Tenho dito sempre que um projeto de desenvolvimento do Brasil tem que contemplar um sólido programa para a área de ciência, tecnologia e inovação. Sem isso, não teremos competitividade. Portanto, é um grande alento saber que a 5ª Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia, que se realizou de 30 de julho a 1º de agosto, em Brasília, terá, como resultado, propostas para os grandes desafios que se colocam para o país, baseadas em documentos que são resultado de 270 eventos preparatórios que aconteceram em todos os estados a partir de dezembro de 2023 e envolveram cerca de cem mil pessoas da academia, de governos, da indústria e da sociedade civil.
Os eixos temáticos da 5ª Conferência, realizada após 14 anos, foram recuperação, expansão e consolidação do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação; Reindustrialização com apoio da inovação para as empresas; CT&I para os projetos estratégicos nacionais; e CT&I para o desenvolvimento social. Esses eixos temáticos constituíram a base para a construção de um temário que elegeu, como prioridade, as mudanças climáticas e demográficas, além de um panorama da evolução da ciência no Brasil e no mundo.
Tão importante quanto o debate dos problemas e a formulação de propostas por um conjunto tão expressivo de especialistas é o encaminhamento a ser dado ao resultado da Conferência. O jornalista Luis Nassif, que acompanhou a abertura do evento, comenta, em sua coluna, que serão constituídos grupos de trabalho interministeriais e intersetoriais para acompanhar a implementação das propostas contidas nos documentos, propostas estas que são de curto, médio e longo prazos.
Uma das barreiras para levar à frente as propostas apresentadas é a falta de recursos. Na abertura do evento, Sergio Rezende, ex-ministro de Ciência e Tecnologia e secretário-geral da 5ª Conferência, lembrou que o Brasil nunca investiu em CT&I além de 1,3% do PIB, quando alguns países destinam ao setor até 5%. Ele defendeu a necessidade de se criar novos fundos para financiar os programas de ciência, tecnologia e inovação que são fundamentais para o desenvolvimento do país, com sustentabilidade e justiça social.
De onde poderia vir o dinheiro? Alguns apontam setores que se beneficiaram muito dos avanços tecnológicos, como o agronegócio e o sistema financeiro. Este, aliás, só no ano passado embolsou 700 bilhões de reais com o pagamento dos juros da dívida.
Inteligência artificial
Na cerimônia de abertura da 5ª Conferência, foi entregue ao presidente Lula, pelo Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia, subordinado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, o Plano Brasileiro de Inteligência Artificial – PBIA. Pela sua relevância, o PBIA, que havia sido encomendado por Lula, se transformou na grande estrela do evento.
Com orçamento previsto de 23 bilhões de reais para o período de 2024-2028, o PBIA apresenta objetivos audaciosos. Entre suas ações estruturantes estão, segundo o documento, garantir a soberania tecnológica, a competitividade da economia e o uso responsável da inteligência artificial. E isso será feito gerando capacidades e capacitação de recursos humanos nacionais, com alinhamento e integração à Nova Indústria Brasil, e garantindo a sustentabilidade e eficiência energética.
Em artigo recente onde defendia que havia espaço para o Brasil investir na indústria de inteligência artificial, eu expressei minha preocupação com que o PBIA, que ainda não tinha sua versão final, se limitasse ao desenvolvimento de aplicativos no país sem investir nos sistemas mais estratégicos da IA. Mas isso não aconteceu. O PBIA contempla o desenvolvimento de modelos de linguagem em português com dados nacionais que abarcam nossa diversidade cultural, social e linguística.
Para compor o orçamento do Plano, vão ser usados créditos da Finep, BNDES e outros (a maior fonte, responsável por 12,72 bi), do FNDCT (5,57 bi) e de outras fontes com menor participação: LOA, setor privado, estatais.
O PBIA também prevê que, em cinco anos, o Brasil tenha um dos cinco supercomputadores mais potentes do mundo. Para isso, vai investir 1,8 bilhão na atualização de um supercomputador do Laboratório Nacional de Computação Científica – LNCC, o Santos Dumont.
Construído com a participação de 300 especialistas de vários segmentos, representando 117 instituições de governo, privadas e da sociedade civil, o PBIA também prevê ações em três tempos: imediatas, de médio e longo prazos. Como muitas delas são transversais, sua implementação vai demandar grupos de trabalho intersetoriais.
Sem dúvida nenhuma, o lançamento do PBIA e os resultados da 5ª Conferência representam um salto de qualidade no desenho de um projeto de desenvolvimento do país. E estão dadas as condições para se articular todos os programas estruturantes e suas ações, com o apoio da sociedade.