Porta de entrada para o mercado europeu e advogado de um assento brasileiro permanente no Conselho de Segurança da ONU, Portugal é o primeiro destino de Dilma Rousseff na Europa. O país tem no Brasil e no Mercosul um trunfo para potencializar as exportações, um caminho para sair da pior crise que colocou Lisboa à beira do FMI.
A visita, de terça-feira (29/03) à quarta, também deve servir para que Dilma se encontre com o governo, que pediu demissão na última quarta, mas também com as lideranças de oposição, que pode assumir o poder até julho. Embora não exista uma reunião formal, a expectativa é que isso ocorra durante jantar oferecido pelo presidente português.
O ex-presidente Lula, que estará na viagem com Dilma, receberá o título de doutor honoris causa da Universidade de Coimbra – honraria concedida anteriormente a Juscelino Kubitschek e Fernando Henrique Cardoso.
Questionado, o embaixador brasileiro em Portugal, Mário Vilalva, confirma que a abstenção brasileira na votação no Conselho de Segurança sobre a intervenção estrangeira na Líbia deve constar da agenda. “Nós não convencemos, apenas procuramos explicar as razões das nossas posições, ou dos nossos votos e Portugal faz a mesma coisa”, diz. O país europeu é membro fundador da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), que comanda a intervenção – e, segundo Vilalva, temas internacionais dominaram a visita do Ministro de Negócios Estrangeiros português, Luís Amado, ao Brasil, em fevereiro.
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Para Thiago Carvalho, do IPRI (Instituo Português de Relações Internacionais), o fato de Portugal e Brasil ocuparem atualmente assentos rotativos no Conselho de Segurança pode ajudar a viabilizar a candidatura brasileira a uma vaga permanente a médio prazo. “Uma maior capacidade de ação internacional do Brasil é algo favorável aos interesses de Portugal. Contudo, as duas diplomacias sabem que dificilmente isso ocorrerá a curto prazo”, afirma.
Para o ex-ministro das Relações Exteriores e conselheiro do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI), Embaixador Luiz Felipe Lampreia, o assento permanente terá menor importância na visita. “Isso já foi objeto de declarações do governo português (em janeiro, pelo premiê José Sócrates), não é um assunto pendente.”
A aproximação entre Brasil e a OTAN tendo em vistas a segurança do Atlântico Sul deve ficar e fora. No fim do ano passado, o ministro da Defesa brasileiro, Nelson Jobim, reagiu à declaração de seu homólogo português, Augusto Santos Silva, de que a Aliança deveria prestar mais atenção ao sul. Vilalva trata a rusga como um mal-entendido. “Nós sempre promovemos a existência de uma zona desmilitarizadas no Atlântico sul. Portanto não faria sentido que o Brasil estivesse cooperando com uma aliança cuja principal característica é ser militar.”
Comércio
Embora o fluxo comercial tenha praticamente triplicado desde 2001, Portugal continua a responder por menos de 1% das exportações (0,7%) e importações (0,3%) brasileiras. Mais de 60% do que o Brasil vende são produtos básicos ou semi-manufaturados – principalmente petróleo e derivados, soja, açúcar e milho. No sentido inverso, o destaque são azeite, vinho, bacalhau e pêra. Os dados são do Ministério do Desenvolvimento do Brasil (veja gráfico abaixo).
Como o mercado português é relativamente pequeno – a população brasileira é quase 20 vezes maior –, Dilma deve pisar em Lisboa com a comunidade europeia em mente. De acordo com o Eurostat – órgão de estatísticas da UE –, o país respondeu por 1,7% das importações feitas pelos países da zona euro em 2009, fatia que pouco cresceu desde 1999, quando foi de 1,5%. Para Lampreia, ampliar o acesso ao mercado europeu de açúcar precisa ser um tema abordado na agenda da presidente.
“Portugal tem como estratégia entrar na América do Sul por meio do Brasil”, diz Chrysostomos Tabakis, professor assistente da Faculdade de Economia e Negócios da Universidade Nova de Lisboa. Com o FMI cada vez mais próximo de intervir na economia portuguesa, o que deve diminuir o consumo interno, a exportação se torna uma alternativa ainda mais atraente para estimular a economia.
Para Carvalho, do IPRI, os investimentos bilaterais também estarão na pauta da visita. Segundo Lampreia, operações triangulares com países africanos de língua portuguesa (os Palops) nas áreas de bancária, de construção civil e comércio, vão constar nas negociações
O Brasil, um dos cinco principais destinos do investimento externo direto português, vem ampliando a injeção de capitais em Portugal (veja gráfico abaixo). “É de esperar que algumas empresas brasileiras da indústria pesada continuem a apostar em Portugal como meio de entrada no mercado europeu”, diz Rosa Forte, professora auxiliar e membro do Centro de Economia e Finanças da Universidade do Porto. No caminho inverso estão os setores de energia , extração de petróleo e combustíveis alternativos.
Segundo Vilalva, a área comercial da embaixada em Portugal tem se voltado principalmente a esse filão. “O que nós estamos procurando fomentar mais são os investimentos mútuos”, diz o embaixador. “Estamos estimulando as empresas brasileiras a se instalar em Portugal com vistas ao mercado português, mas também ao mercado da União Europeia.”
Já o Brasil poderia se beneficiar de parcerias que resultassem em entradas de capitais ibéricos de prazo mais longo e menos especulativos, diz Edward Hugh, macroeconomista, pesquisador e blogueiros inglês baseado na Espanha.
Cenoura brasileira
Para Hugh, o Brasil pode aproveitar a oportunidade da crise econômica para se capitalizar no cenário internacional. “Apoiar a União Europeia a estabilizar sua periferia é uma oportunidade importante. Começando por Portugal, melhor ainda”, diz o economista. “A saída (da crise) pode ser pelo porrete ou pela cenoura. A Alemanha está aplicando o porrete. O Brasil pode oferecer a cenoura.”
Segundo Vilalva, esse auxílio tem sido feito por meio da facilitação de mecanismos de cooperação comercial. A compra de títulos da dívida portuguesa – assunto tratado em uma reunião entre o ministro das Finanças português e o da Fazenda brasileiro em dezembro – não estará oficialmente na agenda. “O Banco Central, é absolutamente autônomo, independente do governo, no que diz respeito a essa matéria”, afirma.
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