A tropa de choque da polícia da Assembleia Legislativa de São Paulo mais uma vez estampou as capas de jornal por espancar e prender manifestantes dentro da casa do povo. Dessa vez, seis estudantes foram presos, dentre eles menores de idade que protestavam contra a aprovação de um projeto para militarizar as escolas públicas do Estado.
O projeto que foi sancionado imediatamente pelo governador Tarcísio de Freitas é uma de suas prioridades e a Secretaria Estadual de Educação publicou na última semana de junho a listagem com centenas de escolas que estariam aptas para aderir ao programa, com a intenção de implementá-lo ainda em 2024.
O fascista no Palácio dos Bandeirantes não se satisfaz em colocar o esquadrão da morte da Polícia Militar para assassinar jovens trabalhadores à luz do dia nas periferias de São Paulo; quer agora os fardados nas salas de aula da escola pública para humilhar nossos jovens.
Projeto bolsonarista é herança da ditadura
No Brasil, existem aproximadamente 500 escolas cívico-militares ou militarizadas. Na época em que foi presidente do país, Bolsonaro criou o Programa Nacional de Escolas Cívico-militares (Pecim) para dar incentivo federal à implementação desse modelo nas unidades públicas de ensino, completamente inspirado pela política autoritária e repressora dos agentes da ditadura militar de 1964. Quando eleito, Lula encerrou o Pecim enfrentando resistência de Estados e municípios governados pela direita: prefeitos e governadores informaram ao Ministério da Educação que dariam continuidade ao modelo a partir de programas próprios.
Em São Paulo, o modelo de escola cívico-militar aprovado debaixo de borrachadas foi considerado inconstitucional pela Advocacia-Geral da União (AGU). Ainda em abril deste ano, a mesma também enviou ao Superior Tribunal Federal um parecer semelhante após analisar o modelo de Ratinho Jr (PSD) no Paraná. Para o órgão, “a alocação de militares da reserva para a execução de atividades relacionadas à educação básica fora do sistema de ensino militar formal, ainda que na condição de apoio ou monitoramento, não encontra respaldo nas normas fundamentais do sistema educacional brasileiro, nem previsão compatível com a finalidade constitucional dessas instituições”.
Não surpreende o fato de que o projeto consiste em alocar militares da reserva para “salvar” escolas com alto índice de vulnerabilidade e de baixo rendimento de aprendizagem. Vale destacar ainda que esses senhores custarão 7,2 milhões de reais por ano aos cofres públicos! É claro que abrir um novo concurso para contratar mais professores e investir na infraestrutura e merenda das escolas está fora de cogitação para Tarcísio. Pelo contrário: esse mesmo governo tentou cortar 9 bilhões de reais da pasta da Educação este ano.
Agentes da guerra dentro das escolas
O governo de São Paulo diz que as escolas cívico-militares servem para o “enfrentamento à violência e a promoção da cultura de paz no ambiente escolar”. Parece piada: a máquina da guerra contra os pobres promovendo paz nas escolas!
A própria história de abusos de todas as forças militares no Brasil seria suficiente para rebater essa afirmação. Mas as experiências recentes em escolas militarizadas no Paraná, Goiás e Amazonas falam por si só.
Em 2020, o ANDES-SN publicou o volume III da “Cartilha de Projeto do Capital para a Educação” que aborda, dentre vários temas urgentes, o processo de militarização da educação pública. Reproduzimos na íntegra dois relatos de violações contra estudantes e professores encontrados no documento que são fundamentais para entender a gravidade da situação.
“1 – Em 18 de outubro de 2019, no Colégio Militar de Goiás João Augusto Perillo, 40 alunos foram conduzidos ao banheiro e submetidos a revista íntima: observados por um policial, tiraram as roupas e fizeram agachamento 5 vezes. O procedimento foi realizado sem consentimento dos pais e Conselho Tutelar.
2 – Em 27 de agosto de 2019, o professor Anderson Pimenta Rodrigues no Colégio da Polícia Militar 1 de Manaus, se recusou a assinar um livro de ocorrências e foi agredido fisicamente por um tenente-coronel. Depois, foi conduzido por três policiais militares para uma sala onde teve uma arma apontada para sua cabeça submetido a diferentes modalidades de tortura psicológica. Destaque para o fato de que desde de 2014 o Ministério Público acumula mais de 120 denúncias de abuso moral e sexual nas 16 unidades militarizadas existentes. E a apuração caminha lentamente, pois é emperrada pelo corporativismo da PM.”
O fascismo é feroz, porém precário
A verdade é que um povo submetido a tanta miséria e exploração, uma hora ou outra, se revolta; e a militarização das escolas tem o objetivo de aumentar o controle e a repressão sobre estudantes, professores e famílias dos bairros periféricos. Como sintetiza o editorial de A Verdade, ao analisar o vertiginoso aumento da violência policial: “Ao jogar o povo no abismo, a única forma de a classe dominante manter o poder é fortalecer o aparelho repressivo e aumentar os destacamentos armados.” Numa frase, essa política faz parte do pacote para a formação de um Estado policial e fascista no Brasil.
O que os poderosos esquecem é que, na tentativa de controlar e reprimir, na verdade, aguçam a revolta e o ódio, escancaram as contradições entre as classes, gestam a ebulição social. Vale lembrar que nenhuma polícia no Estado de São Paulo impediu as ocupações de escolas em 2015. Vamos ver quem é mais forte.
(*) Isis Mustafa é dirigente do partido Unidade Popular pelo Socialismo e 1ª vice-presidente da UNE.