Servidores e professores das instituições federais de ensino estão em greve há mais de dois meses, exigindo reparação salarial e recomposição no orçamento da educação. Até o momento, são 62 sessões em greve, segundo o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-SN). Enfrentando chumbo pesado, a mobilização tem sido fundamental para jogar luz sobre a devastação que acometeu a educação pública nos últimos anos.
Por um lado, a mídia burguesa ataca a luta dos servidores, como o fez o estúpido editorial do jornal O Globo da última semana. Sem dúvidas, o artigo demonstra um profundo desconhecimento sobre orçamento público, educação, direitos trabalhistas, etc… seu único valor, na realidade, está no fato de que coloca em debate público o inegável papel dessas mídias na disseminação da ignorância e apoio à destruição dos direitos do povo.
No outro extremo do debate, o governo federal poderia endossar essa mobilização para enfrentar com as ruas o reacionário Congresso Nacional, grande responsável pelos cortes no orçamento da educação e demais retiradas de direitos. Entretanto, também escolheu criticar a greve: ofereceu reajuste zero para 2024 e ainda tentou encerrar as negociações de forma unilateral ao assinar um acordo com o PROIFES (entidade que não representa a base da categoria docente).
Ainda assim, a greve ganha força na medida em que conquista apoio com as greves estudantis e arranca vitórias concretas: no último dia 11, a pressão sobre o governo fez Lula anunciar um PAC de investimento de R$ 5,5 bilhões até 2026 e mais R$ 400 milhões para o custeio de 2024, além de reabrir as mesas de negociação.
“Estudante quer estudar”
De fato, quando há intenção de mobilizar a opinião pública contra as greves na educação, governos e patrões apelam para os sentimentos de prejuízo às famílias e estudantes com as aulas paralisadas.
No anúncio que foi feito durante a reunião com os reitores em Brasília, o presidente Lula criticou a greve: “quem está perdendo não é o Lula, quem está perdendo não é o reitor, quem está perdendo é o Brasil e os estudantes brasileiros.”
Mas não é a greve que impede os estudantes de estudar. Basta entrar numa sala de aula em qualquer canto desse país para entender a situação das universidades brasileiras.
Sem dúvidas, estamos lutando há anos para ter o direito de estudar. São mais de dez anos de perdas orçamentárias que afetam diretamente o funcionamento das instituições federais de ensino. Não é possível desenvolver plenamente a finalidade da universidade se faltam insumos nos laboratórios, se o quadro de professores está defasado, se as turmas estão superlotadas e faltam vagas para os estudantes progredirem no curso. A título de exemplo, uma única disciplina teve 400% de requisição de matrícula no período regular da Universidade Federal do ABC, conhecida como universidade-vitrine das federais.
A conclusão óbvia é que, para uma parcela considerável dos estudantes, já não é possível hoje concluir os estudos.
Saídas para o problema das universidades
Os aportes feitos pelo governo no pronunciamento dessa semana realmente são um suspiro para a educação, mas os anos de entulho dos governos golpistas deixam uma demanda muito maior para equilibrar as contas das universidades e institutos federais: o total necessário é de R$ 2,5 bilhões para verbas de custeio.
Lula e seus ministros alegam que são muitos anos de destruição, pedem aos trabalhadores e estudantes paciência.
Por outro lado, a direita encontra terreno para apresentar suas falsas soluções, alegando que o Estado tem recursos minguados, que “é hora de discutir ganhos de produtividade e outras fontes de renda.” E vem com propostas como cobrança de mensalidade pelos estudantes, acordos com a iniciativa privada, “otimização” da administração com terceirizações e outros escombros neoliberais.
Se não disputarmos os rumos da educação pública, vamos assistir mais episódios catastróficos como a tentativa de privatização das escolas no Paraná na última semana, justificados pela suposta escassez de recursos do estado.
O ANDES-SN, SINASEFE e demais entidades da educação apontam a saída: é preciso colocar o dedo na ferida, virar os canhões das ruas para o Congresso Nacional, enfrentar os bolsonaristas, construir uma auditoria da dívida pública, colocar o orçamento na mão do povo.
(*) Isis Mustafa é dirigente do partido Unidade Popular pelo Socialismo e 1ª vice-presidente da UNE.