Recebo e-mail da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (ANPOCS) informando mudanças nas regras para publicação em suas revistas. Eu confesso que não entendo pra que tanta regra – e regras tão estritas.
A Revista Brasileira de Ciências Sociais (RBCS) anuncia que só aceitará artigos entre sete e nove mil palavras. Se estiver fora disso, não será sequer avaliado.
Um texto de, digamos, seis mil palavras não pode fazer uma contribuição pertinente? Será necessário encher linguiça? E não é possível que um artigo tenha fôlego para sustentar 10, 12 mil palavras, até mais, com argumentação consistente e relevante?
É claro que um artigo muito curto corre o risco de se tornar superficial ou incompleto. E um muito longo, de ficar rebarbativo ou digressivo.
Mas existe avaliação antes da publicação. Proibir a priori, com uma norma absolutamente arbitrária, não me parece o melhor caminho.
Quase todas as revistas fazem isso, pelo menos na imposição de limite máximo – uma herança, talvez, de quando as revistas eram impressas e artigos longos implicavam aumento considerável de custos.
Mas acho mais interessante quando o que se faz é indicar o tamanho “normal” esperado do texto – e quem quiser submeter algo fora dos parâmetros sabe que deve confiar no próprio taco.
Pior ainda me parecem as novas regras da Banco Industrial do Brasil (BIB). Tem também um limite de tamanho, desta vez em caracteres – 20 a 40 mil, o que significa ainda menos do que na RBCS.
Para um balanço bibliográfico, que é o material que a BIB publica, é pouco.
As regras incluem uma recomendação de que os autores incorporem “metodologias informacionais […] tais como cientometria, infometria”.
Pxhere
Um texto de seis mil palavras não pode fazer uma contribuição pertinente? Será necessário encher linguiça?
Há uma distância grande entre o balanço bibliográfico clássico, que implica a reconstrução crítica do debate de uma determinada questão, e a bibliometria. A recomendação, somada ao tamanho diminuto pretendido para os artigos, sinaliza uma mudança importante – e, segundo meu modo de ver, empobrecedora – da orientação da BIB.
Fica determinado também que os balanços bibliográficos só podem discutir trabalhos publicados nos últimos 10 anos.
Deve ser para incentivar o turnover nas bibliografias. E nós, bobões, que continuamos a ler Bourdieu, Young e Freire, e ainda Marx, Weber e Durkheim, quando não Maquiavel ou Aristóteles…
É outra imposição arbitrária, que orienta a BIB para um foco muito restrito (e muito desinteressante).
Eu mesmo estou começando a revisitar, de forma sistemática, o debate sobre democracia ocorrido no Brasil, no meio de campo entre as ciências sociais e a intelectualidade de esquerda, durante a ditadura de 1964. Percebo agora que um balanço desta discussão não interessa à BIB. Velharias, afinal.
Estou há bastante tempo no metiê – dentro de alguns meses, vou completar 25 anos como professor. Sinto que acompanhei um longo processo, que agora se conclui e do qual as mudanças que critiquei nesta postagem são indícios menores, de triunfo do fordismo acadêmico. Acho triste.
(*) Texto publicado originalmente no Facebook do autor.