Há 69 anos, em 1º de novembro de 1955, tinha início a Guerra do Vietnã, um dos mais sangrentos conflitos tributários da Guerra Fria. Inicialmente uma guerra civil travada pela unificação do Vietnã, o conflito ganhou dimensão internacional após a intervenção aberta e em larga escala dos Estados Unidos, visando impedir a consolidação de um governo socialista no Sudeste Asiático.
A guerra se estendeu ao Vietnã do Norte, Camboja e Laos, prolongando-se por 20 anos e deixando um saldo de mais de 3,5 milhões de mortos.
A gênese do conflito remonta à luta pela independência do Vietnã e à Segunda Guerra Mundial. Sob a liderança do revolucionário marxista Ho Chi Minh, o Viet Minh, principal movimento independentista do Vietnã, logrou expulsar as tropas japonesas que haviam invadido a região. Em 1946, os combatentes vietnamitas retomaram a luta contra o domínio colonial francês, dando início à Primeira Guerra da Indochina. A guerra se arrastou até 1954, quando os franceses foram decisivamente derrotados na Batalha de Dien Bien Phu.
A Conferência de Genebra reconheceu a autonomia política do Vietnã e a legitimidade do governo do Viet Minh nas províncias do norte, mas determinou a divisão do país ao meio, ao longo do Paralelo 17, autorizando que os grupos anticomunistas se instalassem ao sul. A divisão deveria ser temporária e um futuro referendo para a reunificação do país foi agendado para 1956.
Dois novos governos foram criados. Nas províncias setentrionais, instaurou-se a República Democrática do Vietnã (ou Vietnã do Norte) — um governo socialista, presidido por Ho Chi Minh e apoiado pela União Soviética. Na porção meridional, foi criado o Vietnã do Sul, um Estado imperial de orientação capitalista, aliado aos Estados Unidos e demais potências ocidentais.
O governo revolucionário do Vietnã do Norte iniciou uma série de reformas econômicas e sociais, incluindo a nacionalização de indústrias e a instituição da reforma agrária. Já no Vietnã do Sul, Ngo Dinh Diem comandou um golpe de Estado, depondo o imperador Bao Dai e consolidando um regime autoritário e repressivo.
Diem ordenou o massacre dos comunistas e a eliminação física de seus opositores. Ciente de que parte considerável da população sul-vietnamita era favorável aos revolucionários do norte, Diem cancelou o referendo sobre a unificação do país. Os norte-vietnamitas responderam incentivando a insurgência popular no Vietnã do Sul.
As provocações e estratégias de desestabilização mútuas evoluíram para tentativas abertas de imposição do regime político e econômico. A guerra teve início em 1º de novembro de 1955. Alarmados com a possibilidade de unificação do Vietnã sob o governo revolucionário do norte e com a expansão do bloco socialista no Sudeste Asiático (como preconizado pela “Teoria do Dominó”), o governo dos Estados Unidos passou a fornecer apoio financeiro, técnico e militar ao Vietnã do Sul.
Os norte-americanos intensificaram a ajuda militar ao governo sul-vietnamita após a deposição de Diem. Incapaz de superar a instabilidade política que seu regime ditatorial havia fomentado no Vietnã do Sul, Diem seria derrubado e assassinado por um golpe militar apoiado pela Casa Branca em 1963. O país atravessaria um período de grave instabilidade política até que Nguyen Van Thieu chegasse à Presidência.
Lideradas por Ho Chi Minh e Vo Nguyen Giap, as forças norte-vietnamitas empreenderam operações de enfrentamento aberto com tropas regulares, ao passo que a Frente Nacional para a Libertação do Vietnã (FNL, ou “Viet Cong”) conduzia enfrentamento de guerrilha contra os combatentes sul-vietnamitas em seu próprio território.
À medida em que o conflito progredia, o Vietnã do Norte passou a centralizar os esforços nas operações convencionais, mas o apoio militar e financeiro dos Estados Unidos ao Vietnã do Sul conferia maior poder de fogo às tropas adversárias, transformando a disputa em um conflito encarniçado.
Diante da resistência norte-vietnamita, o governo dos Estados Unidos decidiu intervir diretamente no conflito em favor do Vietnã do Sul, enviando tropas regulares com centenas de milhares de homens e intensificando o apoio material. Entre 1960 e 1961, a Casa Branca triplicou o número de tropas ativas no Vietnã do Sul e passaram a conduzir campanhas sistemáticas de bombardeio estratégico contra as cidades do Vietnã do Norte, causando enorme devastação.
Para tentar forçar a rendição norte-vietnamita, os Estados Unidos empregaram extrema violência em incursões terrestres e ataques aéreos contra alvos civis, fazendo uso generalizado de armas químicas como napalm, fósforo branco e agente laranja, afetando gravemente a capacidade produtiva do país.
Em 1964, os Estados Unidos realizaram uma operação de bandeira falsa que visava responsabilizar embarcações norte-vietnamitas pelo ataque a um contratorpedeiro norte-americano durante o chamado Incidente do Golfo de Tonkin.
A operação serviu de base para que o Congresso dos Estados Unidos aprovasse uma resolução autorizando o presidente Lyndon Johnson a ampliar exponencialmente as ações do país no conflito.
As tropas norte-americanas no Vietnã do Sul receberam um reforço de quase 600 mil soldados — elevando o efetivo total dos Estados Unidos no conflito a 2,7 milhões de homens. A guerra terrestre foi intensificada durante a “escalada” e os ataques aéreos se tornaram ainda mais violentos. O conflito se expandiu para além das fronteiras vietnamitas, atingindo também o Laos e o Camboja, que se tornaram alvos frequentes da Força Aérea dos Estados Unidos.
Em janeiro de 1968, as tropas regulares do Vietnã do Norte e os guerrilheiros “vietcongues” do FNL lançaram a Ofensiva do Tet — uma série de ataques de grande porte contra as principais cidades do Vietnã do Sul, incluindo a capital Saigon, visando incitar a população a um levante contra o governo sul-vietnamita e contra os ocupantes norte-americanos. A ofensiva foi taticamente derrotada, mas provocou forte impacto na avaliação do conflito, minando a confiança na estratégia militar dos Estados Unidos e levantando questionamentos sobre os custos de uma eventual vitória.
O elevado número de baixas e a divulgação dos efeitos da guerra, do uso de armas químicas e das atrocidades e massacres perpetrados pelos soldados norte-americanos contra a população civil vietnamita — nomeadamente o repulsivo Massacre de My Lai — causaram enorme desconforto na opinião pública dos Estados Unidos e ensejaram protestos internacionais exigindo o fim do conflito.
Richard Nixon, sucessor de Lyndon Johnson, iniciou o processo de “vietnamização” da guerra, investindo no aumento da capacidade militar das forças regulares do Vietnã do Sul, em paralelo com a redução gradual da presença das tropas norte-americanas. Ele buscava, dessa forma, transferir a responsabilidade pelas operações militares às tropas sul-vietnamitas, sem comprometer o objetivo de impedir a expansão do socialismo no Sudeste Asiático.
Com quase 60 mil soldados mortos e pressionado pelas críticas e abordagens da imprensa internacional, Nixon concluiu que o custo do conflito se tornara muito alto e que não conseguiria obter a vitória sem derramamento contínuo de sangue de suas tropas. Assim, no início da década de 1970, emissários da Casa Branca iniciaram as conversações por um cessar-fogo.
Em janeiro de 1973, durante os Acordos de Paz de Paris, Nixon cedeu à assinatura de um armistício, concordando em encerrar a guerra mesmo sem conseguir atingir nenhum de seus objetivos. No ano seguinte, os Estados Unidos aceleraram a retirada de suas tropas e abandonaram o apoio formal ao governo de Nguyen Van Thieu.
Em março de 1975, os norte-vietnamitas iniciaram uma grande ofensiva final. As províncias sulistas de Quang Tri, Da Nang e Thua Thien-Hue foram entregues sem resistência e Thieu abandonou a Presidência, deixando o general Duong Van Minh em seu lugar.
Em 30 de abril de 1975, as forças revolucionárias ocuparam Saigon, expulsando as tropas estrangeiras remanescentes e unificando o país sob o governo socialista de Hanói. E o pequeno Vietnã do Norte entrava para a história como a nação que havia imposto à maior potência bélica do mundo uma humilhante derrota militar.