Cansadas do descaso das autoridades, um grupo de mulheres do município colombiano de Barbacoas, no estado de Nariño, iniciou em junho uma greve de sexo em protesto contra as péssimas condições das estradas na localidade, no sudoeste da Colômbia. Com o “movimento das pernas cruzadas”, elas finalmente conseguiram chamar a atenção da imprensa e do governo.
Revista Semana
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“Era 2008 quando vi uma moça de 23 anos morrer com o filho ainda no ventre. Ela não conseguiu chegar a tempo ao hospital de Pasto, morreu em meio ao barro acumulado na estrada”, lembrou com tristeza a juíza Marybell Silva, responsável pela cidade de Barbacoas. “Naquele momento”, contou ao Opera Mundi, “decidi agir”.
Da casa de Marybell até Junin, o povoado mais próximo, são somente 57 quilômetros. Mas, para percorrer o caminho, as pessoas levam até 15 horas, pois a estrada – construída em 1848 – nunca foi melhorada. “É incrível. Já não há buracos, mas lagoas que se enchem de água quando chove, fazendo com que os carros fiquem atolados. E aqui chove todos os dias”, contou Marybell.
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A juíza e os moradores de Barbacoas começaram a protestar em 2008 e por anos pediram a pavimentação da única via de acesso ao município. “Em nenhum outro lugar do país existe uma situação assim”, disse Marybell. Porém, só quando decidiram criar o “movimento das pernas cruzadas” — em 22 de junho — que os meios de comunicação começaram a prestar atenção no problema.
“Ao todo, 300 mulheres estão de pernas cruzadas, porque essa é uma forma de protestarmos. Não vamos fazer sexo até que a estrada seja construída”, acrescentou a juíza. “Como estamos próximos ao Oceano Pacífico, onde se diz que as mulheres e os homens são muito calientes, decidimos fazer algo que geraria impacto e que afetaria os homens, que sempre foram muito passivos com relação à realidade de Barbacoas.”
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Entre os homens da cidade, que em sua maioria vive da mineração e da pesca, as reações foram variadas: alguns ficaram com raiva, outros se mostraram solidários e uma parcela propôs uma alternativa radical: iniciar uma greve de fome. “Melhor não comer do que ficar sem sexo”, disseram. A melhoria da estrada permitiria também aos trabalhadores vender seus produtos em cidades próximas e economizar com o custo da alimentação, pois o transporte de alimentos é 10 vezes mais caro. Uma dúzia de ovos custa 25 mil pesos (14 dólares) em Barbacoas, enquanto em Junín vale seis mil (três dólares).
Promessas
O Invia (Instituto Nacional de Vias) encarregou o terceiro batalhão de engenheiros em 2010 de melhorar a estrada antes de julho desse ano, mas nada aconteceu em Barbacoas – ninguém viu máquinas ou operários.
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Para piorar a situação, em Nariño há intensos confrontos entre as guerrilhas e o exército. Na zona confluem o ELN (Exército de Libertação Nacional), as Bacrim (paramilitares) e a frente 29 das FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). Somente em julho, 300 pessoas fugiram da região por razões ligadas ao conflito.
Todos os dias as mulheres – com camisetas brancas e fotos dos mortos na estrada – se reúnem no centro da cidade e protestam pacificamente. Segundo elas, seria uma loucura trazer mais crianças para o mundo de hoje, nessas condições. “Para que morram no caminho para o hospital?”, questionam.
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