A depender de uma boa dose de humor mórbido ou uma escancarada adesão ao cinismo necrófilo poderíamos comemorar a semana que passou aos gritos de “É Campeão!”.
Comentaristas mais entusiastas destacariam que o mundo se curva mais uma vez diante do talento do brasileiro, da sua ginga, da sua incrível capacidade de mergulhar no esgoto (ops.).
Recordes não nos faltam, apesar de contraditórios entre si. A política deliberada de morticínio massivo como forma de preservação da economia atinge extremos de sucesso. Na primeira parte da equação.
Já somos, uhu!, os primeiros do planeta em percentual de novos contaminados por 100 mil habitantes e vamos por mais conquistas.
Chegamos a 260 mil mortos, segundões, mas ainda atrás dos Estados Unidos. Mas com a eleição do fracote Biden, que resolveu ouvir cientistas e começar um processo acelerado de vacinação, eles não conseguirão manter a dianteira. Em breve chegaremos lá! Afinal, mantendo, ou se possível melhorando, nossa média diária de 1.300 mortos, conseguiremos em poucos meses subir ao pódio no lugar que merecemos.
Porque o futebol já nos ensinou que segundo lugar é derrota. E o presidente fodão e com histórico de atleta vive insistindo que máscara, cuidados e o tal do distanciamento social é coisa de maricas. E como a geral sempre soube, futebol não é coisa pra maricas. Tem o juiz, mas isso é outra conversa.
Também estamos provando que isso não tem nada a ver com ideologia. Afinal, o centrista do norte-americano Biden e o direitista do britânico Boris Johnson arregaram, ambos, diante da gripezinha. Horror dos horrores, não só estão vacinando como cedendo aos cientistas idiotas que defendem o tal do “lóquidaun”.
Marcelo Seabra / Ag. Pará
Recordes não nos faltam, apesar de contraditórios entre si
Eles vão pagar o preço econômico de sua covardia. Ninguém deve se iludir com o fato de nosso PIB estar derretendo. Saímos do grupo dos dez países mais ricos do mundo, e daí?
Tem 16 milhões de desempregados? Mentira. Todo mundo sabe que só não trabalha quem não quer. Além disso, querem que o presidente faça o quê? Que vá buscar vacina, ou empregos, na casa da mãe dele?
E como tem intelectual idiota reclamando, o governo faz o que tem que fazer mesmo. Ameaçar prender todos eles. Lembrar que a universidade é o lugar de aplaudir e não de procurar picuinha pra encher o saco. Se não dá pra fechar todas, que é o que o bando de maconheiros merecia, pelo menos vamos calar a boca deles, porra!
Para completar essa semana gloriosa faltava apenas que um senhor muito respeitado, intelectual das antigas e ex-presidente da república (duas vezes: dizem que a segunda foi roubada, mas isso é fofoca) confessou, num sinal de humildade, que sentia “um certo mal-estar” por não ter votado contra o presida.
Liga não, professor, logo bateremos todos os recordes, ocuparemos o lugar que é nosso por direito no desconcerto das nações e o senhor superará seu mal-estar. Afinal, os seus amigos continuam ganhando um montão de dinheiro e isso, como o senhor sempre soube, é tudo que importa.
(*) Carlos Ferreira Martins ´é professor titular do IAU USP São Carlos.