Na casa onde Manuel Zelaya foi capturado em 28 de junho, um pequeno cartaz com uma silhueta de chapéu e a frase “Mel somos todos” está colado na porta. Xiomara Hortensia Zelaya, a “Pichu”, filha do presidente deposto, chega poucos minutos depois. Embora esta seja sua casa há 10 anos, ela não quer dormir lá. Guarda más recordações da madrugada em que sequestraram seu pai enquanto ela, em seu quarto, escutava tudo.
Assim que Pichu entra, um cãozinho se emociona com sua chegada. A primeira pergunta, “Como se explica que Pichu cante canções de Silvio, que entoe Nos tienen miedo porque no tenemos miedo nas passeatas e agarre um megafone para animar a resistência nas ruas, vindo de uma família burguesa e acomodada com a sua?”, é respondida de forma simples.
“Meu pai herdou terrenos, gado, empresas, e administrou tudo com sucesso, mas não nos educou dentro de uma bolha. Constantemente nos fazia enxergar a realidade do país, colocava nossos pés no chão. Sempre percebeu as injustiças de nossa sociedade e trabalhou para eliminá-las.”
Ela mostra recortes de jornal. “Mel é um cipote (garoto) anarquista?”, perguntava uma manchete em 1985. O então deputado Manuel Zelaya exigia que o governo reconhecesse a presença dos Contras nicaraguenses em Honduras e que os expulsasse. “Aumento do salário mínimo. Uma democracia participativa com mais poder para a população. Controlar o preço dos combustíveis” – promessas da campanha presidencial de 2005. E mais centenas de exemplos como estes, todos encadernados com carinho pela família de Mel, mostrando que o presidente já defendia melhorias sociais antes de se aliar a Hugo Chávez e pender para a esquerda.
Leia mais:
Zelaya virou persona non grata na elite hondurenha ao se aproximar de Chávez e Fidel
Por alguns momentos, Pichu deixa de ser filha e se transforma em militante. “Todos os atos de governo pelos quais tanto se criticou meu presidente não são mais que suas promessas de campanha cumpridas”, afirma.
Rotina na embaixada
“Só posso vê-lo durante quatro horas aos domingos. Levo-lhe comida que eu mesma preparo”. Pichu faz uma pausa e, rindo, explica: “Fazem muitas brincadeiras, questionando se a comida lhe faz bem ou não.” E continua: “Já não lhe perguntamos o que vai fazer, como está a situação, o que ele pensa desta ou daquela pessoa. Tratamos de desligá-lo dos problemas cotidianos, levamos Irene, sua neta de quatro anos, que o domina completamente, contamos como ela se comporta agora que nasceu seu irmãozinho, em 30 de setembro. E coisas assim.”
Zelaya está certo de que voltará à presidência em breve por meio do diálogo. Foi o que ele disse a Pichu. “Sei que será assim. Meu pai sempre cumpre o prometido.”
NULL
NULL
NULL