Há 138 anos, em 4 de setembro de 1886, Gerônimo e suas tropas eram subjugados pelo exército do Estados Unidos. Líder dos guerreiros Apache, Gerônimo se destacou como um brilhante estrategista militar. Ao longo de décadas, ele logrou impor uma heroica resistência contra o roubo das terras indígenas e a opressão do governo norte-americano, conduzindo uma impressionante campanha de guerrilha.
Gerônimo nasceu em 16 de junho de 1829 nos arredores de Turkey Creek, no Novo México, em uma comunidade Apache. Seu nome indígena era Goyaalé —ou “O Que Boceja”, na língua Mescalero-Chiricahua. À época de seu nascimento, a região de Turkey Creek ainda fazia parte do México, mas seria incorporada aos Estados Unidos em 1848, após a Guerra Mexicano-Americana. Gerônimo era descendente de Mahko, um respeitado líder nativo, e pertencia à nação dos Bedonkohe, um ramo dos Apache Chiricahua, famosos pela resistência aguerrida mantida contra os invasores desde a era colonial.
Em março de 1851, uma companhia de 400 milicianos mexicanos, comandados por José María Carrasco, atacou o acampamento de Gerônimo, motivados pelas recompensas que o governo mexicano oferecia por escalpos dos indígenas Apache.
No ataque, os mexicanos mataram a mãe, a esposa e os três filhos de Gerônimo. Furioso, Gerônimo jurou vingança. Buscou então auxílio do guerreiro Apache Mangas Coloradas, que há décadas liderava a resistência dos nativos contra as incursões mexicanas. Mangas Coloradas orientou Gerônimo a se juntar a um outro grupo de guerreiros, comandado pelo chefe Cochise.
Nos anos seguintes, Gerônimo se destacou pela coragem, destreza e inteligência nas batalhas contra os mexicanos. Foi durante uma dessas contendas que ganhou dos inimigos a alcunha evocando São Jerônimo — uma referência à capacidade “milagrosa” do nativo de se desvencilhar dos disparos de armas de fogo e subjugar os inimigos.
Ao guerreiro apache também se atribuía a capacidade sobrenatural de se locomover sem deixar rastros e de retardar ou adiantar o pôr do sol. Em pouco tempo, Gerônimo se tornaria chefe do seu próprio exército e se firmaria como um dos mais célebre dos líderes militares dos povos nativos da América do Norte.
Ao mesmo tempo em que impunha sucessivas derrotas aos mexicanos, Gerônimo viu-se obrigado a combater as tropas norte-americanas. Quando os Estados Unidos declararam guerra ao México, os Apache prometeram passagem segura para os militares norte-americanos, em troca da assinatura de um tratado de paz reconhecendo o direito dos nativos sobre as suas terras.
Com o fim da guerra e o avanço da “Marcha para o Oeste”, entretanto, os Estados Unidos romperam o acordo e passaram a reivindicar a posse dos territórios dos Apache, ricos em recursos naturais e propícios para a exploração agrícola comercial. Em 1872, o governo dos Estados Unidos criou a Reserva Indígena de San Carlos, no Arizona, e adotou uma política de remoção forçada dos Apache, visando se apoderar de suas terras. A resistência indígena levou ao recrudescimento da repressão governamental e uma série de massacres contra os nativos, reavivando as chamadas “Guerras Apache”.
Espoliados de seus recursos, os indígenas realocados passaram a viver em condições precárias na Reserva de San Carlos. Além de serem submetidos ao tratamento brutal e à violência exercida pelos guardas e agentes do governo, os indígenas não tinham liberdade de exercer suas crenças, manter seus costumes ou mesmo plantar seus alimentos.
As taxas de letalidade por doenças como malária eram muito elevadas e as rações fornecidas pelo governo dos Estados Unidos não supriam as necessidades de todos, levando a uma grave situação de carestia. Reagindo ao tratamento desumano do governo norte-americano, Gerônimo tornou-se líder dos chamados “índios renegados” — isso é, os Apache que se recusavam a ficar confinados na reserva.
Gerônimo conduziu sucessivos ataques contra postos militares da Reserva de San Carlos, facilitando a fuga dos cativos. Também empreendeu diversas escaramuças e ataques contra as aldeias de colonos, fazendas, composições ferroviárias e acampamentos de garimpeiros e viajantes nas regiões de Arizona e Novo México.
Privados do uso da terra, os Apache “renegados” também se viam obrigados a recorrer frequentemente a roubos e assaltos, provocando apelos cada vez mais enérgicos dos colonos, que exigiam a neutralização urgente do grupo de Gerônimo. A exemplo do que tinham feito com os mexicanos, entretanto, os Apache conseguiram impor uma impressionante resistência às investidas do Exército dos Estados Unidos, prolongando o conflito por muitos anos.
Em 1883, o general George Crook liderou uma gigantesca expedição, com soldados bem armados, para combater os guerreiros Apache. Divididos em duas colunas, os militares norte-americanos conseguiram cercar e eliminar parte substancial das tropas nativas.
O líder Apache ainda logrou evitar a captura, conduzindo um grupo de combatentes a um recuo estratégico rumo às montanhas e cânions do Arizona. No segundo semestre de 1886, o general Nelson Miles, líder da 4ª Cavalaria, lançou uma nova campanha militar de grande porte junto à fronteira com o México, aniquilando quase todos os guerreiros do exército de Gerônimo.
No dia 4 de setembro de 1886, com seu exército reduzido a um total de 38 nativos, grande parte dos quais mulheres e crianças, Gerônimo se rendeu. Os guerreiros sobreviventes foram presos e detidos em Fort Pickens, na Flórida, ao passo que suas famílias foram alocadas em Fort Marion. Foram posteriormente transferidos para o Alabama até a realocação definitiva em Fort Sill, Oklahoma.
Gerônimo tornou-se prisioneiro de guerra pelo resto da vida e passou mais de duas décadas sob custódia do governo dos Estados Unidos, sem nunca mais retornar à sua terra natal. Foi forçado a abandonar seus costumes, converteu-se ao cristianismo e foi exibido como troféu de guerra em paradas militares em Washington, DC. Morreu de pneumonia em Fort Sill, em 17 de fevereiro de 1909, lamentando a decisão tomada 23 anos antes. “Nunca devia ter me rendido. Devia ter lutado até o fim”, queixou-se no leito de morte.
Nove anos após seu falecimento, o túmulo de Gerônimo foi profanado por estudantes afluentes da Universidade de Yale. Seu crânio foi roubado por membros da sociedade secreta Skull and Bones, à qual pertencia Prescott Bush, filho do magnata do aço Samuel Bush e avô do futuro presidente dos Estados Unidos George W. Bush.
Grupos isolados de guerreiros apaches seguiram lutando contra as tropas norte-americanas mesmo após a prisão e morte de Gerônimo, mas foram quase dizimados pelos regimentos de James Watson, James Daniels e William McBryar.
As últimas investidas dos nativos foram debeladas em 1924, encerrando as Guerras Apache. As guerras indígenas travadas pelo Exército dos Estados Unidos estão entre os piores genocídios da história. Em um intervalo de dois séculos, a população indígena norte-americana foi reduzida de 25 milhões para menos de 2 milhões de indivíduos.