Há 55 anos, em 2 de setembro de 1969, falecia o revolucionário vietnamita Ho Chi Minh. Fundador do Partido Comunista do Vietnã e do Viet Minh, Ho Chi Minh liderou a luta anticolonial contra a França e o Japão, fundou a República Democrática do Vietnã e organizou a bem sucedida resistência vietnamita contra a invasão norte-americana durante a Guerra do Vietnã.
Ho Chi Minh (em vietnamita, “Aquele Que Ilumina”) é o nome pelo qual Nguyen Sinh Cung se tornaria conhecido mundialmente. Ele nasceu em 19 de maio de 1890, em um pequeno vilarejo da província de Nghe An, durante o domínio colonial francês sobre o Vietnã (então parte da Indochina). Ho Chi Minh aprendeu a ler com seu pai, que o introduziu às tradições confucionistas. Após concluir o ensino básico em uma escola de Hue, iniciou sua militância em grupos nacionalistas. Em 1911, partiu para a França, onde conseguiu um emprego como cozinheiro do navio “Amiral de Latouche-Tréville”, que viajava pelo mundo inteiro.
Em uma dessas viagens, Ho Chi Minh, muito doente, foi abandonado para morrer no porto do Rio de Janeiro, mas conseguiu se recuperar, passando a trabalhar como garçom em um bar da Lapa. Posteriormente, no porto de Santos, travou contato com o cozinheiro José Leandro da Silva, um líder sindical negro cuja história Ho Chi Minh descreveria em um artigo publicado anos mais tarde, intitulado “Solidariedade Internacional”.
Viajou posteriormente para os Estados Unidos, fixando-se em Boston, onde travou amizade com nacionalistas coreanos e testemunhou o regime de segregação racial e a violência dos grupos supremacistas brancos — tema de um futuro artigo publicado na Correspondance Internationale. Depois, zarpou para a Inglaterra, onde trabalhou lavando pratos.
Em 1917, Ho Chi Minh retornou para a França, fixando residência em Paris, onde se aproximou do movimento socialista, tornando-se amigo de Jean Longuet, neto de Karl Marx. Em 1919, no contexto do Tratado de Versalhes, subscreveu a petição intitulada “Demandas do Povo Anamita”, dirigida aos presidentes da França e dos Estados Unidos, respectivamente Georges Clemenceu e Woodrow Wilson — sendo, porém, ignorado.
Sob a influência das teses de Lenin, que recomendara rechaçar a colaboração de classe e os movimentos de caráter liberal, Ho Chi Minh afastou-se dos socialistas franceses e de Longuet, contrários à adesão do Partido Socialista francês à Terceira Internacional (Comintern, articulação comunista internacional criada por Lenin e pelos bolcheviques). Aproximou-se então do Partido Comunista da França, voltando sua atenção também para a Rússia revolucionária, à época o epicentro do movimento comunista internacional.
Em 1923, Ho Chi Minh mudou-se para Moscou, onde estudou táticas de guerrilha e entrou para o Comintern. Dois anos depois, foi enviado para Cantão, na China, onde fundou a Liga da Juventude Revolucionária Vietnamita e passou a ministrar cursos sobre marxismo e atuação revolucionária para jovens, lançando as sementes do futuro movimento revolucionário do Vietnã.
Após o golpe e o expurgo anticomunista liderado por Chiang Kai-Shek na China em 1927, Ho Chi Minh voltou para Moscou. Atuando como agente sênior do Comintern, passou por Tailândia, Índia e Xangai. Em 1930, presidiu em Hong Kong a “Conferência da Unificação”, onde a Liga da Juventude Revolucionária se fundiria a outras duas agremiações para dar origem ao Partido Comunista do Vietnã. O partido começou a organizar os camponeses em conselhos autogeridos e logo se converteu em uma organização de massas, apta a mobilizar multidões. Os franceses reagiram com uma violenta onda repressiva, buscando desarticular a organização.
Em 1931, Ho Chi Minh foi preso pelas autoridades britânicas em Hong Kong. Libertado, retornou para a União Soviética, onde passou a lecionar no Instituto Lenin. Em 1938, foi para a China, assumindo a função de conselheiro do Exército de Libertação Popular.
Após a eclosão da Segunda Guerra Mundial e a derrota da França pelas potências do Eixo, o Japão deslegitimou a reivindicação de soberania francesa sobre a Indochina e enviou tropas para ocupar o Vietnã. A exemplo dos franceses, os japoneses também reprimiram severamente o Partido Comunista, executando mais de 2.000 membros da agremiação, incluindo quase toda sua cúpula.
Ho Chi Minh retornou ao Vietnã em 1941, ajudando a reorganizar o Partido Comunista ao lado de Vo Nguyen Giap, Truong Chinh e Pham Van Dong. Nesse mesmo ano, fundou o Viet Minh, movimento revolucionário de libertação nacional que lutava simultaneamente contra o domínio francês e contra a ocupação japonesa.
Comandando uma força guerrilheira com 10.000 combatentes, Ho Chi Minh supervisionou uma série de ações militares bem sucedidas, antes de ser preso pelas tropas de Chiang Kai-Shek. Libertado em 1943, retornou ao Vietnã e seguiu comandando os esforços contra os invasores.
Em 1945, Ho Chi Minh liderou a Revolução de Agosto, que, em apenas duas semanas, expulsou os militares japoneses e franceses da maior parte do território vietnamita, forçando em seguida o imperador Bao Dai a abdicar do trono. Com apoio do Viet Minh, Ho Chi Minh proclamou a independência, fundou a República Democrática do Vietnã e assumiu a presidência do governo provisório. A comunidade internacional, entretanto, não reconheceu a declaração de independência do país asiático.
Por ordem de Chiang Kai-Shek, o exército chinês tentou intervir na disputa, impondo ao Vietnã a dissolução de seu Partido Comunista e a instalação de um governo de coalizão subordinado aos interesses de Pequim, além de demandar da França a devolução das concessões francesas em Xangai.
Sem alternativa, Ho Chi Minh aceitou a incorporação do Vietnã como território autônomo da Federação da Indochina e da União Francesa. Não obstante, tão logo as tropas chinesas se retiraram, o conflito entre vietnamitas e franceses recomeçou. Ho Chi Minh buscou apoio das classes populares na luta contra o domínio francês, prometendo a coletivização das indústrias e a concessão de terras aos camponeses.
Em dezembro de 1946, após um intenso bombardeio francês em Haifom, teve início a Guerra da Indochina. O triunfo dos comunistas na Revolução Chinesa em 1949 ajudou a mudar a correlação de forças. Em 1950, Ho Chi Minh encontrou-se com Josef Stalin e Mao Tsé-Tung, obtendo o reconhecimento e apoio militar da União Soviética e da China. A guerra se estendeu por mais quatro anos, chegando ao fim após a batalha de Dien Bien Phu, quando 10.000 soldados franceses se renderam aos guerrilheiros do Viet Minh.
Em 1954, os Acordos de Genebra dividiram o Vietnã ao meio, ao longo do Paralelo 17, permitindo que o Viet Minh mantivesse o controle dos territórios ao norte e que os grupos anticomunistas se instalassem ao sul. Surgem então o Vietnã do Norte, sob um sistema socialista, apoiado pela União Soviética e pela China, e o Vietnã do Sul, aliado dos Estados Unidos e das potências capitalistas ocidentais.
Nos anos seguintes, o governo de Ho Chi Minh conduziria uma série de transformações sociais, nacionalizando indústrias, instituindo a reforma agrária e universalizando o direito à moradia, educação e saúde. As relações diplomáticas com o regime sul-vietnamita, sob a liderança autoritária e repressiva do ditador Ngo Dinh Diem, permaneceram extremamente conturbadas. Em 1955, as tentativas dos dois países de unificarem a nação sob o seu próprio sistema político e econômico deu início à Guerra do Vietnã.
Temendo que o país fosse unificado sob o comando do governo socialista de Ho Chi Minh, os Estados Unidos decidiram intervir diretamente na região, mandando centenas de milhares de soldados para apoiar Vietnã do Sul. Apesar da superioridade bélica, das tropas mais numerosas e da capacidade infinitamente maior de mobilizar recursos dos norte-americanos, Ho Chi Minh conseguiu coordenar uma resistência heroica. Bom conhecedor de Carl von Clausewitz, o “pai da guerra moderna”, Ho Chi Minh inspirou-se no conceito de unificar a nação como um “corpo organicamente unido”, mobilizando todos os habitantes e recursos para a participação na guerra.
Adotando a tática de guerrilha não convencional, aliada ao conhecimento do território, os norte-vietnamitas conseguiram neutralizar a vantagem material dos Estados Unidos. Entre 1961 e 1963, 40.000 vietcongues se infiltraram no Vietnã do Sul, ampliando a guerrilha e iniciando ações de sabotagem e enfrentamento direto em território inimigo. Ho Chi Minh ainda coordenaria a Ofensiva do Tet, desferindo um duro golpe sobre a narrativa do governo norte-americano de que o Vietnã do Norte estaria “nas cordas”.
Vitimado por um infarto, Ho Chi Minh faleceu em 2 de setembro de 1969, sem ver o fim da Guerra do Vietnã e a reunificação do país. Sua estratégia, entretanto, provou-se vitoriosa. Em novembro de 1975, sem conseguir atingir nenhum de seus objetivos, os Estados Unidos abdicavam da guerra, assinando o armistício. Finalmente reunificado sob o governo popular, o Vietnã entraria para a história como o país que impôs à maior potência do mundo uma derrota militar sem precedentes.