A Promotoria-Geral da Colômbia pediu, na semana passada, a prisão de um militar acusado de participar do assassinato de índios Awá dentro de uma área de reserva, em 2006. A medida busca punir responsáveis por repetidos massacres que vêm ocorrendo contra a etnia na região. Mas lideranças do movimento indígena colombiano criticam a forma como as investigações vêm sendo conduzidas, em entrevistas ao Opera Mundi.
O presidente da organização Unidade Indígena do Povo Awá, Gabriel Bisbicus, disse que as investigações sobre massacres ocorridos este ano contra indígenas do sul do país desconsideram o contexto que está por trás das violações.
“O problema é que o estado não assume que existe na Colômbia um conflito armado que não tem nada a ver com os indígenas, mas tem chegado até o nosso território”, acusa.
Segundo Bisbicus, embora a atuação da promotoria local seja séria, os Awá estão preocupados porque a linha de investigação tem priorizado a teoria de que os conflitos resultam de questões internas aos índios.
“Eles têm detido e interrogado civis, gente aqui mesmo da região, dizendo que os crimes foram cometidos por gangues juvenis, ou por brigas internas entre os índios. Temos visto que se trabalha pouco em responsabilizar os grupos armados que existem por aqui, como o exército e os paramilitares”, conta.
Os Awá vêm sendo apanhados na linha de fogo entre as Farc, paramilitares e o exército colombiano. Todos os grupos armados têm repetidamente invadido e transitado dentro da terra indígena.
Em fevereiro, 11 Awá foram assassinados a facadas na reserva Tortugaña-Telembi. As Farc assumiram a autoria do crime e acusaram os índios de serem colaboradores do exército, em meio ao acirramento das batalhas dentro da terra indígena.
No dia 16 de agosto, 12 indígenas foram assassinados a tiros dentro da reserva Gran Rosario, no município de Tumaco. Entre as vítimas estavam quatro crianças e uma viúva, Tulia García, que havia denunciado a execução do marido por soldados do exército meses antes.
Gabriel Bisbicus se queixa de que muito pouco foi esclarecido até agora. “Ainda não sabemos quem está por trás da morte de Tulia García. Ainda não está claro se foi por retaliação, se foi um fato isolado, ainda não podemos afirmar porque há uma discussão muito forte”.
As organizações indígenas têm insistido que o massacre está ligado às denúncias que Tulia vinha fazendo. Seu marido, Gonzalo Rodríguez Guanga, foi morto por soldados na saída da reserva indígena e registrado como “baixa de guerra”, um caso típico de “falso positivo” – civis que são assassinados para serem contabilizados como guerrilheiros, inflando os números do exército.
“Vamos ter uma reunião em breve e vamos pressionar pra saber por que eles não checam as ligações com a força pública”, diz Bisbicus.
Segundo ele, o massacre levou cerca de 200 indígenas a se refugiarem na comunidade de Goycana, onde têm vivido em galpões improvisados, com medo de voltarem para sua casa. Outros 150 Awá já estavam em condição de refugiados na reserva Gran Sabalo desde fevereiro. Em julho, a reportagem do Opera Mundi visitou o local e constatou a situação precária.
Prisão preventiva
Na semana passada, a Promotoria determinou a prisão de um tenente do exército como co-autor de um massacre ocorrido em 2006 dentro do território indígena Awá, no departamento de Nariño, sul da Colômbia.
Em comunicado oficial, a Promotoria faz o pedido de prisão preventiva sem possibilidade de habeas corpus contra o tenente do exército Alberto Williams Echeverry, “por suposto envolvimento na morte de cinco membros da comunidade Awá durante enfrentamento que teria ocorrido entre tropas regulares e uma coluna das Farc”.
O massacre ocorreu em 9 de agosto de 2006 no território indígena que integra o município de Ricaurte, na fronteira com o Equador. Cinco índios Awá – Blanca Adelaida Ortiz, Marleni Pai Burbano, Segundo Jairo Ortiz Taicus, Juan Donaldo Moran e Jesús Mauricio Ortiz – foram registrados como mortos em combate.
Segundo a Promotoria, a investigação apontou também outro integrante do exército, o sargento Alexander Guerrero Castellanos, como autor do crime.
Segundo a Organização Nacional Indígena da Colômbia (ONIC), é preocupante “que não se tenha atuado com mais rapidez no processo e só se tenha determinado uma autoria quando o grau de impunidade é alarmante” e “que o acusado seja um agente do Estado, que reveria proteger os direitos humanos”. O comunicado da organização também afirma que a impunidade é ainda maior no caso dos povos indígenas, “que têm sido vítimas de vários massacres e assassinatos seletivos nos últimos anos”.
A série de eventos violentos tem levado a deslocamentos de índios em massa. Existem cerca de 30 mil Awá em 37 reservas no estado. A região é estratégica porque fica entre a cordilheira dos Andes e a costa pacífica, tendo a fronteira com o Equador ao sul. Muitas rotas do tráfico de cocaína passam por dentro desse território.
Em janeiro deste ano, a Corte Constitucional Colombiana julgou que o povo Awá é uma etnia seriamente ameaçada de extermínio por causa da guerra. Outros 33 povos nativos colombianos também correm o risco de desaparecer por causa do conflito, segundo o tribunal.
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