A questão Damares e comunidade Kamayurá do alto Xingu me parece um equívoco cultural, isso é, um conflito entre vozes de distintas tradições culturais. A gente tem que continuar disputando aqui do lado de fora pela autonomia dos direitos indígenas e, nesse caso especificamente, pelos direitos sexuais e reprodutivos de todas as mulheres do território brasileiro e latino-americano. Porque no episódio Damares (que envolve uma moral cristão evangélica colonizadora) os debates têm um profundo parentesco.
As mulheres Kamayurá cometem neonaticídio quando não existem condições sustentáveis para a criação de um filho em seu entorno – isso pode ter relação com doenças congênitas da criança, miséria da comunidade ou outras modalidades míticas que NÃO NOS CABEM JULGAR.
Damares se arroga salvadora de crianças indígenas e atravessa um processo tradicional de autorreferência e desenvolvimento demográfico, humano, coletivo, para impor sua fé e suas formas de controle das culturas subalternizadas, que julga pagãs porque fogem aos ritos eurocêntricos.
Quantas mulheres do lado de cá, no nosso terreno ocidentalizado, pobres, periféricas, não sofrem os mesmos dilemas que as Kamayurá (minha comparação aqui não é individual é social… Até porque alguns conceitos de indivíduo não cabem para alguns segmentos populacionais indígenas)?
Diante da percepção de que não podem criar seus filhos recorrem a técnicas inseguras e clandestinas de aborto.
O que quero dizer é que o que precisamos lutar do lado de cá, se a gente tá do lado dos povos que diz estar, é pela preservação do poder de autonomia dos indígenas em relação à terra e ao seu rito comportamental histórico.
Bem como precisamos continuar disputando o direito das mulheres ao aborto legal e seguro. O olhar de Damares e suas asseclas sobre o direito ao aborto é muito semelhante àquele que criminaliza o neonaticídio praticado por alguns povos indígenas.
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O olhar de Damares e suas asseclas sobre o direito ao aborto é muito semelhante àquele que criminaliza o neonaticídio praticado por alguns p