Equador sob suspeita
Sob “a mais grotesca fraude eleitoral” Daniel Noboa é reeleito no Equador
Quando a direita tem o controle das Forças Armadas, da polícia, dos órgãos eleitorais e judiciais, da imprensa concentrada, bem como o apoio do poder econômico e financeiro de um país, é altamente provável que os processos eleitorais se tornem um ritual sem relevância, pois os resultados serão aqueles que se adequam aos seus interesses. Os governos de ultradireita de Lasso e Noboa transformaram o Equador em pouco mais do que sua propriedade privada, com uma institucionalidade incompatível com os padrões democráticos elementares.
O que acabou de acontecer em 13 de abril foi uma “fraude eleitoral grotesca” segundo a candidata de esquerdaLuisa Gonzales, que ilustra o comportamento da ultradireita quando vê seus interesses em perigo. Todas as pesquisas anteriores mostravam Luisa Gonzales como a vencedora e, no pior cenário, previam um “empate técnico” com diferenças mínimas a favor de um ou de outro candidato. Além disso, as pesquisas de boca de urna davam a vitória a Gonzales com 4 ou 5 pontos percentuais de diferença. Como é possível que, da noite para o dia, a vontade popular tenha mudado? Como é possível que os resultados dêem incríveis 11 pontos percentuais de diferença a Noboa?

(Foto: Isaac Castillo / Presidencia de la Republica)
A ultradireita política e econômica desse país fez o que sabe fazer: fabricar resultados e presidentes com fraudes grosseiras que, enquanto permanecerem no poder, ficarão impunes. Contra todas as probabilidades, eles manipularam estatísticas, informações e aparato governamental para reeleger Daniel Noboa, nascido em Miami e submissamente alinhado ao governo Trump.
Os fatos que compõem a fraude são irrefutáveis, por isso a OEA, a presidente do México, Claudia Sheinbaum, e o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, não reconhecem a reeleição de Noboa. Aqui estão alguns fatos que claramente constituem fraude:
- “Militarização e estado de exceção” um dia antes do processo eleitoral nas principais zonas eleitorais. O objetivo era óbvio: intimidar os cidadãos no momento de exercer seu voto e limitar ao máximo a presença de delegados dos partidos no controle do processo eleitoral. Com 50.000 efetivos posicionadas em todas as seções eleitorais para “salvaguardar” e transferir as cédulas e as folhas de contagem, mas, acima de tudo, para intimidar os cidadãos no momento da votação. Portanto, não houve “eleições livres”.
- Abuso de poder e corrupção. No primeiro e no segundo turno, Noboa não pediu licença não remunerada, conforme estabelecido no Art. 93 do Código de Democracia. Em vez disso, como presidente/candidato, ele usou bens e recursos do Estado para fazer campanha com a participação aberta de seus ministros em ações de proselitismo. Mas como o abuso de poder não tem limites, ele não apenas colocou todos os órgãos eleitorais sob seu controle, como também fez campanha em meio ao “silêncio eleitoral”, violando a lei. Como se isso não bastasse, a corrupção conseguiu incluir a família presidencial em sua folha de pagamento, conforme documentado por jornalistas que acabaram pedindo asilo na Colômbia.
- Campanha ilegal e prepotente. Noboa, usando ilegalmente os meios oficiais e os recursos do Estado para sua campanha, não hesitou em mudar a localização de 24 seções eleitorais no último minuto, precisamente nos locais onde havia perdido esmagadoramente no primeiro turno. Também permitiu a expulsão de representantes da oposição que tentaram exercer seu direito de vigilância, inundou as redes sociais com mentiras e falácias, entre outros.
- O primeiro e o segundo turno. Tal é o tamanho da trapalhada cometida na fraude que a ultradireita não se preocupou com a coerência da farsa que havia sido encenada. Nos resultados do segundo turno, Luisa Gonzales tem os mesmos votos ou menos do que obteve no primeiro turno. Essa grosseria lógica não levou em conta nem mesmo uma fração do apoio oferecido por Leónidas Iza, do movimento Pachacutik, que obteve 5% do eleitorado no primeiro turno. Portanto, os resultados não apenas carecem de lógica, mas contradizem todas as pesquisas anteriores, bem como as “pesquisas de intenção de voto” realizadas pela própria direita.
- Presença de mercenários. Perto do final de sua campanha eleitoral, Noboa mostrou ao Equador um acordo com a organização mercenária que opera internacionalmente sob o nome de Blackwater, dentro da estrutura do “Plano Fênix”, a estratégia do governo para a luta contra o tráfico de drogas. O líder dos mercenários, usando meios institucionais, pediu aos cidadãos que votassem em Noboa porque, se não o fizessem, o Equador se tornaria outra Venezuela.
A OEA, por meio do chefe da missão eleitoral no Equador, Heraldo Muñoz, advertiu sobre as dificuldades para os partidos exercerem seu direito de controle em locais com um “estado de exceção”. Da mesma forma, o Observatório de Comunicação e Democracia advertiu sobre a “trapaça nas urnas” e a ALBA-TCP condenou a “manifesta fraude eleitoral”.
Os fatos descritos, que violam abertamente as normas legais para fins políticos, afetando a justiça e a tranquilidade do processo eleitoral, constituem um cenário de fraude. Claudia Sheinbaum e Gustavo Petro não reconhecem as eleições de Noboa, enquanto a OEA aponta graves irregularidades no processo eleitoral que prejudicam a legitimidade da reeleição.
Nessas circunstâncias, parece justo atender ao pedido de recontagem dos votos e de abertura das urnas, para que o partido governista e a oposição possam confirmar o que dizem sobre a transparência e os resultados das eleições. Em todo caso, o cenário pós-eleitoral abre um novo capítulo na política equatoriana, onde, além da violência criminosa nas ruas, se instalará a tensão e a polarização política e social em escala ascendente, anunciando a “resistência à fraude” que Luisa Gonzáles liderará depois de repudiar a vitória do ultradireitista Noboa.
Aviso para o Peru
É verdade que o Peru não é o Equador, mas a ultradireita em ambos os países é da mesma laia, com a diferença de que os poderes de fato (econômico-financeiros) no Peru ainda fazem uso da vassalagem política, enquanto no Equador esses poderes de fato decidiram tomar o poder em suas próprias mãos. Em ambos os casos, o respeito à democracia e à vontade do povo é uma falácia, enquanto o autoritarismo e sua falta de escrúpulos ganham força e ascensão. O respeito à Constituição foi substituído pelo respeito à comercialização de favores políticos e à destruição da institucionalidade, etc. O Peru está nas mãos de uma ultradireita muito mais venal do que a do Equador. A caracterização da quadrilha que governa esse país como uma “coalizão mafiosa” não é gratuita. As próximas eleições, em abril de 2026, serão o palco onde a farsa, a fraude e o abuso serão mais esplêndidos se o povo não conseguir detê-los com suas lutas e resistência.
(*) Nilo Meza é economista e cientista político peruano.
