Imagine um lugar onde o samba ecoa em terras africanas, no qual a feijoada é um prato comum e o português ainda é falado, embora com um sotaque peculiar. Essa é a fascinante história dos retornados: brasileiros que, após a abolição da escravidão, buscaram suas raízes no continente africano.
“Os Retornados”, de Carlos Fonseca, nos convida a embarcar em uma jornada emocionante e reveladora por essas comunidades que preservam, com orgulho, um pedacinho do Brasil em terras distantes. Através de relatos emocionantes, fotos impactantes e uma pesquisa meticulosa, o autor nos apresenta um mosaico cultural riquíssimo, onde as tradições africanas se entrelaçam com a herança brasileira.
Com prefácio de Laurentino Gomes, o livro é essencial para quem se interessa pela diáspora africana e pelas complexas relações entre identidade, história e memória. O livro traz um relato histórico e jornalístico, acompanhado por registros captados pelo autor, que também é fotojornalista.
“Ao reconstruir a trajetória dos brasileiros retornados à África, Carlos Fonseca criou uma obra de beleza e profundidade ímpares. Este é ao mesmo tempo um documentário, um registro histórico e uma reportagem detalhada, fruto de mais de vinte anos de viagens, entrevistas e pesquisa junto aos personagens desta história (…) É uma narrativa fascinante, escrita com maestria, que prende e encanta os leitores da primeira à última linha”, escreve Laurentino Gomes, autor de 1808 e 1822, importantes relatos históricos e jornalísticos de diferentes momentos importantes da história do Brasil.
“Os Retornados ajuda a entender melhor o Brasil em sua face mais violenta — o passado escravista — e em seu lado mais belo: o desejo de liberdade, seja deste lado do oceano ou do outro”, comenta Kauê Lopes dos Santos, professor doutor da Unicamp e autor de Africano: uma introdução ao continente.
O livro explora a história dos afro-brasileiros que, no século XIX, retornaram ao continente africano, especialmente ex-escravizados e seus descendentes nascidos no Brasil. Nessa “volta” à África, eles carregavam traços culturais do Brasil: o idioma (como a expressão “tabom” em Gana, derivada do português “está bom”), a culinária, as festividades populares e até elementos arquitetônicos.
Hoje, os descendentes desses retornados vivem no Benim, Nigéria, Togo e Gana, sendo conhecidos como agudás, tabons ou “brasileiros”. Carlos Fonseca retrata, com contexto histórico profundo, a condição dessas comunidades que ainda mantêm um vínculo cultural com o Brasil e a urgência de preservar essa identidade afro-brasileira, que se desvanesce com o tempo.
Esse vínculo é pouco conhecido no Brasil, talvez por envolver a história trágica da escravidão. Fonseca questiona quanto tempo ainda pode durar essa identidade híbrida e distante de suas raízes. Para ele, um país não deve perder sua memória, e a saga dos retornados é uma crônica do amor não correspondido entre uma comunidade e o país que deixou para trás. Esse grupo criou um “pequeno Brasil” longe de casa, mas profundamente marcado pela cultura brasileira.
Sobre o projeto e o autor
O livro surgiu de uma pesquisa realizada entre 1999 e 2004, como parte do projeto “Cartas d’África”, que incluía entrevistas e fotos de famílias descendentes de retornados em Salvador, Lagos, Porto-Novo, Uidá, Cotonu, Aguê, Lomé e Acra. Essas famílias enviaram mensagens aos seus “parentes” no Brasil, algumas reais, outras simbólicas. As entrevistas e fotos fizeram parte de exposições no Brasil e em 12 países africanos.
Carlos Fonseca é diplomata brasileiro formado em História, com mestrado em Políticas Públicas pela Harvard Kennedy School. Atuou como fotojornalista e publicou obras como Cartas d’África, Bordemar e Brazilian Rhythms, World Drums, este último resultado de uma pesquisa sobre a difusão do samba e do samba reggae pelo mundo.
Ao longo de suas viagens pela África, Carlos Fonseca testemunhou a luta dessas comunidades para manter viva sua identidade, marcada pela mistura de culturas e pela busca por suas origens. No entanto, o tempo e a globalização ameaçam diluir essa herança única.
“Os Retornados” é mais do que um livro, é um chamado à ação. Ao conhecer essa história, somos convidados a refletir sobre nosso papel na preservação da memória e na construção de um futuro mais justo e equânime para todos.