Um tema que traz enormes preocupações, fundamental para os candidatos e candidatas às eleições deste ano, é o do financiamento da campanha. Não se planeja um mandato sem que esse assunto seja enfrentado logo na primeira reunião.
Árido, precursor de inúmeros embates jurídicos, políticos e usado também como forma de perversão judicial, o financiamento das campanhas eleitorais é assunto espinhoso, que divide mentes.
As eleições brasileiras vêm sendo financiadas principalmente por meio de recursos públicos advindos do Fundo Especial para o Financiamento de Campanhas (FEFC), criado pela Lei Federal n.º. 13.487/2017, constituído por recursos do orçamento da União em ano eleitoral. Acrescem-se a esta forma de financiamento majoritário as doações no âmbito privado, realizadas por meio de doações de pessoas físicas e do próprio candidato ou candidata à sua campanha, além do Fundo Partidário, cuja composição é mista por natureza. Esse modelo misto de financiamento de campanhas eleitorais tem a maior composição advinda do FEFC.
As regras para a distribuição do FEFC entre os partidos e as federações estão na sua lei de criação e nas Resoluções do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nº 23.605/2019 e n.º. 23.607/2019. Seus recursos só serão transferidos para os partidos políticos e federações quando estes demonstrarem ao TSE quais são os critérios de distribuição aos seus candidatos, decisão tomada pela Comissão Executiva Nacional partidária ou federativa. Cabe ao TSE avaliar previamente apenas se as cotas de gênero e de pessoas negras estão sendo respeitadas na distribuição dos recursos, mas, quanto ao demais aspectos, é a autonomia partidária que definirá como ocorrerá a sua repartição. E é a partir daí que começam os desafios para as candidaturas.
Um primeiro desafio trata do recebimento, pelas candidaturas, dos recursos na sua conta eleitoral. Neste ano, a eleição começa em 16 de agosto, mas os recursos, no âmbito geral, não têm data definida para chegar nas contas eleitorais de cada candidatura. Somente os valores referentes às cotas de gênero feminino e de pessoa negra devem ser enviados às candidaturas até o dia 30 de agosto, ou seja, 15 dias após o início do período eleitoral. Considerando o curto tempo de campanha, o recebimento tardio desses recursos causa dificuldade, mormente quando ele é o principal financiamento.
Outro desafio a ser enfrentado diz respeito à própria definição do quanto será distribuído a cada candidatura. Esta regra decorre da definição da Executiva Nacional partidária ou da Federação. A força dos representantes partidários atuais, principalmente aqueles com mandatos eletivos, é ponderada nas agremiações partidárias, tendo em vista que a contabilização do quanto do FEFC será destinado a cada uma delas decorre também das representações atuais na Câmara dos Deputados (deputados federais) e no Senado (senadores). Mas, ao mesmo tempo, outros elementos são considerados no momento de realizar a distribuição para cada uma das candidaturas em disputa, tais como: a possibilidade da candidatura ter sucesso; se trata-se de candidato que concorre à reeleição; a estrutura que disporá para a campanha; a amplitude e as características da candidatura. Ou seja, há diferenciações que são feitas no momento de dividir o bolo dos recursos do FEFC que muitas vezes não atendem às expectativas de cada candidatura.
E há ainda aqueles partidos que têm dono quase que único, nos quais as definições de divisão de recursos financeiros passam pelo desejo de quem os controla, o que causa insatisfações também.
Nestas eleições, o montante do FEFC a ser distribuído será de R$4,9 bilhões de reais entre as agremiações partidárias atuantes em cada um dos 5.570 municípios. O financiamento público de campanha é uma forma da sociedade brasileira dizer que as eleições são um evento importante para a sua democracia, de priorizá-las enquanto investimento público nacional. Existem desafios a serem dirimidos nesse processo de consolidação do financiamento público de campanha, como o prazo do recebimento dos recursos e a forma de distribuição pelos partidos políticos e federações. Mas estes são pontos de aperfeiçoamento, que a cada pleito devem evoluir, buscando atender aos princípios eleitorais democráticos.
Ao mesmo tempo, optar por destinar recursos do orçamento público para financiar candidaturas, em vez destas pleitearem doações de pessoas jurídicas, como aconteceu outrora, é iniciativa que tem mais condições de garantir o equilíbrio entre os postulantes, bem como diminuir os riscos do financiamento condicionar, no futuro, as ações do parlamentar ou chefe do Poder executivo eleito.
Os desafios estão dados, mas não há dúvidas de que o financiamento público das campanhas eleitorais é o melhor caminho para fortalecer a democracia brasileira.
(*) Renata Martins Domingos é advogada, Mestre em Direitos Humanos e já trabalhou em várias campanhas eleitorais assessorando juridicamente candidaturas. Também já foi gestora pública e exerceu o cargo de Secretária de Saúde da Prefeitura do município de Conde, Paraíba.