Software brasileiro analisa matrimônio entre indígenas na América do Sul
Software brasileiro analisa matrimônio entre indígenas na América do Sul
As culturas regulam suas práticas matrimoniais com base em costumes e crenças ou em uma série de variáveis, como demografia ou interesses políticos. Mas cada casamento é determinado também por fatores anteriores, que definem possibilidades e impossibilidades matrimoniais em uma sociedade.
Esse é o ponto de partida de um estudo desenvolvido por Márcio Ferreira da Silva, professor do Departamento de Antropologia da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas) da USP (Universidade de São Paulo), com apoio da FAPESP por meio da modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular.
A pesquisa, intitulada "A aliança de casamento na América do Sul tropical: estudo de duas redes empíricas", teve por objetivo compreender a complexa rede formada pelas relações de parentesco e resultou no desenvolvimento de uma ferramenta computacional capaz de auxiliar no entendimento.
Para o estudo, foram utilizados dois sistemas de aliança de casamento, o dos waimiri-atroari, localizados nos estados de Roraima e Amazonas, e o dos enawenê-nawê, no Mato Grosso.
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Silva conta que as duas populações indígenas pesquisadas possuem diferentes regras matrimoniais. Os waimiris permitem o casamento entre primos, já os enawenês, apesar de não formularem qualquer tipo de prescrição, proíbem o casamento entre membros de um mesmo clã ou entre parentes muito próximos de clãs distintos.
“Todos os povos fazem regras para a vida matrimonial e sexual. O sistema adotado pelos enawenês, por exemplo, lembra o Código Civil brasileiro, que não permite o casamento entre parentes consanguíneos próximos”, disse à Agência FAPESP.
Empenhado em entender o modo pelo qual esses povos moldam suas relações de parentesco de diferentes formas, o pesquisador desenvolveu, ao lado de João Dal Poz Neto, professor da UFJF (Universidade Federal de Juiz de Fora), o programa de computador MaqPar (acrônimo de “máquina do parentesco”). Poz Neto contou com apoio da Fapemig (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais).
O mecanismo do programa consiste em encontrar, em redes, os anéis matrimoniais, as relações reais de parentesco entre cônjuges de uma determinada rede, que se multiplicam a cada novo casamento.
Os pesquisadores fizeram uma varredura na rede de parentesco por lotes e organizaram os anéis matrimoniais encontrados, cada um deles acompanhado de um conjunto de parâmetros que permite medir, calcular e classificar os fenômenos manifestados.
Nas duas populações ameríndias estudadas, o casamento de fato só começa após o nascimento da primeira criança, segundo Silva. A coabitação de um casal, com vida sexual ativa e obrigações econômicas recíprocas, pode mudar caso a mulher não dê à luz.
Além do amor e afinidades, uma série de variáveis interfere na formação de laços familiares. Demografia, história, padrão de preferência matrimonial, estratégias familiares e individuais, interesses econômicos e políticos, paixões e gostos pessoais são alguns dos elementos que, ao interagirem entre si, formam as estruturas de parentescos.
“Para se ter ideia da complexidade, a rede waimiri-atroari analisada pela MaqPar contém apenas 245 indivíduos, incluindo crianças. Nessa rede, foram encontrados 33.160 anéis matrimoniais. Quando uma mulher se casa com um homem da mesma tribo indígena, por exemplo, e ela tem uma irmã que se casa com o irmão dele, eles não se casam com parentes, mas sim como parentes”, disse.
“Há diversos tipos de mecanismos de fechamentos de anéis e esse é apenas um deles. Os anéis fazem as múltiplas interconexões entre as pessoas e as famílias, ou seja, fazem uma aliança entre os segmentos familiares, conectando as famílias a cada casamento”, explicou.
Na rede dos enawenê-nawês, com 734 indivíduos, o número de anéis matrimoniais encontrados e analisados pelo programa MaqPar subiu para 81.079.
“Esse sistema de anéis matrimoniais, além de novo, é dinâmico e se desenvolve no tempo, pois a cada casamento uma rede é formada e, quando alguém morre, ela é alterada”, disse o professor da FFLCH-USP.
“O software MaqPar é de uso livre e está à disposição de todos os interessados em testá-lo no endereço http://maqpar.zip.net, com a senha de visitação ‘maqpar’”, disse Silva.
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'Você dorme sem saber se vai acordar', declara palestino-brasileira sobre situação em Gaza
Mais um grupo de repatriados de Gaza chega ao Brasil, desta vez com 48 pessoas a bordo
"Bombardearam nossa casa, ficamos sem comida e sem um lugar fixo para morar", definiu Yasmenn Rabee, palestino-brasileira repatriada da Faixa de Gaza, sobre a situação na Palestina. Ela chegou à Brasília na madrugada desta segunda-feira (11/12) com outras 47 pessoas que conseguiram autorização para deixarem a região de conflito.
Yasmeen é irmã de Hasan Rabee, conhecido por relatar o cotidiano dos brasileiros e parentes palestinos que tentavam repatriação ao Brasil no início de novembro. Perguntada sobre a situação em Gaza, a principal zona de ataques, ela se emocionou. "A situação é terrível, você dorme sem saber se vai acordar. Perdi muitos amigos, minha tia e os filhos dela", relatou.
A aeronave KC-30, da Força Aérea Brasileira (FAB), decolou do Cairo, capital do Egito, às 19h03 (hora local) de domingo (10/12) e pousou às 3h47 na Base Aérea de Brasília, onde o grupo foi recebido por autoridades brasileiras. Foram cerca de 15 horas de voo.
O grupo é formado por 48 pessoas, sendo 11 com dupla cidadania (Brasil-Palestina) e 37 palestinos, parentes de cidadãos brasileiros. São 27 crianças e adolescentes, 17 mulheres, incluindo duas idosas, e quatro homens adultos. Uma jovem de 22 anos que já estava no Egito se juntou aos resgatados de Gaza e embarcou neste mesmo voo. Ela é filha de uma das integrantes do grupo de repatriados em Gaza.

Antônio Cruz/Agência Brasil
Avião da FAB pousou em Brasília às 3h47 com 48 pessoas a bordo
No último sábado (09/12), eles receberam autorização para cruzar a fronteira de Rafah, no sul de Gaza, em direção ao Egito, de onde seguiram de ônibus até o Cairo. Na capital egípcia, foram recebidos por diplomatas brasileiros na capital do país e embarcaram para o Brasil.
Segundo o Itamaraty, da lista de 102 pessoas enviada pelo Brasil às autoridades israelenses, 24 não tiveram autorização para cruzar a fronteira, incluindo sete palestino-brasileiros. A maioria dos barrados é de homens. O governo brasileiro não soube informar o motivo de eles terem sido impedidos, por Israel, de atravessar a fronteira. No momento, segundo o Palácio do Planalto, não há previsão de novo voo de repatriação.
"Em um primeiro momento, eles ficarão de dois a três dias em Brasília. A primeira etapa é do apoio psicológico, de imunização, de estabelecer contato com familiares e parentes e a questão da documentação. Alguns vão para as casas de familiares e amigos. Os que estiverem sem referência serão abrigados no Sistema de Assistência Social em instituições em que tenham todo o apoio de acolhimento e alimentação. Um suporte para reconstituírem a trajetória, já que vêm de situação bastante complexa", afirmou o secretário nacional de Assistência Social do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), André Quintão.
Desde o início da guerra de Israel contra a Palestina, em outubro, o governo brasileiro já retirou 1.524 brasileiros e palestino-brasileiros da Faixa de Gaza e de cidades israelenses, incluindo 53 animais domésticos. No total, a FAB já realizou 11 voos de repatriação por meio da Operação Voltando em Paz.
(*) Com Agência Brasil