Há 88 anos, em 6 de março de 1937, nascia a cosmonauta russa Valentina Tereshkova. Selecionada pelo programa espacial soviético, Valentina se tornou a primeira mulher a viajar para o espaço, a bordo da espaçonave Vostok 6.
Valentina completou 48 voltas na órbita da Terra durante uma missão que durou três dias. Considerado um dos grandes marcos históricos do século 20, a viagem de Valentina ajudou a consolidar a liderança da União Soviética na corrida espacial durante a Guerra Fria.
Após sua carreira como cosmonauta, Valentina ingressou na política, tornando-se membra do Soviete Supremo e integrante do Comitê Central do Partido Comunista. Desde 2011, ela ocupa um dos assentos na Duma Estatal da Rússia.
O programa espacial soviético
Tendo como marco inicial as teorias sobre exploração espacial desenvolvidas por Konstantin Tsiolkovski e os experimentos conduzidos pelo Grupo de Estudos de Propulsão Reativa na década de 1930, o programa espacial da União Soviética ingressou em sua era de ouro após a Segunda Guerra Mundial, alavancado pelo desenvolvimento de novos sistemas de propulsão de mísseis.
Com o início da Guerra Fria, Estados Unidos e União Soviética iniciaram uma forte concorrência pela primazia na exploração do universo e pelo aperfeiçoamento da tecnologia aeroespacial — um ativo estratégico para o aperfeiçoamento dos sistemas de defesa e de segurança nacional das duas superpotências.
Coube à União Soviética a liderança na corrida espacial, afirmada por uma sequência de feitos inéditos. Em 1957, os soviéticos lançaram o R-7, o primeiro míssil balístico intercontinental. Nesse mesmo ano, colocaram em órbita o Sputnik 1, o primeiro satélite artificial da história.
Dois anos depois, os soviéticos lançaram a sonda Luna 1, a primeira espaçonave a se aproximar da superfície lunar. Por fim, em abril de 1961, o cosmonauta Yuri Gagarin se tornou o primeiro ser humano a viajar pelo espaço, a bordo da espaçonave Vostok 1.
Dando sequência à tradição de pioneirismo, o governo soviético lançou em 1962 um programa para selecionar a primeira mulher a viajar para o espaço. O processo seletivo contou com a inscrição de milhares de voluntárias. Cinco mulheres foram selecionadas. Dentre elas, estava a jovem Valentina Tereshkova.

Valentina Tereshkova em 1962
Valentina Tereshkova
Valentina nasceu na cidade de Bolshoye Maslennikovo, no Oblast de Yaroslavl, em uma família de origem operária. Seu pai, Vladimir Tereshkov, era um ex-motorista de trator que se tornou soldado do Exército Vermelho. Ele faleceu quando Valentina tinha apenas dois anos, lutando na Guerra de Inverno contra as tropas finlandesas. Viúva, a mãe de Valentina, Elena Fyodorovna, teve de sustentar sozinha a família, trabalhando em uma fábrica de algodão.
Valentina começou a trabalhar na adolescência. Ela foi funcionária de uma fábrica de pneus e de uma tecelagem. Em 1960, formou-se como técnica têxtil. Em paralelo ao trabalho, Valentina se dedicava às atividades políticas. Ela se filiou ao Komsomol — a União da Juventude Comunista — e chegou a ocupar o cargo de secretária da organização.
O maior interesse de Valentina em sua juventude, no entanto, era o paraquedismo. Ela começou a praticar a atividade em um aeroclube local e fez seu primeiro salto aos 22 anos. Valentina chegou a participar de competições de paraquedismo e foi fundadora e presidente do Clube de Paraquedistas Amadores.
Valentina pertencia a uma geração que se encantou com o voo pioneiro de Yuri Gagarin em abril de 1961. A façanha do cosmonauta o tornou uma das personalidades mais famosas e admiradas em todo o mundo — e um herói nacional na União Soviética. Assim, quando soube que o governo estava selecionando mulheres paraquedistas para uma missão espacial, Valentina se voluntariou.
O voo de Valentina
Mais de 400 candidatas foram selecionadas pelo programa espacial soviético na triagem inicial. A ampla experiência no paraquedismo, as condições físicas ideais e o excelente desempenho nos testes físicos, técnicos e psicológicos permitiram que Valentina chegasse entre as finalistas do processo seletivo. Sua origem operária, o fato de ser filha de um herói de guerra e suas ligações com o Partido Comunista também pesariam em seu favor.
Valentina passou por um rigoroso treinamento. Ela foi submetida a testes de centrífuga, descompressão, câmara térmica e isolamento. Passou por diversos cursos de instrução técnica sobre os sistemas da nave Vostok, estudou astronomia e engenharia espacial na Academia Zhukovsky e teve de aprender a pilotar jatos militares.
Após quase um ano de treinamento, Valentina foi escolhida para pilotar a Vostok 6. O lançamento da espaçonave ocorreu na manhã de 16 de junho de 1963, no Centro Espacial de Baikonur, no Cazaquistão.
A decolagem ocorreu sem falhas e a espaçonave logo atingiu a altitude de apogeu de 212 quilômetros. Pelo rádio, Valentina se comunicou com o Centro Espacial, identificando-se pelo codinome escolhido para a missão — “Chaika”, ou “gaivota” em russo: “Sou eu, Chaika! Está tudo bem. Eu vejo o horizonte. É um céu azul com uma faixa escura. Como a Terra é linda”.
Valentina permaneceu em órbita por 72 horas, período durante o qual completou 48 voltas ao redor da Terra. A cosmonauta russa passou mais tempo em órbita do que todos os astronautas do programa espacial norte-americano Mercury somados. As fotografias e dados coletados por Valentina durante o voo foram utilizados para identificar as camadas de aerossol na atmosfera terrestre.
Após quase três dias em órbita, a Vostok 6 retornou à Terra. Valentina teve de assumir o controle manual da espaçonave em função de uma falha no sistema de navegação. Quando a Vostok estava a seis quilômetros de distância do solo, Valentina ejetou seu assento, pousando de paraquedas em uma fazenda coletiva na fronteira entre a Rússia e o Cazaquistão.
Após a Vostok 6
Valentina foi aclamada internacionalmente pelo seu feito. Ela foi condecorada com a Ordem de Lenin e recebeu o título de Heroína da União Soviética. Foi ovacionada durante o Congresso Internacional de Mulheres em Moscou e recebeu inúmeros convites para visitar outros países.
Entre 1963 e 1970, Valentina fez mais de 40 viagens ao exterior, promovendo o programa espacial soviético e servindo como representante de seu país em visitas de cunho diplomático. Ela se tornou integrante do Conselho Mundial da Paz e liderou a delegação soviética durante a Conferência Mundial sobre as Mulheres, em Copenhague. Também serviu como representante soviética durante a Conferência da ONU para o Ano Internacional da Mulher, sediada na Cidade do México.
Valentina teve importante atuação política, tornando-se membra do Soviete Supremo — máximo órgão deliberativo do governo soviético. Ela também foi eleita para o Comitê Central do Partido Comunista da União Soviética, onde permaneceu por mais duas décadas.
Em 1963, Valentina se casou com o também cosmonauta Adrian Nikolayev, com quem teve uma filha chamada Elena. Divorciou-se posteriormente e casou-se pela segunda vez com o cirurgião Yuli Shaposhnikov. Ela se doutorou em engenharia aeronáutica e atuou por vários anos como instrutora no Centro de Treinamento de Cosmonautas Yuri Gagarin.
Após a dissolução da União Soviética, Valentina foi eleita para ocupar uma cadeira na Duma Estatal — a câmara baixa do parlamento russo. Valentina é filiada à legenda governista Rússia Unida, e ainda hoje exerce função parlamentar.
Após o início da Guerra da Ucrânia, Valentina foi alvo de uma série de sanções. Seu nome foi incluso na “lista de cidadãos bloqueados” do governo norte-americano, que determinou o congelamento de seus bens e a proibição de transações comerciais com cidadãos dos Estados Unidos. Valentina também foi proibida de ingressar nos países que compõem a União Europeia.
Valentina permanece até hoje como a única mulher a ter feito um voo solo ao espaço. Em 1982, a União Soviética tornou-se responsável por enviar a segunda mulher em uma missão espacial — Svetlana Savitskaya, a bordo da espaçonave Soyuz T-7.