Em frente a uma praça lotada na cidade colombiana de Medellín – terra do célebre narcotraficante Pablo Escobar –, o candidato pelo Partido Verde Antanas Mockus convida seus apoiadores a repetir uma das mensagens de sua campanha: “Senhor Narcotraficante, a vida é sagrada, não troque sua vida por dinheiro.” Alguns repetem a frase em voz alta, enquanto outros o olham calado, talvez por estranharem que alguém lhes diga que a vida de um traficante tem valor.
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O lema da “legalidade democrática” de Mockus, que superou os 10% das intenções de voto em março e que divide atualmente o primeiro lugar com o ex-ministro da Defesa Juan Manuel Santos na disputa pela Presidência da Colômbia, pode adquirir, no entanto, sentidos menos cordiais, como se pode perceber nesta entrevista concedida ao Opera Mundi.
Manuel Rueda/Opera Mundi
Antanas Mockus é cercado por repórteres em escola de Medellín, Colômbia
“O Estado pode colocar vidas em risco para salvar a vida de outros”, afirmou Mockus ao ser questionado sobre sua indisposição de negociar com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), principal desafio da segurança no país. “Um policial não só pode em algumas circunstâncias matar, como deve matar”, afirmou.
Filósofo e matemático, filho de imigrantes lituanos e duas vezes prefeito de Bogotá, Mockus conseguiu em sua administração reduzir a taxa de homicídios pela metade. Também fez com que 15 mil cidadãos pagassem impostos voluntários à cidade. Entretanto, aqueles que o criticam à direita afirmam que ele não tem pulso firme para liderar um país em guerra, enquanto a esquerda avalia que suas propostas para as políticas sociais não são claras e sua posição diante dos países vizinhos é difícil de ser decifrada.
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Há dúvidas sobre sua capacidade de administrar um país em guerra, em que atuam as Farc, os grupos paramilitares insurgentes e os narcotraficantes. Como o senhor pensa enfrentar o tema segurança?
A presença da polícia e do Exército no território têm que ser mantida. O trabalho de inteligência e de uso muito racional e muito preparado de inteligência para enfraquecer as Farc têm de continuar. Não vamos por nenhum motivo retroceder às etapas em que a saída era a negociação. Acreditamos que as Farc talvez buscarão a negociação em algum momento, no caso de se enfraquecerem. Ainda assim teremos um dilema forte, ou seja, podemos escuta-las em que elas abandonem as armas? Temos que ser acima de tudo realistas, responsáveis com as consequências de nossas ações.
Mas sua disposição de não negociar com as Farc não vai contra o principal lema de sua campanha, que diz que a “vida é sagrada”?
Constitucionalmente, em todas as sociedades consideradas grandes, o Estado tem o direito de utilizar a força. Logo, a vida é sagrada e o Estado tem o monopólio do uso legítimo da força. O Estado pode colocar vidas em risco para salvar a vida de outros. Por isso o trabalho de policiais e soldados é tão delicado, pois podem usar a força. Um policia l não só pode em algumas circunstâncias matar, como deve matar.
Um candidato do Partido Conservador recentemente o criticou, dizendo que com mímicas e girassóis (o símbolo do partido verde) não se vence a guerrilha. Como o senhor responde a esta crítica?
Acredito que a pressão social pode ser somada à pressão militar, não a substituir. As grandes manifestações (contra as Farc) do início de 2008 foram exemplo de pressão social. Mas hoje há outra pressão menor, que pode fazer com que membros individuais das Farc se desmobilizem. Com os empresários meu diálogo é totalmente radical no sentido de que a guerra contra as Farc e com os grupos ilegais tem que ser conquistada de maneira limpa. Os métodos paramilitares, gangues, causam um problema que logo se torna mais grave. Causam um imbróglio que é mais problemático do que um remédio.
No ano passado, a Colômbia assinou um acor do que permite que aviões e funcionários do Exército norte-americano utilizem bases militares na Colômbia para apoiar operações antidrogas. O governo da Venezuela interpretou o acordo como uma ameaça sua soberania. O presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva disse que era uma situação “preocupante”. O senhor disse que manteria o acordo. Por quê?
O narcotráfico na Colômbia tem nos custado muito. A luta contra o narcotraficante na Colômbia é muito mais central do que é para o Brasil. O México passou a ter uma situação parecida com a colombiana, ou seja, o narcotráfico começa a ser um elemento de desestabilização cultural e política, que se infiltra no mais alto nível das instituições governamentais, começa a definir quem ganha as eleições. Então a Colômbia não pode ficar de mãos atadas diante da luta contra o narcotráfico e, claramente, pois o principal consumidor de droga e principal sócio d a Colômbia na luta contra as drogas são os EUA. Nós precisamos contar com a presença em território colombiano de aviões norte-americanos, de tripulações com pessoal norte-americano, em uma escala que esteja limitada, que esteja delimitada, pelos acordos atuais ou por outros acordos anteriores.
Mas não teme que este acordo gere mais tensões entre a Colômbia e seus vizinhos?
Os EUA são hoje nosso principal aliado na luta antinarcotráfico. Os países que criticam esta proximidade não têm oferecido uma ajuda similar nem têm a tecnologia suficiente. Enquanto encontramos outra maneira de eliminar o comportamento do narcotráfico do território da Colômbia, temos que ajudá-los com as bases. E sem as bases o país ficaria entregue às Farc, ou a uma aliança entre as Farc e os narcotraficantes.
Depois de firmado o acordo militar com os EUA, a Venezuela restringiu as relações comerciais com a Colômbia, suspendendo a importação de centenas de produtos colombianos. Durante este período, o senhor disse a um jornalista da imprensa local que “o que recuperaria emprego na Colômbia seria a normalização das relações com a Venezuela”. Então como pensa em melhorar essa relação bilateral, e em que acredita que errou o presidente Álvaro Uribe?
A única coisa que digo é que o presidente Hugo Chávez terá todo meu cuidado, todo meu respeito e não cabe a mim julgar se o presidente Uribe agiu bem ou mal. Até o dia 7 de agosto, o presidente Uribe é quem conduz as relações internacionais da Colômbia, e eu não devo fazer nada que perturbe essas relações.
Seu partido é relativamente novo. Nas eleições legislativas de março, conseguiu eleger apenas 5 de 102 senadores e 4 de 180 representantes na Câmara. Como governará sem ter maioria no Congresso?
Os partidos podem ser vistos como associações de interesses, [de pessoas] que se associam para pressionar conjuntamente, para conseguir coisas por meio da pressão, por meio da não cooperação. Este é o modelo atual. Ainda que o presidente tenha a maioria do Congresso, essa vantagem consegue extorqui-lo, pedindo-lhe cargos, contratos etc. Então, o que vamos fazer? Diremos não a essas pressões, seremos implacáveis, rígidos, como o seremos com as Farc. O parlamentar vai utilizar argumentos para defender interesses. Uma vez treinado para esta possibilidade, muitos provavelmente já têm esse treinamento, acabarão preferindo este modelo. Então, nosso modelo é o de não fazer pressões, zero troca de favores e total fé na capacidade de argumentação. Se o teu argumento é forte, eu mudo o projeto, se meu argumento é forte, peço que me apoie. Se não estamos de acordo e na discussão aparecem novas possibilidades, é a terceira opção que apoiaremos.
E o senhor acredita que isto funciona?
Quando era prefeito de Bogotá e não tinha maioria no Conselho, o Conselho nos bloqueou em alguns momentos. Não se vendeu a empresa local de telecomunicações e não se fez a reestruturação da administração pública. Há custos. Mas é muito mais difícil o modelo atual, que é muito mais próximo da corrupção.
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