60 anos do assassinato de Malcolm X, líder revolucionário da luta antirracista
Morto aos 39 anos, ele segue como uma das maiores inspirações dos que lutam pela autodeterminação do povo negro
Há 60 anos, em 21 de fevereiro de 1965, Malcolm X era assassinado nos Estados Unidos. Expoente do movimento do Nacionalismo Negro, ele foi um dos principais líderes da luta contra o racismo e em prol dos direitos dos afro-americanos.
Sua simpatia pelo socialismo, sua postura anticapitalista e sua retórica incisiva e desafiadora, exortando o povo negro a combater seus opressores, renderam a Malcolm X a forte oposição das autoridades governamentais.
Morto aos 39 anos, ele segue como uma das maiores inspirações dos indivíduos e organizações que lutam pela autodeterminação do povo negro.
Da infância à prisão
Malcolm Little nasceu em Omaha, Nebraska, em 19 de maio de 1925, como um dos quatros filhos do casal Earl e Louise Little. Seu pai era um militante ativo da Associação Universal para o Progresso dos Negros (UNIA, no acrônimo em inglês), motivo pelo qual a família era constantemente assediada por organizações supremacistas, nomeadamente a Ku Klux Klan.
Em 1929, grupos racistas chegaram a incendiar a casa da família Little, sem que os bombeiros interviessem para apagar o incêndio. A família teve de se mudar várias vezes para escapar de ameaças.
O pai de Malcolm foi assassinado por grupos racistas de Lansing, Michigan, em 1931, deixando a família em situação financeira delicada e extremamente abalada psicologicamente. Earl tinha um seguro de vida, mas a seguradora se recusou a pagar o valor previsto na apólice, alegando que ele havia cometido suicídio. Louise jamais se recuperou do choque da morte de marido, permanecendo internada em uma clínica psiquiátrica por 26 anos.
Malcolm e os irmãos passaram a viver em um orfanato de Lansing. Na escola do orfanato, ele se destacou entre os melhores alunos, mas perdeu interesse nos estudos após uma experiência frustrante com um professor. Após ouvir o jovem lhe dizer que pretendia ser um advogado no futuro, o docente retrucou advertindo-o que, em função da cor da sua pele, poderia no máximo ansiar em se tornar carpinteiro.
Malcolm deixou o orfanato e foi morar com sua irmã, Ella, em Boston. Passou a trabalhar como engraxate e à noite frequentava os bairros boêmios, consumindo drogas e bebidas alcóolicas. Mudou-se em seguida para Nova York, onde envolveu-se com gangues e começou a praticar furtos e assaltos até ser capturado pela polícia.
Em 1946, foi sentenciado a dez anos de prisão em Norfolk, Massachusetts.
Nação do Islã
Na cadeia, Malcolm passou a ser visitado pelo irmão, Reginald Little, que lhe apresentou a Nação do Islã — organização religiosa liderada por Elijah Muhammad que lutava pela auto-gestão e pelos direitos civis dos afro-americanos.
Malcolm se converteu ao islamismo em 1953 e ingressou na Nação do Islã. Abandonou o seu sobrenome de batismo, considerando-o como uma herança da escravidão, e adotou a denominação Malcolm X.
Após sair da prisão, Malcolm X tornou-se um dos mais ativos líderes políticos da Nação do Islã. Assumiu a gestão do templo da organização no Harlem e se tornou um dos maiores nomes do movimento do Nacionalismo Negro
Malcolm X também passou a atuar como jornalista, escrevendo textos defendendo a emancipação da sociedade afro-americana e conclamando o povo negro à organização política.
Em 1959, após ser registrado em um documentário sobre os movimentos nacionalistas negros, Malcolm X ganhou projeção nacional. Seus discursos tornaram-se mais e mais inflamados, exortando os negros a usarem “todos os meios necessários” para sua autodefesa e resistência — incluindo o uso da violência.
Malcolm X também passaria a criticar de forma incisiva o sistema capitalista, defendendo a ideia de que o socialismo era mais benéfico à causa negra.
Em uma entrevista datada de 1965, definiu o capitalismo como um regime parasitário: “não como atuar sob a lógica de um regime capitalista, a menos que se seja um abutre. É necessário sugar o sangue de alguém para ser capitalista. Mostre-me um capitalista e eu lhe mostrarei um sanguessuga”.

Malcolm X fotografado por Herman Hiller em 1964
Os discursos incisivos de Malcolm X começaram a incomodar as autoridades norte-americanas, temerosas de que os afro-americanos se organizassem em movimentos de massa e acatassem o argumento da legitimidade da violência revolucionária como instrumento para a conquista dos direitos civis.
A presença de Malcolm X em comícios do Partido Socialista dos Trabalhadores alarmou anda mais o governo dos Estados Unidos, que incumbiu o FBI de monitorá-lo permanentemente.
A oratória excepcional e retórica inflamada de Malcolm X foram fundamentais para a expansão da Nação do Islã e do ideário do Nacionalismo Negro. A defesa da legitimidade da violência revolucionária, entretanto, desagradaria algumas importantes lideranças do movimento, nomeadamente o pastor batista Martin Luther King Jr.
A fragmentação do movimento negro se acentuaria nos anos 60, quando Malcolm X fez duras declarações denunciando os crimes do imperialismo norte-americano, por ocasião do assassinato do presidente John Kennedy.
Malcolm X também se desentendeu com as lideranças da Nação do Islã, que passaram a se incomodar com sua crescente popularidade. Desapontado após ser informado sobre as acusações de crimes sexuais envolvendo Elijah Muhammad, o revolucionário abandonou a Nação do Islã em 1964. Ele fundaria então sua própria organização — a Associação da Mesquita Muçulmana.
Os últimos anos
Sob o comando de Malcolm X, a Associação da Mesquita Muçulmana cresceu rapidamente, atraindo vários membros da Nação do Islã. Nesse mesmo ano, ele iniciou uma jornada religiosa de peregrinação rumo à cidade sagrada de Meca, na Arábia Saudita. Por ocasião da viagem, adotou um novo nome: Al Hajj Malik Al-Shabazz.
Após retornar para os Estados Unidos, Malcolm X fundou uma instituição secular — a Organização da Unidade Afro-Americana, dedicada à defesa dos direitos civis de toda a população negra, independentemente de filiação religiosa. Objetivando expandir o alcance de sua organização, Malcolm X atenuou a sua retórica, visando unificar o movimento negro.
Não houve, entretanto, tempo hábil para que ele seguisse com a ideia. No dia 21 de fevereiro de 1965, enquanto proferia uma palestra no bairro do Harlem, em Nova York, Malcolm X foi assassinado com mais de dez tiros.
As autoridades apontaram que o atentado foi organizado por desafetos ligados à Nação do Islã. Três membros da organização foram condenados e presos pelo assassinato — Talmadge Hayer, Norman Muhammad Abdul Aziz e Khalil Islam.
Talmadge Hayer confessou sua participação no crime, mas os outros dois acusados sempre alegaram inocência. Em 2021, as condenações de Norman Aziz e Khalil Islam foram anuladas pela Justiça norte-americana, após a descoberta de que o FBI havia ocultado provas e evidências.
As dúvidas e inconsistências sobre a morte de Malcolm X persistem até hoje e muitas lideranças do movimento negro sustentam que ele foi vítima de um assassinato político orquestrado pelo governo dos Estados Unidos. Há ainda teses que apontam para o possível envolvimento de Louis Farrakhan, um dos líderes da Nação do Islã, na conspiração.
Malcolm X permanece até hoje como um dos maiores ícones do movimento negro. Sua luta por justiça racial sedimentou parte substancial das iniciativas em prol da organização política dos afro-americanos.
Ele inspirou quase todas as organizações políticas e sociais afro-americanas surgidas a partir da segunda metade do século 20, incluindo o movimento Black Power, o movimento das Artes Negras e o Partidos dos Panteras Negras.
