A abertura dos olhos do Brasil para o outro lado do Atlântico não se limita à abertura de embaixadas e acordos comerciais. Em mais um esforço para alargar as relações diplomáticas e a cooperação com a África, após a guinada nas relações Sul-Sul iniciada pelo governo do presidente Lula, o Ministério das Relações Exteriores intensificou a ajuda na formação de diplomatas de países africanos.
O diretor do Instituto Rio Branco, embaixador George Lamazière, responsável pela seleção e treinamento de diplomatas brasileiros, afirma que o país tem “tradição” no ensino da diplomacia. Lamazière disse ao Opera Mundi que o Brasil atualmente atua em duas modalidades de cooperação: a mais tradicional são as bolsas de estudos no Instituto Rio Branco, em Brasília, concedidas, em sua maioria, a estrangeiros de países de língua portuguesa.
Já um segundo tipo de cooperação mais recente é o Curso para Diplomatas Africanos oferecido pela Fundação Alexandre de Gusmão, ligada ao Itamaraty, e que está na sua segunda edição. Ministrado no Rio de Janeiro, o curso tem diplomatas de países como África do Sul, Botsuana, Gana, Namíbia, Nigéria, Quênia, Sudão, Sudão do Sul, Tanzânia, Zâmbia e Zimbábue.
Leia mais:
Patriota chega amanhã à Turquia para preparar visita de Dilma
Com Lula, Portugal chama empresários brasileiros para participar de privatizações
Chávez pede que países do Bric e da Alba rechacem 'barbárie' na Líbia
Patriota tratará situação do norte da África em visita ao Marrocos
Relações cordiais
A jovem diplomata angolana, Isabel Patrícia Ribeiro, de 28 anos, única representante seu país e do mundo lusófono, aproveita a iniciativa brasileira a fim de “recolher experiências”. Isabel Ribeiro é a terceira secretária da direção de cooperação bilateral no departamento África, no Ministério das Relações Exteriores de Angola e destaca que Angola e Brasil são “países irmãos”.
“Um país que passou por guerras precisa de parceiros, não vejo isso uma invasão. Precisamos de parcerias para melhorar nossa economia, infraestrutura e comércio. Tem que haver uma abertura para o país poder desenvolver”, defendeu.
O diplomata sulafricano Bernard Kaporo Legoti, que trabalha no departamento do Brasil do Ministério de Relações Exteriores na África do Sul, admitiu que veio ao país para também entrar em contato com outros diplomatas africanos e compreender a realidade de seus países vizinhos, mesmo estando do outro lado do Atlântico.
“É uma oportunidade de estarmos mais próximos e conversar sobre outros temas para melhorar e compartilhar ideias na diplomacia dos países africanos e ter também a chance de trocar pontos de vista com outros diplomatas africanos”, disse.
Na avaliação de Legoti, a cooperação Sul-Sul se dá de forma equilibrada. “Vejo as relações cordiais entre os países, especialmente entre o Brasil e a África do Sul. Nunca vi nenhum desequilíbrio no IBAS (bloco formado por Índia, Brasil e África do Sul). Não é apenas uma via de mão única do Brasil. Não há uma hegemonia de um único país nos emergentes”, analisou. O diplomata sul africano se refere aos programas brasileiros para a redução da pobreza como um dos destaques da contribuição do Brasil no continente.
Apoio
O Sudão do Sul é o mais novo país no mundo a ficar independente no dia 9 de julho deste ano e anunciou que vai pedir o apoio do Brasil para ajudar a mediar as negociações diplomáticas com o seu vizinho.
“O Brasil pode ajudar a negociar e servir como um parceiro de confiança para mediar de forma bastante neutra. Queremos aprender a parte prática da diplomacia, especialmente na guerra e na paz, como resolver problemas pelo uso da diplomacia em vez do uso da violência. O Brasil consegue conciliar os inúmeros partidos e interesses políticos e conservar, ao mesmo tempo, a diplomacia nacional sem tomar partido”, disse ao Opera Mundi o diplomata sul-sudanês James Padiet Angok, responsável pelo departamento de América do Sul do recém criado Ministério de Assuntos Estrangeiros e de Cooperação Internacional.
Além de não se intrometer nos assuntos de outros países, o Brasil não impõe a democracia a força, diz Angok. São esses alguns fatores que seduziram as autoridades do país africano que está agora em busca de construir a sua identidade nacional e estruturar a sua política externa. “Se há alguma mudança no governo e no regime, que isso não afete a diplomacia. É exatamente isso que queremos aprender com o Brasil”, afirmou Angok.
O Sudão do Sul já incluiu o Brasil na lista de um dos primeiros países que abrirá a sua embaixada, em 2012. O diplomata sul sudanês disse às autoridades diplomáticas brasileiras que quer o apoio do Brasil na estruturação do instituto diplomático de seu país. “Queremos aprender como eles traduzem seus valores no programa de treinamento e ensino dos diplomatas. Estamos criando o nosso novo instituto diplomático e descobrimos que o Brasil é um dos melhores quando o assunto é a prática diplomática”, defendeu.
África, a última fronteira
O professor
“O Brasil tem um capitalismo que não é irrelevante, e é um caminho natural, assim como países emergentes como a Índia e a China. O Brasil quer ampliar o seu raio de circulação econômica e de exportação do seu capital e também promover a internacionalização de suas empresas”, afirma Saraiva que, para ele, esta é uma novidade histórica do Brasil. Já existem cerca de 300 empresas que se instalaram e mantém relações comerciais com países africanos e, com exceção às grandes empresas como Odebrecht, Petrobras e Camargo Correa, a maioria é de médio porte. Isso é um número expressivo, destacou.
Para o analista, nas relações Brasil-África há uma história de oscilações com aproximações e recuos. “Há uma história que não começa no governo Lula, e sim na década de 1960 quando já houve um movimento de aproximação brasileira no período da criação dos Estados nacionais africanos”, lembrou. A retomada de investimentos brasileiros no continente ocorreu com o início do governo Lula, quando na época, o comércio exterior tinha uma balança de trocas comerciais de
Poder da China
A inserção da China, antes mesmo do despertar do Brasil para o continente, não deve ser comparada ao estilo brasileiro de fazer cooperação, discute Saraiva.
“A proporção do Brasil é diferente, o poder da China é superior. A China gera trocas comerciais com a África da ordem de 200 bilhões dólares, dez vezes mais que o Brasil com proporções e objetivos diferentes. Os chineses vão em busca de reservas minerais através de meios não muito moralmente aprovados”, analisa.
Para Saraiva, os chineses tratam a África como uma reserva estratégica para o seu desenvolvimento e para exportação de população. “A China tem muito menos limites legais, formais e morais para ir a África”, salienta.
Siga o Opera Mundi no Twitter
Conheça nossa página no Facebook
NULL
NULL
NULL