Há 12 anos, em 5 de dezembro de 2012, o Brasil se despedia de Oscar Niemeyer. Expoente da arquitetura moderna internacional, Niemeyer se destacou por seu estilo original, marcado pela inovação no uso do concreto armado.
Audaciosas e esculturais, suas obras aliavam recursos estruturais avançados à simplicidade estética e à valorização da pureza da forma.
Niemeyer se destacou por sua colaborou na construção de Brasília e produziu inúmeros monumentos e marcos urbanos espalhados pelo Brasil. Além de seu legado como arquiteto, ele também foi um valoroso militante da causa socialista e demonstrou desde cedo grande preocupação com problemas sociais.
Vida e primeiros trabalhos de Niemeyer
Nascido no Rio de Janeiro em 15 de dezembro 1907, Niemeyer se formou como engenheiro-arquiteto pela Escola Nacional de Belas Artes em 1934 e ingressou no escritório de Lúcio Costa, onde integrou a equipe encarregada de desenvolver o projeto de Le Corbusier para o Ministério da Educação e Saúde (atual Palácio da Cultura), ao lado de Carlos Leão, Affonso Eduardo Reidy, Jorge Machado Moreira e Ernâni Vasconcelos.
Niemeyer assimilou diversas características da estética de Le Corbusier, como a ênfase na funcionalidade, a priorização da planta livre e o uso de pilotis e desenvolveu desde cedo um estilo único, integrado às referências da cultura nacional.
Em 1937, projetou a Obra do Berço, seu primeiro projeto autoral. Dois anos depois, realizou seu primeiro trabalho internacional, dividindo com Lúcio Costa o desenho do pavilhão brasileiro da Feira Internacional de Nova York — obra premiada com a Medalha Cidade de Nova York.
A convite de Juscelino Kubitschek, então prefeito de Belo Horizonte, seis anos depois, em 1943, Niemeyer elaborou o projeto do Conjunto da Pampulha.
O conjunto arquitetônico (cassino, clube, salão de dança e igreja) se destacou pela liberdade inventiva, exibindo já as características estéticas que acompanhariam a obra do arquiteto até o fim da vida.
Niemeyer e a luta socialista
Inspirado pela vitória da União Soviética sobre a Alemanha nazista, Niemeyer se filiou ao Partido Comunista Brasileiro (PCB) em 1945 e travou amizade com o revolucionário Luís Carlos Prestes.
Sua aproximação com o PCB, entretanto, já havia se iniciado uma década antes, quando o arquiteto se tornou colaborador do Socorro Vermelho, organização de serviço social ligada à Internacional Comunista. Julgando que as atividades políticas eram mais importantes que seu ofício de arquiteto, ofereceu seu escritório para o PCB, que o converteu na sede de seu Comitê Metropolitano.
A partir de 1947, Niemeyer integrou a equipe de arquitetos responsáveis por projetar a sede da ONU em Nova York, inaugurada em 1952.
A colaboração lhe granjeou destaque e convites para realizar trabalhos no exterior: na Venezuela, elaborou projeto para o Museu de Arte Moderna de Caracas; na Alemanha, participou do programa de reconstrução de Berlim, desenhando um conjunto de edifícios para o bairro Hansa. Aproveitou a ocasião para visitar as nações socialistas do Leste Europeu, conhecendo a Polônia, Checoslováquia e União Soviética.
Construção de Brasília
No Brasil, Niemeyer explorou o uso do concreto em superfícies curvas (projeto da Fábrica da Duchen, São Paulo) e buscou adaptar os programas utilitários à expressão plástica funcional em uma série de trabalhos (Banco Boavista e Casa das Canoas no Rio de Janeiro; Instituto Tecnológico da Aeronáutica em São José dos Campos; Edifício Copan em São Paulo; Aeroporto de Diamantina, etc.).
Também projetou os pavilhões da exposição do IV Centenário da capital paulista, erguidos no Parque do Ibirapuera.
Em 1956, durante o governo Kubitschek, Niemeyer é nomeado para a direção do departamento de arquitetura da Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap). A empresa foi encarregada da construção de Brasília.
Em conjunto com Lúcio Costa, elaborou um dos mais relevantes exemplares da arquitetura contemporânea mundial, projetando a maioria dos edifícios cívicos da nova capital do país: Palácio da Alvorada, Palácio do Planalto, Palácio da Justiça, Palácio do Itamaraty, Esplanada dos Ministérios, Catedral de Brasília, Universidade de Brasília, Teatro Nacional, etc.
Brasília foi inaugurada em 21 de abril de 1961 e impulsionou a carreira internacional de Niemeyer.
Em 1962, o arquiteto fez diversos projetos no Líbano, tais como a Feira Internacional e Permanente de Trípoli e o Conjunto Esportivo de Beirute. No ano seguinte, foi agraciado pelo comitê soviético com o Prêmio Lenin da Paz e nomeado membro honorário do Instituto Americano de Arquitetos de Nova York.
Dois anos depois, em 1964, projetou em Israel o plano urbanístico de Negev, os conjuntos Nordia e Panorama e a Universidade de Haifa. No mesmo ano, desenhou a Universidade de Acra, em Gana.
O trabalho de Niemeyer durante a ditadura
Após o golpe militar de 1964 e a instauração do regime de exceção, a circulação da revista Módulo, fundada por Niemeyer em 1955, foi suspensa. No ano seguinte, em protesto contra a nova política universitária imposta pela ditadura, o arquiteto se demitiu da Universidade de Brasília e partiu para a França, a fim de participar de uma exposição individual em sua homenagem no Pavilhão de Artes Decorativas do Palácio do Louvre.
Ainda na França, projetou o plano urbanístico da cidade de Grasse e desenhou o Centro Cultural de Saint-Baume. Viajou em seguida para o Gabão, onde fez o projeto do Palácio de Libreville, e Portugal, elaborando o plano urbanístico de Algarve e desenhos para um hotel e um cassino na Ilha da Madeira.
Em 1967, em retaliação às críticas de Niemeyer ao regime militar, o governo Costa e Silva cassou seu registro profissional, impedindo-o de atuar no Brasil. O arquiteto se exilou então na França, onde obteve autorização para trabalhar regularmente.
Projetou o Centro Cultural de Le Havre, a Bolsa de Trabalho de Bobigny e a sede do Partido Comunista Francês (PCF), organização em que passou a militar, e iniciou sua produção no campo do mobiliário.
Na Itália, desenhou a sede da Editora Mondadori, em Milão, antes. Partiu em seguida para a Argélia e elaborou uma série de projetos a pedido do governo revolucionário (plano urbanístico de Argel, Universidades de Argel e Constantine, Mesquita de Argel).
Com o processo gradual de distensão do regime militar operado a partir do governo Geisel, Niemeyer voltou a publicar a revista Módulo. Em 1978, o arquiteto liderou a criação do Centro Brasil Democrático (Cebrade), agremiação de intelectuais e políticos de oposição ao regime militar que atuaria em prol da redemocratização e da reorganização dos movimentos sociais e operários.
Em 1979, foi condecorado com o título de Oficial da Ordem da Legião de Honra da França e homenageado por uma exposição itinerante sobre sua obra.
Niemeyer retornou ao Brasil após a promulgação da Lei da Anistia, imediatamente retomando seus projetos arquitetônicos.
Em Brasília, desenhou o Memorial JK (1980), Memorial dos Povos Indígenas (1982) e Panteão da Pátria (1985) e, no Rio de Janeiro, o Edifício Manchete (1983) e o Sambódromo (1984).
Após a eleição de Leonel Brizola para o governo do Rio de Janeiro, colaborou com Darcy Ribeiro no projeto dos Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs) — centros educacionais de período integral que ofertavam atividades recreativas e complementares.
Após a redemocratização, Niemeyer intensificou sua atuação profissional no país e recebeu do governo brasileiro a condecoração de Grande Oficial da Ordem do Rio Branco. Em 1988, foi laureado com o Pritzker, o principal prêmio internacional de arquitetura.
No ano seguinte, recebeu o Prêmio Príncipe de Astúrias. Ainda 1989, testemunhou em São Paulo a inauguração do Memorial da América Latina, um de seus projetos mais relevantes.
Fora do PCB
Em 1990, manifestando seu desacordo com a tendência liquidacionista expressa pela cúpula do PCB, Niemeyer desligou-se do partido. Dois anos depois, entretanto, assumiu o cargo de presidente de honra do PCB, após o processo de restauração da legenda, resultante da cisão dos quadros que renunciaram à conversão da agremiação em Partido Popular Socialista (PPS, atual Cidadania).
Ainda nos anos 90, projetou o Caminho Niemeyer e o Museu de Arte Contemporânea em Niterói (MAC). Também desenhou o Monumento Eldorado dos Carajás, em memória às vítimas do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) assassinadas em uma chacina no Pará, e o Memorial 9 de Novembro, em homenagem aos operários da CSN assassinados durante a greve de 1988.
Em 2002, foi inaugurado em Curitiba o Museu Oscar Niemeyer e iniciou-se em São Paulo a construção do Auditório do Ibirapuera, idealizado por por ele ainda em 1952. No ano seguinte, o arquiteto projetou o anexo da Serpentine Gallery, seu primeiro edifício no Reino Unido, e, em 2004, desenhou o Monumento à Paz na cidade de Paris.
Projetou, em 2006, o Centro Cultural Principado de Astúrias na Espanha e o Memorial Leonel Brizola no Rio de Janeiro. Completou seu centenário em 2007, ocasião em que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) anunciou o tombamento de 35 de suas obras.
Nesse mesmo ano, foi condecorado por Lula com a Medalha Ordem do Mérito Cultural.
Em seus últimos anos de vida, Niemeyer receberia diversas outras condecorações e honrarias, além de ter sido escolhido presidente de honra do Centro de Educação Popular e Pesquisas Econômicas e Sociais (CEPPES), organização fundada por Luís Carlos Prestes.
Niemeyer presenteou o mandatário cubano Fidel Castro com uma escultura de um homem com a bandeira cubana confrontando uma figura monstruosa — uma referência à resistência de Cuba contra as agressões imperialistas dos Estados Unidos.
Entre seus últimos projetos estão a Cidade Administrativa de Minas Gerais, em Belo Horizonte, e o Teatro Puerto de la Música em Rosário, Argentina. Faleceu no Rio de Janeiro em 5 de dezembro de 2012, aos 104 anos de idade, deixando um legado de mais de 600 projetos espalhados por quatro continentes.