Terça-feira, 13 de maio de 2025
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Quando a fumaça branca saiu da Capela Sistina em 13 de março de 2013, Jorge Mario Bergoglio estava eleito o 266º Papa da Igreja Católica. Sob o entusiasmo dos setores mais tradicionalistas do Vaticano, as análises ao redor do mundo davam conta de que ali se iniciaria um papado conservador, fortemente alinhado com o legado de Bento 16, que havia renunciado ao cargo máximo do clero católico. Nem mesmo a escolha do nome Francisco, uma homenagem a São Francisco de Assis, reverenciado por sua vida de pobreza e humildade, foi capaz de diminuir o contentamento daqueles que defendem a manutenção do conservadorismo no catolicismo. 

A aposta de que papa Francisco seria um defensor das tradições e não apoiaria pautas progressistas não era sem fundamento. Nascido na Argentina, ainda quando padre em Buenos Aires, chegou inclusive a ser acusado de ter traído dois colegas padres, tidos como comunistas pelo regime, por fazerem trabalho social. Reportagens publicadas nos anos 1990 apontaram Mario Bergoglio como confessor do general Jorge Rafael Videla, que mais tarde seria condenado por crimes contra a humanidade. Quando Francisco assumiu o trono de São Pedro, uma das críticas de ativistas argentinos foi por não ter excomungado Videla.

Rio de Janeiro (RJ), 21/04/2025 – O arcebispo do Rio de Janeiro, Cardeal Dom Orani João Tempesta, celebra missa em sufrágio do Papa Francisco na Catedral Metropolitana. <br>(Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)
Rio de Janeiro (RJ), 21/04/2025 – O arcebispo do Rio de Janeiro, Cardeal Dom Orani João Tempesta, celebra missa em sufrágio do Papa Francisco na Catedral Metropolitana.
(Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)

Nem tão no passado assim foram as pautas progressistas tratadas com recusa por Francisco. Em 2010, quando ainda era arcebispo de Buenos Aires, a Argentina aprovou o casamento entre duas pessoas do mesmo sexo. Bergoglio então escreveu: “Não sejamos ingênuos. Não se trata de uma simples luta política, mas da pretensão destrutiva do plano de Deus, de um homem e uma mulher crescerem e se multiplicarem”.

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Voltemos para março de 2013. Mario Bergoglio se tornou papa Francisco e muita coisa mudou. As especulações sobre as razões da metamorfose progressista do hoje conhecido como papa dos pobres são diversas, passam de posicionamentos pessoais até o fato de ser latino – nunca saberemos com certeza. Mas os fatos que se sucederam a partir do início do papado de Francisco são muitos e mostram com clareza as mudanças que estariam por vir, do comportamento mais ativo sobre temas polêmicos até as declarações pouco comuns para um Papa. Mas também demonstram o limite que o papa Francisco estabeleceu entre suas declarações mais progressistas e uma reforma total nos pilares mais conservadores da Igreja Católica.

Sobre a pauta LGBTQIAPN+, Francisco questionou: “Se uma pessoa é gay e busca a Deus e tem boa vontade, quem sou eu para julgá-la?”. Não precisamos aprofundar a análise para logo entendermos o impacto que uma frase como essa, dita pelo papa, tem. Se nem o líder máximo dos católicos pode questionar a escolha de duas pessoas de viverem uma vida juntos, nenhum outro deve poder. No mesmo ano passou a autorizar que casais do mesmo sexo fossem oficialmente abençoados em igrejas, tirando qualquer dúvida sobre seu posicionamento sobre o tema e deixando as partes mais conservadoras da Igreja Católica em perturbação. 

O papa Francisco também demonstrou um posicionamento progressista em outros temas de relevância mundial. Emergência climática, imigração, segundo casamento, guerras na Ucrânia e na Palestina – essa segunda denunciando o massacre promovido por Israel contra um povo desarmado: “Ontem, crianças foram bombardeadas. Isto não é uma guerra, é crueldade”, disse o pontífice. Francisco também defendia papéis de maior destaque para as mulheres no Vaticano, posição vista por muitos como progressista para os padrões da Igreja Católica.

Porém, como já citado, papa Francisco impôs limites aos seus posicionamentos progressistas. Se por um lado foi duramente criticado pela direita  por suas declarações à esquerda demais para um líder religioso, também foi julgado pelos mais progressistas – dentro e fora da Igreja – por ter parado no discurso e não ter promovido nenhuma mudança profunda. Será que podemos afirmar que o papa era de esquerda no discurso e parou por aí?

A verdade é que o Padre Santo muito mais falou do que fez. Para um mero mortal como nós, tal comportamento seria taxado até de hipócrita, mas nosso discurso não tem o poder das palavras do papa, nem tampouco somos capazes de entender o tamanho da dificuldade que é reformar uma instituição com mais de 2 mil anos. A minha resposta para a pergunta do artigo: o papa quis ser de esquerda; se ele foi, deixo com vocês.

(*) Tom Altman é economista e empresário. É diretor-geral de Opera Mundi.