Quarta-feira, 26 de março de 2025
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Há 31 anos, em 25 de fevereiro de 1994, o colono israelense Baruch Goldstein abria fogo contra uma multidão de palestinos que rezavam dentro da Mesquita Ibrahimi, na Cisjordânia. O ataque, intitulado Massacre do Túmulo dos Patriarcas, resultou na morte de ao menos 29 palestinos e deixou outros 125 feridos.

Indignados com a chacina, os palestinos convocaram uma série de protestos e manifestações, mas foram brutalmente reprimidos pelo governo israelense. Ao mesmo tempo, os sionistas de extrema direita passaram a cultuar Baruch Goldstein como um herói, chegando a erguer um monumento em sua homenagem.

Quem foi Baruch Goldstein

Baruch Goldstein nasceu em Nova York em 1956, em uma família de judeus ortodoxos. Ele era filiado à Liga de Defesa Judaica — uma organização sionista de extrema direita, responsável por conduzir diversos atentados terroristas nos Estados Unidos na década de 1980.

A Liga de Defesa Judaica foi criada por um amigo de infância de Goldstein, o rabino Meir Kahane, um dos principais ideólogos da extrema direita israelense. Após se mudar para Israel, Kahane foi um dos fundadores do Kach, um partido abertamente supremacista.

A despeito de sua condenação por terrorismo nos Estados Unidos, Kahane foi eleito como membro do Knesset — o Parlamento israelense. Em seu mandato, Kahane propôs medidas segregacionistas, visando banir a convivência com os árabes e criminalizar os relacionamentos amorosos entre judeus e não judeus.

Goldstein foi fortemente influenciado pelo pensamento reacionário de Kahane. Em 1983, após se graduar em medicina nos Estados Unidos, Goldstein se mudou para Israel. Ele serviu como médico no Exército israelense, chegando a atuar na ofensiva contra a OLP no Líbano.

Relatos do período afirmam que Goldstein se recusava a atender pacientes não judeus, alegando que tal ação seria uma ofensa às “leis judaicas”. Após ser dispensado do Exército, ele se fixou em Kiryat Arba, nos arredores de Al-Khalil (Hebrom) — o primeiro dos assentamentos israelenses construídos ilegalmente na Cisjordânia.

O supremacista se filiou ao Kach e se tornou um dos líderes da agremiação. Foi um dos candidatos do partido ao Knesset na eleição de 1984, mas não conseguiu se eleger. Não obstante, Goldstein foi eleito como representante no conselho municipal de Kiryat Arba alguns anos depois.

O Massacre do Túmulo dos Patriarcas

O assassinato de Meir Kahane em Nova York e a resistência aos acordos de paz de Oslo causaram alvoroço na extrema direita israelense no início dos anos 90, resultando em uma onda de ataques violentos.

Em 1993, Goldstein conduziu um ataque contra a Mesquita Ibrahimi, agredindo seis palestinos e jogando ácido sulfúrico no interior do templo. Um agente do Shin Bet chegou a alertar o governo israelense acerca do risco que Goldstein representava, mas as autoridades não tomaram nenhuma atitude para tentar contê-lo.

Na manhã de 25 de fevereiro de 1994, Goldstein pegou seu fuzil IMI Galil, quatro carregadores e algumas granadas e partiu rumo à Mesquita Ibrahimi, localizada no Túmulo dos Patriarcas, em Al-Khalil.

Conforme a tradição, o Túmulo dos Patriarcas é o local onde estão sepultados os restos mortais dos profetas e patriarcas das religiões abraâmicas, sendo por isso considerado um local sagrado para muçulmanos, judeus e cristãos.

Massacre do Túmulo dos Patriarcas
Fotografia de Gideon Markowiz / Biblioteca Nacional de Israel / Wikimedia Commons
Palestinos protestando após o Massacre do Túmulo dos Patriarcas

O templo estava repleto de pessoas, que celebravam tanto os rituais do Ramadã (mês sagrado dos muçulmanos) quanto o Purim (festa religiosa judaica).

Goldstein passou com seu fuzil por dois postos de controle das Forças Armadas e entrou na Mesquita Ibrahimi, sem ser parado por ninguém. O terrorista israelense adentrou então no saguão onde os palestinos estavam rezando e aguardou o “sujud”, o momento da oração em que os muçulmanos se curvam e encostam a cabeça no chão.

Nesse momento, Goldstein deu início ao ataque jogando uma granada no meio dos fiéis. Em seguida, começou a disparar com seu fuzil contra multidão, alvejando dezenas de pessoas.

O chão da mesquita ficou encharcado com poças de sangue. A chacina somente foi interrompida quando Goldstein precisou trocar o cartucho do fuzil. Os sobreviventes aproveitaram o momento para golpeá-lo com um extintor de incêndio e o espancaram até a morte.

O massacre deixou ao menos 29 palestinos mortos, incluindo crianças, e feriu outras 125 pessoas. Alguns sobreviventes relataram que soldados israelenses que estavam na parte de fora da mesquita dispararam contra os palestinos que tentavam fugir do atirador. Outras testemunhas disseram ter visto um homem com traje militar auxiliando Goldstein durante o massacre.

As reações à matança

O ataque deflagrou uma onda de protestos na Cisjordânia e em toda a Palestina. As manifestações foram brutalmente reprimidas pelo Exército israelense, resultando na morte de outras 25 pessoas.

O governo israelense aproveitou os protestos para impor o toque de recolher contra os palestinos, preservando, entretanto, o direito de ir e vir dos colonos israelenses. Mais de 300 famílias palestinas foram forçadas a fechar permanentemente suas lojas.

Yitzhak Rabin, então primeiro-ministro de Israel, condenou o ataque e afirmou que Goldstein era “uma vergonha para o sionismo e um constrangimento para o judaísmo”. Não obstante, as ações dele foram saudadas como atos heroicos por boa parte dos sionistas.

Uma multidão compareceu ao funeral do assassino e seu túmulo se tornou um local de peregrinação. Admiradores de Goldstein chegaram a erguer um memorial em sua honra, com uma inscrição gravada em placa de mármore, descrevendo-o como “um santo que deu sua vida pelo povo judeu, pela Torá e pela nação de Israel”.

O monumento glorificando Goldstein foi removido pelo governo israelense em 1999, mas a lápide que o descreve como “um mártir de mãos limpas e coração puro” ainda adorna seu sepulcro. A cerimônia fúnebre foi presidida pelo rabino Yaacov Perrin, que afirmou na ocasião que “nem um milhão de árabes valem sequer uma unha de um judeu”.

Dov Lior, outro rabino, afirmou que Goldstein era “mais sagrado que todos os mártires do Holocausto”. Durante muitos anos, colonos de extrema direita celebraram o massacre, vestindo os filhos com roupas que evocavam Goldstein.

O Massacre do Túmulo dos Patriarcas minou de vez o apoio público aos acordos de paz, contribuindo para a deterioração do diálogo esboçado entre as lideranças israelenses e palestinas desde o fim dos anos 80. A chacina também incitou a ação do Hamas, que realizou dois ataques a alvos israelenses em abril de 1994.

O Conselho de Segurança da ONU aprovou a Resolução 904 condenando o massacre e instando Israel a tomar medidas para proteger os civis palestinos, incluindo o desarmamento dos colonos. A resolução, entretanto, nunca foi cumprida.