Há 154 anos, em 5 de março de 1871, nascia a teórica e revolucionária marxista Rosa Luxemburgo. Considerada uma das mais importantes líderes do movimento socialista do início do século 20, Rosa Luxemburgo participou ativamente da articulação das lutas operárias na Polônia, na Alemanha e na Rússia.
Rosa Luxemburgo foi fundadora do Partido Comunista da Alemanha e tomou parte do Levante Espartaquista, ocasião em que foi assassinada. Deixou vasta contribuição teórica ao pensamento socialista, assentada na defesa da ação revolucionária das massas como fundamento central da transformação política.
Os anos iniciais
Rosa Luxemburgo nasceu em Lublin, na Polônia, em uma afluente família de origem judaica. Ainda pequena, mudou-se com seus pais para Varsóvia, onde concluiu seus estudos básicos. Ingressou na juventude no Partido do Proletariado e deu início à sua militância política organizando uma greve geral, brutalmente reprimida pelo governo polonês.
Luxemburgo foi presa logo em seguida, mas conseguiu escapar e se refugiou na Suíça. Em 1889, ela ingressou na Universidade de Zurique, onde estudou filosofia, história, ciência política, economia e matemática. Doutorou-se em 1898, apresentando a tese “O desenvolvimento industrial da Polônia“.
Nos anos seguintes, Luxemburgo se aprofundaria nos estudos marxistas e se aproximaria dos membros do Partido Operário Social-Democrata Russo (POSDR), tais como Georgi Plekhanov e Pavel Akselrod. Em 1893, ela fundou o jornal “A Causa Operária“, onde publicou uma série de artigos criticando as políticas nacionalistas do Partido Socialista Polonês.
Embora defendesse a autonomia polonesa, Luxemburgo acreditava que o enfoque na autodeterminação das minorias nacionais era uma estratégia equivocada que resultaria no enfraquecimento do movimento socialista internacional e no fortalecimento da burguesia. Ao lado de Leo Jogiches, Luxemburgo ajudou a fundar o Partido Social-Democrata do Reino da Polônia (SDRP), assumindo o cargo de porta-voz e teórica da agremiação.
Luxemburgo se mudou para a Alemanha em 1897 e aceitou um casamento com Gustav Lübeck, a fim de obter a cidadania alemã. Filiou-se em seguida ao Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD) e voltou à agitação revolucionária.
Trajetória no SPD
Em 1900, Luxemburgo publicou “Reforma ou Revolução?“, onde criticava o revisionismo da teoria marxista empreendido por Eduard Bernstein, identificando suas ideias como uma “renúncia à transformação social”. Luxemburgo considerava que o reformismo somente era válido como uma estratégia que conduzisse à revolução, advertindo que as reformas ininterruptas do capitalismo se transformariam em apoio permanente à burguesia, afastando cada vez mais a possibilidade de construção do socialismo.
Com base em sua percepção crítica acerca do reformismo, Luxemburgo liderou uma campanha em prol da expulsão dos revisionistas do SPD. A campanha foi malsucedida, mas ela conseguiu convencer o dirigente Karl Kautsky a manter a teoria marxista no programa do partido. Luxemburgo também manifestou seu desacordo com Lenin tanto em relação à organização do SPD como sobre a concepção da social-democracia enquanto estratégia revolucionária.
Em 1904, Luxemburgo foi presa por dois meses por “insultar o Kaiser”. Durante a Revolução de 1905 na Rússia, ela defendeu os princípios marxistas e se opôs aos mencheviques. Mudou-se para Varsóvia intencionando participar da sublevação, mas foi novamente presa.
Durante o tempo em que esteve na cadeia, Luxemburgo escreveu “Greve de Massas, Partido e Sindicatos“, onde teorizava que a greve de massas era o principal instrumento de luta revolucionária do proletariado — tese que recebeu forte oposição de August Bebel e Karl Kautsky.
Em 1907, Luxemburgo enfrentou mais uma prisão política de dois meses. Posta em liberdade, participou do Congresso dos Sociais Democratas Russos em Londres, onde encontrou-se pessoalmente com Lenin. Também tomou parte no sétimo congresso da Segunda Internacional, apresentando uma resolução sobre a necessidade de cooperação dos partidos trabalhistas para a manutenção da paz na Europa.
Ainda em 1907, Luxemburgo assumiu o cargo de professora de economia política e história econômica na Escola do Partido Social Democrata. Nessa função, escreveu “A Acumulação do Capital“, onde defende a tese de que o imperialismo é inerente ao capitalismo, e “Introdução à Economia Política”. Publicou outros textos reforçando sua oposição ao revisionismo e, em 1910, rompeu em definitivo com Karl Kautsky, quando este se recusou a apoiar sua campanha pelo fim da monarquia na Alemanha.

Retrato de Rosa Luxemburgo (c. 1895-1905)
A Liga Espartaquista
Em 1914, a bancada do Partido Social-Democrata alemão no Reichstag votou a favor da viabilização de créditos para que o país ingressasse na Primeira Guerra Mundial. Indignada com a decisão de seu partido, Rosa Luxemburgo aliou-se a Karl Liebknecht, único parlamentar do SPD a votar contra, e fundou o grupo Internationale, que logo se tornaria Liga Espartaquista, na qual ingressaram nomes como Clara Zetkin e Franz Mehring, entre outros.
A Liga Espartaquista defendia que os soldados alemães deveriam abandonar o conflito internacional e somar esforços na luta pela revolução socialista na Alemanha — ideia sintetizada no famoso adágio “socialismo ou barbárie”, através do qual Luxemburgo defendia que o capitalismo caminha inexoravelmente rumo à destruição e que a sobrevivência da humanidade depende de sua superação.
Em 1915, Rosa Luxemburgo foi novamente presa por agitação antimilitarista e por seus discursos condenando a guerra e o imperialismo, ficando encarcerada por três anos. Mesmo presa, ela deu continuidade ao seu ativismo político e à sua produção intelectual.
Ainda em 1915, Luxemburgo escreveu “O Folheto Junius“, onde estabelecia a base teórica da Liga Espartaquista. Dois anos depois, escreveu “A Revolução Russa”, analisando os eventos da Revolução de 1917. Na obra, Luxemburgo enalteceu a iniciativa dos revolucionários e a importância histórica do evento, mas criticou a violência e a “incompreensão dos bolcheviques no tocante à democracia”.
No Partido Social-Democrata, as tensões e divisões internas atingiram seu ápice em 1917, quando a Liga Espartaquista foi expulsa da agremiação, junto com um grupo de filiados que faziam oposição à corrente majoritária.
Os militantes expulsos se reorganizaram, fundando a o Partido Social-Democrata Independente (PSDI). A princípio, a Liga Espartaquista foi agregada aos quadros do PSDI, mantendo seu próprio programa político e organização interna, mas a situação mudaria radicalmente após a eclosão da Revolução Alemã em 1918.
A Revolução Alemã
A derrota alemã na Primeira Guerra Mundial ensejou uma série de sublevações militares que acabaram por resultar na abdicação do imperador Guilherme II e na abolição da monarquia.
O SPD havia ajudado a orquestrar o levante, obtendo o poder provisório, mas temia que a revolta evoluísse para uma revolução socialista, com a criação de conselhos de trabalhadores de inspiração bolchevique (os sovietes).
Os sociais-democratas preferiram então se aliar aos liberais e conservadores e reintegrar as oligarquias em uma república parlamentarista, liderada por Friedrich Ebert. O PSDI aceitou integrar o novo governo. Defendendo a revolução, a Liga Espartaquista abandou a legenda.
Em meio às disputas e a contragosto do governo alemão, Rosa Luxemburgo foi libertada. Ela logo se reuniu com Karl Liebknecht, também recentemente libertado, e deu início à agitação popular, insuflando as massas a apoiarem a revolução socialista. Para difundir os ideais revolucionários, os dois lançaram o jornal “Bandeira Vermelha“.
Em dezembro de 1918, Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht fundaram o Partido Comunista da Alemanha. Ao mesmo tempo, a esquerda radical reunida no Primeiro Congresso Soviético Alemão emitiu nota exigindo o afastamento de Paul von Hindenburg do comando das forças armadas, a dissolução do exército e sua substituição por uma guarda civil.
Em 5 de janeiro de 1919, a Divisão Popular da Marinha, unidade militar simpática ao ideário comunista, tomou a sede do jornal Vorwärts, órgão oficial de imprensa do SPD, e ameaçou atacar a sede da chancelaria. Lideranças vinculadas ao Congresso também organizaram uma greve geral em Berlim, que logo obteve a adesão massiva dos servidores, prejudicados por sucessivos atrasos salariais.
O Levante Espartaquista e o assassinato de Rosa Luxemburgo
Os líderes da greve em Berlim declararam que tinham por objetivo a derrubada do governo social-democrata. A ideia, entretanto, sofria forte resistência na cúpula do Partido Comunista, onde predominava a avaliação de que o movimento não possuía condições de sustentar uma insurreição contra as tropas governamentais.
Luxemburgo compartilhava da mesma impressão, asseverando que o contexto da Alemanha era muito distinto da Rússia durante a Revolução de Outubro e que, ao contrário dos bolcheviques, os comunistas alemães não possuíam uma base consistente no interior das forças armadas.
Outro obstáculo havia surgido: após receber apoio financeiro dos Estados Unidos, o SPD conseguiu realizar o pagamento dos salários atrasados, desmobilizando a maior parte dos trabalhadores que estavam participando da greve geral.
A despeito das condições desfavoráveis, Liebknecht e outros dirigentes comunistas insistiram que a Liga Espartaquista deveria manter o apoio ao levante. Mesmo discordando da ideia, Luxemburgo se comprometeu a apoiar a insurreição.
O Levante Espartaquista irrompeu em Berlim, em 5 de janeiro de 1919. Os revolucionários ocuparam jornais e prédios públicos, formaram milícias e conclamaram os trabalhadores a apoiarem a revolta. Mas, como havia sido previsto por Luxemburgo, a adesão popular foi baixa. Para piorar a situação, o levante carecia de um plano estratégico e de uma liderança clara, ficando em grande parte dependente da improvisação.
O governo social-democrata de Friedrich Ebert reagiu violentamente, mobilizando as tropas do exército e os Freikorps (grupos paramilitares de extrema-direita) para esmagar a insurreição. Sem apoio militar significativo, os rebeldes seriam massacrados durante a chamada “Semana Sangrenta”, que deixou centenas de mortos.
No dia 15 de janeiro, Luxemburgo e Liebknecht foram capturados e levados ao Hotel Eden, em Berlim, onde foram interrogados e torturados pelo capitão Waldemar Pabst e pelo tenente Horst von Pflugk-Harttung. Por ordens do Ministro da Defesa alemão, Gustav Noske, os dois foram executados sumariamente.
Liebknecht foi fuzilado e teve seu corpo jogado em uma área próxima ao zoológico de Berlim. Rosa Luxemburgo foi assassinada com um tiro na cabeça, disparado por Kurt Vogel ou Hermann Souchon. Seu corpo foi lançado no Canal Landwehr, sendo resgatado somente vários meses depois.
O assassinato de Rosa Luxemburgo causou grande comoção entre socialistas e comunistas. A repressão violenta contra os Espartaquistas enfraqueceu e fragmentou a esquerda alemã e gerou divisões insanáveis entre os sociais-democratas e comunistas o que, aliado à fragilidade da República de Weimar, facilitaria a ascensão do nazismo nas décadas seguintes.