O ambiente da radiodifusão no Brasil é marcado pela forte presença de emissoras comerciais, com pouco espaço para a comunicação pública e comunitária e com regulação deficiente, segundo a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura). A instituição divulgou ontem (17/03) o estudo O Ambiente Regulatório para a Radiodifusão: Uma Pesquisa de Melhores Práticas para os Atores-Chave Brasileiros, com sugestões para subsidiar a discussão nacional de um novo marco regulatório para as telecomunicações.
A Unesco compara a realidade da radiodifusão brasileira com a de países como os Estados Unidos, a França, o Reino Unido e a África do Sul. Também faz recomendações de mudanças na legislação com base em experiências e modelos bem-sucedidos, desde o sistema de concessões até a gestão de conteúdos.
“O Brasil é um país grande e diverso, atendido por muitos serviços diferentes de rádio e televisão, mas esses serviços se desenvolveram na ausência de uma política de radiodifusão clara e abrangente. Os protagonistas desse setor consolidaram um sistema que atende prioritária e preferencialmente a suas necessidades e propósitos”, aponta o estudo, de autoria dos pesquisadores Toby Mendel e Eve Salomon.
A Unesco sugere mudanças que vão desde a reconfiguração das autoridades de regulamentação dos serviços de radiodifusão ao fim da prerrogativa do Congresso Nacional de decidir sobre as outorgas e a renovação de concessões públicas de rádio e TV.
No documento, elaborado após pesquisas, visita ao Brasil e debates com o governo e a sociedade civil, a Unesco compara o sistema regulatório de telecomunicações a um “labirinto”. A regulação é feita por pelo menos nove organizações, entre elas os ministérios das Comunicações e da Justiça, o Ministério Público Federal e o Conar (Conselho de Autorregulamentação Publicitária).
O processo, segundo a Unesco, poderia ser concentrado em uma única autoridade reguladora. Ao novo órgão caberiam, entre outras, as funções de administrar os processos de concessões de licenças, criar padrões de qualidade e estabelecer e aplicar sanções aos concessionários que desrespeitassem a legislação.
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Até a análise e outorga de concessões – que hoje é feita pelo Congresso Nacional – o processo passaria para a competência do órgão regulador, após mudanças na legislação para tirar do Poder Legislativo essa prerrogativa. O atual modelo de concessões, de acordo com a organização da ONU, é lento e não tem critérios claros. “As regras do licenciamento devem conter exigências quanto ao cumprimento de padrões de conteúdo. Os padrões básicos devem ser estabelecidos por lei”, recomenda o texto.
Entre as sugestões para a regulação de conteúdo estão questões polêmicas e que vão de encontro aos interesses comerciais do setor, como a exigência de cotas de programação nacional e local, inclusive no horário nobre.
A Unesco reconhece que há no setor de radiodifusão o interesse pela autorregulamentação – sem interferência do governo, e com a criação de regras e códigos de conduta e sistemas independentes para lidar com queixas e reclamações. Mas, mesmo nesse cenário, algumas condições devem estar previstas na lei, como a exigência de apresentação de notícias “exatas e imparciais” e de identificação clara dos conteúdos de opinião, que devem ser separados dos noticiários.
As cotas mínimas na programação sugeridas pela Unesco, de 50% de produção doméstica – sem considerar nesse cálculo notícias, esportes, jogos e publicidade – e de 10% para produção independente, serviriam com estímulo à indústria audiovisual nacional e tornariam os serviços mais diversificados.
Outra saída para tornar o ambiente de radiodifusão brasileiro mais plural é investir na comunicação pública, na avaliação da Unesco. “O financiamento é crucial para a capacidade das emissoras públicas de contribuir para a qualidade da diversidade, indo além da programação oferecida pelas emissoras comerciais”. No entanto, no Brasil, segundo constataram os pesquisadores, a radiodifusão pública é um setor ainda pouco desenvolvido.
Entre as recomendações para o setor público, a Unesco sugere a destinação de mais recursos para a Empresa Brasil de Comunicação (EBC), mas alerta para a necessidade de fortalecimento da independência da empresa em relação ao governo.
“A alocação de recursos para a EBC, ou para alguma outra radiodifusora pública que contemple suas funções, deve ser expandida significativamente para que esse setor possa desempenhar um papel mais importante na ecologia brasileira da radiodifusão.”
A lista de recomendações da Unesco para a reforma da legislação da radiofusão no Brasil também inclui a ampliação de espaço no espectro de frequência para emissoras comunitárias, o fortalecimento de regras para evitar a propriedade cruzada (concentração do controle de um mesmo ramo empresarial sobre um conjunto de veículos de comunicação, como emissoras de rádio e TV, agências de notícias e jornais) e a maior transparência no processo de transição para tecnologia digital.
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