as FARC, que o governo está adiantando em Havana, será decidido.
Agência Efe
Novo partido de Álvaro Uribe se tornou principal força de oposição ao presidente Santos
Ali, a coalizão de partidos que apoia o presidente Juan Manuel Santos perdeu seis cadeiras, especialmente por causa do golpe dado pelo Partido de la U, que tem suas raízes no “uribismo” (nome dado na Colômbia aos partidos defensores de Uribe), e que deixou seu velho líder para apoiar Santos.
O novo partido de Uribe, o Centro Democrático, faz uma entrada triunfal no Senado com 19 cadeiras, que ainda assim não são suficientes para que superar as 21 do Partido de la U tem e se transformar no maior partido.
O governo parece estar sob a chantagem do Partido Conservador, que tem duas correntes internas, uma “santista” e uma “uribista”. Sem os conservadores, o governo não tem a maioria absoluta do Senado para aprovar as leis.
A esquerda dividida conseguiu apenas dez cadeiras: cinco vão para o Polo Democrático e outras cinco, para a Aliança Verde.
O Senado volta a ser uma câmara muito política: além de voltar à política ativa do já mencionado ex-presidente Uribe, entram também, pela Aliança Verde, Iván Cepeda, senador como era seu pai quando foi assassinado, a estudiosa do paramilitarismo Claudia López, Navarro Wolf (histórico dirigente da guerrilha M-19) e a ex-procuradora-geral Viviane Morales. Enquanto isso, o senador Jorge Robledo do Pólo (Democrático Alternativo, também de esquerda) viu premiados seus esforços, sendo reeleito, com 200 mil votos – o melhor resultado entre todos os candidatos.
A grande pergunta de quase todos os analistas é: mas se as Câmaras são eleitas entre fraudes, abstencionismo e votos em branco, elas têm legitimidade para guiar o país em um momento tão importante da sua história?