Há 80 anos, em 28 de janeiro de 1945, a franco-atiradora soviética Roza Shanina tombava em combate. Considerada uma das maiores snipers femininas da história, Roza se voluntariou para combater os nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. Ela se destacou por sua grande habilidade e pela precisão de sua mira, acumulando 59 mortes confirmadas de soldados nazistas — feito que lhe valeu o apelido de “o Terror Invisível”. Roza foi laureada por duas vezes com a Ordem da Glória e reconhecida como Heroína da União Soviética.
Quem foi Roza Shanina
Roza Iegorovna Shanina nasceu em 3 de abril de 1924 no vilarejo russo de Edma, no oblast de Arcangel, em uma família de camponeses. Seu nome era uma homenagem à revolucionária marxista Rosa Luxemburgo. Roza cresceu em um kolkhoz (fazenda coletiva) localizado em uma área remota de Edma e precisava caminhar 13 quilômetros todos os dias para frequentar a escola na cidade vizinha de Bereznik.
A jovem nutria o sonho de ser professora, mas seus pais queriam que ela permanecesse dedicada aos afazeres domésticos. Obstinada, ela fugiu de casa aos 14 anos e caminhou 200 quilômetros até chegar a uma estação ferroviária, onde pegou o trem rumo a Arcangel, a capital do oblast. Na cidade, ela passou a morar com o irmão mais velho, Fyodor.
Roza ingressou no curso noturno da Faculdade de Pedagogia de Arcangel. Ela conciliava os estudos com o trabalho, exercendo o cargo de professora em um jardim de infância. Também mantinha intensa atividade política, sendo filiada à União da Juventude Comunista desde os 14 anos.
A rotina pacata de Roza sofreria uma grande reviravolta após a eclosão da Segunda Guerra Mundial. Em junho de 1941, as tropas da Alemanha nazista e de outras nações do Eixo invadiram a União Soviética durante a Operação Barbarossa. A campanha militar — a maior da história — mobilizou quase 4 milhões de soldados, apoiados por 600 mil veículos, 3.300 tanques e 2.500 aeronaves.
As forças da Eixo atacaram simultaneamente o território soviético em uma frente de 2.900 quilômetros de extensão. As consequências foram devastadoras. Aproximadamente 5 milhões de soviéticos foram mortos durante a operação. Milhares de cidades e vilarejos foram completamente destruídos e os civis foram submetidos a abusos, massacres e chacinas.
O ingresso no Exército Vermelho
Arcangel foi uma das muitas localidades atacadas pelos nazistas, sendo submetida a uma violenta campanha de bombardeios pela Luftwaffe — a força aérea alemã. Roza se juntou aos grupos de voluntários civis que se dedicavam a socorrer os feridos, combater os incêndios e monitorar ataques aéreos.
Os irmãos mais velhos de Roza foram convocados a lutar no exército soviético. Um deles, Mikhail, morreu em dezembro de 1941, combatendo as tropas nazistas durante o Cerco a Leningrado. Outros dois irmãos de Roza também morreriam no conflito. Após ser notificada sobre a morte de Mikhail, Roza se ofereceu como voluntária ao alistamento do Exército Vermelho.
A União Soviética foi o único país a integrar mulheres em larga escala em suas forças armadas durante a Segunda Guerra. O grande número de baixas sofridas durante a invasão alemã gerou a necessidade urgente de recrutar novas tropas. E as mulheres soviéticas — que desde a Revolução de Outubro já desempenhavam funções em atividades tradicionalmente vistas como masculinas — atenderam prontamente o chamado.
Mais de 800 mil mulheres soviéticas lutaram contra a Alemanha nazista. Dentre elas, havia um grupo de aproximadamente 2.500 franco-atiradoras que desempenharam um papel de enorme importância estratégica.
Roza Shanina foi uma dessas mulheres. Após concluir o treinamento militar básico, a jovem foi enviada para a Escola Central de Treinamento de Franco-Atiradoras, onde se formou com honras. Seu desempenho foi tão excepcional que lhe rendeu o convite para atuar como instrutora. Ansiosa por atuar na linha de frente, Roza recusou.
Roza partiu para sua primeira missão em abril de 1944, já na condição de comandante do pelotão de snipers da 184ª Divisão de Rifles. Foi nessa ocasião que ela abateu seu primeiro alvo — um soldado alemão alvejado a 400 metros de distância.
Muitos outros se seguiram. Durante a Batalha de Kozyi Gory, Roza conseguiu eliminar 13 soldados nazistas, mesmo estando sob ataque da artilharia. O feito lhe rendeu sua primeira condecoração. Ela foi a primeira militar da Frente Bielorrussa a receber a Ordem da Glória de 3ª Classe.

Roza Shanina retratada em 1944. Fotógrafo desconhecido. Wikimedia Commons.
A ofensiva em Vitebsk
Roza se destacava tanto pela coragem quanto pela precisão de seus tiros. Ela dominava todas as táticas de contra-atirador e tinha paciência, concentração e autocontrole para se camuflar e emboscar os inimigos. Também era conhecida pela habilidade de fazer “tiros duplos” (dois acertos em alvos, com dois disparos feitos em rápida sucessão).
Em junho de 1944, o alto comando do Exército Vermelho lançou uma grande ofensiva militar contra as tropas nazistas — a Operação Bagration. A campanha teria papel fundamental na derrota das forças do Eixo, logrando a aniquilação quase completa do Grupo de Exércitos Centro da Wehrmacht.
Quando a ofensiva chegou à região de Vitebsk, Roza Shanina pediu aos seus superiores autorização para auxiliar seus compatriotas na linha de frente. O pedido foi negado, mas ela desobedeceu às ordens dos oficiais e foi a campo mesmo assim. A atitude resultaria em uma sanção disciplinar, mas os superiores de Roza se negaram a submetê-la à corte marcial.
Roza ajudou a derrotar os nazistas durante a Ofensiva de Vitebsk-Orsha. Ela também participou da libertação de Vilnius — onde obteve destaque com a eliminação de 12 atiradores inimigos.
A Divisão de Rifles de Roza foi a primeira unidade militar soviética a avançar sobre a Prússia Oriental. Em setembro de 1944, Roza já contabilizava 51 soldados alemães abatidos —sendo 15 eliminados em solo alemão.
A fama de matadora de nazistas a tornou internacionalmente conhecida. Os jornais ocidentais a apelidaram de “o terror invisível da Prússia Oriental” — evocando o fato de que os seus alvos eram eliminados sem sequer saber de onde partiu o ataque. Ainda em 1944, Roza receberia mais duas condecorações: a Ordem da Glória de 2ª classe e a Medalha da Coragem — tornando-se uma das primeiras franco-atiradoras a receber essa honraria.
O combate final na Prússia Oriental
Em janeiro de 1945, Roza partiu para a derradeira ofensiva contra os nazistas na Prússia Oriental. Os combates foram bastante encarniçados. O alto comando alemão havia enviado reforços viando assegurar o domínio da região. O destacamento de Roza sofreu uma emboscada das tropas nazistas, ficando sob fogo intenso. Encurralada, Roza chegou a escrever uma carta de despedida para sua família. No documento, a jovem informava que 72 das 78 pessoas que integravam seu batalhão já haviam morrido.
Em 27 de janeiro, Roza Shanina foi gravemente ferida após a explosão de uma granada. Ela chegou a ser resgatada e socorrida por soldados do Exército Vermelho, mas não resistiu aos ferimentos. Faleceu no dia seguinte, 28 de janeiro de 1945, com apenas 20 anos de idade. No mesmo dia de sua morte, as tropas soviéticas conseguiram subjugar os nazistas, expulsando-os de Tilsit , Insterburg e Pillau.
Roza foi postumamente homenageada com a construção de um museu em sua memória na sua cidade natal, Yedma. Ela também empresta seu nome ao prêmio concedido por uma das principais competições esportivas militares da Rússia.
Durante a guerra, Roza mantinha um diário, onde registrava seu cotidiano, falava sobre seus sentimentos e sobre os acontecimentos no campo de batalha. Esse documento é um registro de grande importância, retratando a experiência da guerra sob a ótica de uma mulher combatendo na linha de frente. Parte do diário foi publicado nos anos 60 pela revista Yunost. Uma versão traduzida para o inglês foi publicada em 2020.