Dizem que os dicionários surgiram na Mesopotâmia no ano 2600 a.C, com a escrita cuneiforme. Tentavam dar conta de explicar divindades, profissões e objetos usuais. No final da Idade Média ganharam ordem alfabética e a ideia de abarcar a totalidade dos termos linguísticos utilizados no cotidiano. Da mesma maneira que os dicionários, o vinho evoluiu da antiguidade aos nossos dias, ganhou sabores, aromas, texturas e um mercado ávido por novidades.
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Imagem de Dicionário Ilustrado do Vinho do Porto mostra uma garrafeira em Portugal
Com diferença de poucos meses chegaram ao mercado dois dicionários complexos: Dicionário Ilustrado do Vinho do Porto (Editora de Cultura, 575 páginas, R$ 90,00) e o Dicionário do Vinho (IBEP-Nacional, 592 páginas, R$ 119,90). Os dois tem mais ou menos o mesmo tamanho e um objetivo comum: dar sentido e ordem a um admirável mundo novo, o do vinho, em que as garrafas cheias de um líquido precioso viajam pelos mais remotos cantos do planeta, carregando gostos e culturas.
O Dicionário do Vinho, de Mauricio Tagliari e Rogério Campos, se aventura num campo quase minado, porque penetra na controvérsia das definições e termos ligados ao vinho a partir de uma perspectiva, de certo modo, “neutra”. Por reunir conhecimentos de diversos países produtores, este é o primeiro dicionário transnacional do gênero no mundo, e os dois connoisseurs acertaram em pensar que um livro deste tipo teria de ser feito no Brasil, país independente numa guerra em que combatem beaujolais (“vinho tinto produzido na região de Beaujolais, a partir da uva gammy […]”) e barolos (“vinho de categoria DOCG produzido na região do Piemonte a partir da uva nebbiolo […]”), reichensteiners (“uva branca cultivada na Alemanha, na Nova Zelândia e na Grã-Bretanha que produz um vinho branco neutro, com pouca acidez e aromas delicados […]”) e chardonnays (‘uva branca muitíssimo cultivada no mundo inteiro, conhecida principalmente por ser a base do Borgonha branco e fazer parte do corte do champanhe […]”).
Sem preconceitos, cujo tom eu, editora e leiga, achei particularmente acertado, já que gosto de vinhos controversos e óbvios, como espumantes ou roses, beaujolais e pinnots noirs, e bastante explicativo, é um dicionário para se guardar e consultar por anos. Talvez para uma próxima edição, algumas ilustrações, mapas e gráficos poderiam deixar mais claras as informações. E talvez, muito talvez, o papel couchê poderia ser mudado, já que na eventualidade de um acidente perto de um copo ou garrafa pode estragar completamente o livro. Mas são apenas sugestões.
Já Manuel Pintão e Carlos Cabral, com o Dicionário Ilustrado do Vinho do Porto, optaram por verbetes mais históricos. Contam sobre casas produtoras de vinho do porto no começo do século, reproduzem rótulos, dissertam sobre exposições.
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Nunca é demais lembrarmos que o vinho do porto foi responsável por tentar segurar a balança comercial portuguesa em momentos de especial dificuldade, como a que resultou no tratado de Methuen, de 1703. Nele, Portugal se comprometia a consumir têxteis ingleses, e os ingleses comprariam vinhos portugueses (nem é preciso dizer o desastre que foi o acordo para Portugal, ainda hoje um país desindustrializado dependente de sua produção agrícola numa Europa em crise).
As ilustrações do Dicionário Ilustrado do Vinho do Porto são lindas e os verbetes, ainda que não tenham sido feitos para serem lidos de A a Z, recontam a história de Portugal. E conhecer, ou melhor, reconhecer, a história portuguesa por meio do vinho do Porto é muito mais que uma metáfora, é quase entender um povo.
Serviço:
Dicionário Ilustrado do Vinho do Porto
Autor: Manuel Pintão e Carlos Cabral
Editora: Editora de Cultura
Número de páginas: 565
Dicionário do Vinho
Autores: Maurício Tagliari e Rogério Campos
Editora: Companhia Editora Nacional
Número de páginas: 572
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