Terça-feira, 13 de maio de 2025
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Glauber Braga foi arrastado ao cadafalso da Comissão de Ética com a fúria seletiva de quem nunca escondeu a vocação autoritária. O caso teve pressa, escândalo e ameaça. Glauber reagiu com o único gesto que lhe restava: a greve de fome. Um gesto extremo, mas coerente com a escalada que se impôs. Expôs o excesso e o desequilíbrio. Fez com que, mesmo entre adversários, alguns se perguntassem: até onde vai a sanha de um Congresso que normaliza tanto o intolerável?

A greve de Glauber rompeu o silêncio constrangedor e convocou solidariedades. Vieram do PSOL, do PT, de artistas e intelectuais, religiosos, movimentos sociais, de gente que transita pela esquerda crítica e até de figuras da base governista, como Lindbergh Farias e Gleisi Hoffmann. Sidônio Palmeira, homem de confiança de Lula, também se manifestou. Mesmo parte da direita, aquela que sabe farejar o momento político, preferiu o recuo tático à execração pública. Em tempos de desordem moral, a coragem de Glauber forçou a modulação do espetáculo.

Foi aí que Hugo Motta, presidente do Conselho de Ética, anunciou 60 dias para a defesa. A cassação sumária deu lugar a uma pausa. Não é recuo definitivo — Motta garantiu que, ao fim do prazo, colocará em votação —, mas é uma trégua, ainda que envergonhada. E convenhamos: não se produz esse tipo de mudança de ritmo sem que Lula tenha ao menos mexido discretamente as peças. Motta é aliado direto de Lira, e nada ali se move fora de um acordo maior.

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Claro que isso gerou ruído. A ala do PSOL que se opõe frontalmente ao governo Lula diz que Lula nada fez. A ala governista, por sua vez, vê na pausa unicamente a digital do presidente. Nem uma coisa nem outra. As duas leituras erram por excesso. É tolice achar que Lula salvaria Glauber com um estalar de dedos. Mas também é irreal não enxergar que houve uma ação coordenada, ainda que discreta, para dar sustentação ao gesto radical do deputado fluminense — que, vale lembrar, foi um dos que mais defenderam Lula, com coragem, no momento mais sombrio de sua trajetória, durante a prisão.

Vinícius Loures/Câmara dos Deputados
Deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ)

Glauber foi valente. Se expôs, colocou o corpo no centro do conflito, tensionou os limites. O grupo de Lula, ao seu modo, complementou com o que tinha: influência. Se Glauber encarnou a denúncia, os aliados do governo atuaram nos bastidores para evitar o pior. Não há contradição aqui — há uma forma, ainda rara, de complementaridade entre crítica e governabilidade. Quando feita com discernimento, uma não anula a outra.

E é justamente disso que a esquerda não pode abrir mão agora: discernimento. O que ela menos precisa, diante da brutalidade que se impõe por todos os lados, é repetir o ritual autofágico entre o sectarismo e o governismo cego. Em vez de brigar por pureza ou por blindagem, é hora de reconhecer que há lutas que se vencem a muitas mãos. Glauber, com sua coragem, e o governo, com sua articulação, evitaram juntos uma injustiça. Que se aprenda com isso.