O governo do presidente eleito do Peru, Ollanta Humala, tem tudo para ser marcado pela influência feminina. Isso porque três mulheres figuram como peças-chave na futura administração do nacionalista peruano, que assume em 28 de julho. São elas a vice-presidente eleita do Peru, Marisol Espinoza; a esposa de Humala e fundadora do Ganha Peru, Nadine Heredia e a jovem deputada eleita por Cusco, Veronika Mendoza.
Espinoza , de 43 anos, ex-jornalista e mãe de uma pré-adolescente, encabeça a comissão de transição de governo e, durante o giro pelos países da América do Sul feito presidente eleito, já assumiu a representação de Humala, como ocorrerá quando ocupar o cargo de vice-presidente. A parlamentar ingressou na política com Humala em 2006, convidada quando era editora do principal jornal de Piura – departamento (estado) no norte do país –, onde informava sobre os problemas enfrentados entre comunidades e mineradoras. Além disso, foi uma das poucas congressistas que desempenharam funções de fiscalização durante o governo de Alan García – ela declarou que pretende continuar com esse trabalho com Humala.
Opera Mundi
De cima para baixo, as mulheres de Humala: Nadine Heredia, Marisol Espinoza e Veronika Mendoza
Um membro da equipe técnica do chamado “mapa da estrada” do Ganha Peru disse que Espinoza conta com a confiança de Humala, já que ele a incumbiu de dirigir a equipe de transição. O próprio candidato afirmou em uma entrevista para a rede multiestatal TeleSur que seu novo gabinete terá “uma importante porcentagem de mulheres e independentes”, que serão pessoas “com experiência e conhecimento da pasta que vão assumir”.
Consultada pelo Opera Mundi sobre a origem dos valores que guiam seu trabalho legislativo, Espinoza explicou que, por ser jornalista, conheceu o trabalho dos comuneros (camponeses) e ronderos (espécie de guardas comunitários) das províncias de Ayabaca e Huancabamba – em Piura –, que procuravam soluções para os problemas de desenvolvimento produtivo e tomavam decisões em assembleia, organizados. “Aprendi sobre essa luta porque eles se fizeram visíveis e respeitados”, afirmou. “Interessa-me conhecer quem eu defendo, ou seja, aqueles que não têm direito à saúde, ao trabalho e à vida”, disse Espinoza.
Sobre o trabalho de Nadine Heredia, Espinoza observou que ela é “um membro ativo do Ganha Peru e tem a seu cargo a comissão de relações exteriores”, mas, além disso, é o apoio do candidato como esposa e sua conselheira com sua experiência de comunicadora.
A secretária executiva da Coordenadoria Nacional de Direitos Humanos, Rocio Silva Santisteban, pesquisadora de questões sobre gênero, observou que Heredia “suaviza a imagem de Ollanta Humala, mas, ao mesmo tempo, é uma mulher moderna, uma profissional com três filhos”. A imagem da mulher para Humala não é tradicional: “A mãe foi uma militante aguerrida do Partido Comunista”, lembrou a acadêmica e ativista.
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Para o sociólogo Javier Díaz Albertini, professor da Universidade de Lima e ex-chefe e mentor de Heredia durante cinco anos em pesquisas sobre liderança e políticas de desenvolvimento quando ela trabalhou no meio acadêmico, ela tem as credenciais necessárias para trabalhar junto ao marido. “É uma pessoa muito capaz. Pouco a pouco entrou no mundo das ONGs, na consultoria e era uma sócia júnior no trabalho”, afirmou.
“Pensando no próximo governo, a posição de primeira-dama será um flanco de ataque fácil ao marido. Acredito que, com sua experiência de trabalho em desenvolvimento e sociedade civil, ela pode contribuir com projetos alternativos e não de caridade. No Peru, as percepções ainda não mudaram e circulam rumores de que ela manda nele: é um casal presidencial que fica sob a lupa depois de eleições muito disputadas, com uma série de emoções e que deixaram alguns na corda bamba”, explicou Díaz Albertini. Para o ex-chefe de Heredia, sua experiência lhe permitirá envolver-se na busca de fundos para projetos de desenvolvimento.
A imagem de Heredia na política peruana levou na semana passada o congressista governista Jorge del Castillo a apresentar um projeto de lei para impedir que os cônjuges dos presidentes se candidatem quando o mandato terminar.
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Heredia nasceu em 1976 e estudou Ciências da Comunicação na Universidade de Lima. Depois, fez mestrado em Sociologia na Universidade Católica e, como o marido, doutorado em Ciências Sociais em Paris. Na França, quando Humala era adido militar do Peru, os dois conheceram outra jovem, que convidaram a juntar-se a seu projeto político, o Ganha Peru. Veronika Mendoza, de Cusco, filha de pai cusquenho e mãe francesa, cursava mestrado em educação bilíngue intercultural.
Mendoza também estudou Psicologia e outro mestrado em ensino de espanhol como segunda língua e trabalhou em Cusco em projetos de educação bilíngue com ONGs. Consultada pelo Opera Mundi, a congressista eleita disse que, no início da campanha eleitoral, deu prioridade a assuntos como a reivindicação das culturas locais e o acesso à educação, mas agora é muito importante em Cusco “o tema ambiental: o Peru e Cusco são vítimas de concessões indiscriminadas de seu território, sem consulta”.
“Por exemplo, a província de Chumbivilcas, em Cusco, concedeu 93% de seu território a empresas. E o território para criar seu gado e plantar? A lei de organização territorial indica que o zoneamento econômico/ecológico deve ser respeitado quando há projetos de investimento que desmatam o território a partir de Lima sem consulta, nem verificação do potencial produtivo da região”, disse.
Na opinião da socióloga peruana Anahi Durand, para que o governo de Humala “assuma uma política clara a favor dos direitos das mulheres e da equidade de gêneros”, os “setores feministas mobilizados a favor dele” devem superar o distanciamento dos setores populares. Ela observou ainda que o partido deveria dar “maior presença pública às mulheres, pois, à exceção de Aida García Naranjo, Marisol Espinoza e Nadine Heredia, não há muitas outras líderes, o que também se reflete na equipe de transição, onde a masculinidade predomina, com 16 homens e apenas duas mulheres”.
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