Vinte anos após a assinatura dos Acordos de Paz entre o governo de El Salvador e a FMLN (Frente Farabundo Martí para a Libertação Nacional) em 16 de janeiro de 1992, na cidade mexicana de Chapultepec, algumas feridas geradas pela guerra civil (1980-1992) persistem abertas. Hoje governado pelo esquerdista Mauricio Funes, El Salvador ainda trabalha para extinguir fantasmas e se reconciliar.
Efe
Foto de arquivo mostra o nicaraguense Daniel Ortega e os 10 comandantes da FMLN em Chapultepec
“Não houve indenização pelos danos morais e materiais das vítimas da guerra. O sistema de impunidade não foi desmontado, ainda há pessoas que são responsáveis por a atos de abuso de poder ou corrupção que são intocáveis em El Salvador”, disse ao Opera Mundi Nidia Díaz, ex-comandante da FMLN que esteve em Chapultepec.
Um dos casos mais emblemáticos foi o assassinato de seis sacerdotes jesuítas em 16 de novembro de 1989 por um comando militar, que invadiu o campus da Universidade jesuíta UCA e matou o reitor, o espanhol Ellacuría. O esquadrão também atacou os sacerdotes espanhóis Ignacio Martin Baró, Juan Ramón Moreno, Segundo Montes, Armando López e o salvadorenho Joaquín López y López, assim como duas de seus colaboradoras, Julia Elba e Celina Ramos.
Efe
Placa em homenagem aos sacerdotes mortos em 1989 em El Salvador, durante a guerra civil
Recentemente, o CSJ (Supremo Tribunal Federal) rejeitou o pedido de prisão de 19 soldados acusados do crime, porque considerou que o processo “reabriria feridas do passado”. A decisão causou revolta no país. Pais, mães e filhos de combatentes ainda esperam que o governo inicie uma comissão da verdade para que os responsáveis pelos crimes seja punidos.
Entre as vítimas do conflito está Guadalupe Mejía, que aos 68 anos ainda chora ao se lembrar do assassinato do marido pelo exército. Sua voz fraqueja ao recordar a tortura que ele sofreu antes de ser morto. Neste 16 de janeiro ela diz que há mais dívidas do que progressos. “Os anos vão passando e a questão da reparação às famílias ainda está muito atrasada. O processo começou há 20 anos. Com este governo houve um avanço, mas foram apenas conversas”, afirmou Mejía.
Laura Escobar, engenheira industrial desempregada de 29 anos, diz que, apesar de o governo e partidos políticos anunciarem celebrações para hoje, ela não irá comemorar a assinatura dos Acordos de Paz. “Acho que eles foram assinados apenas por interesses políticos. Hoje que menos existe é paz. Não acho que seja importante lembrar o que foi sofrido na guerra “, disse.
Efe
Feridas abertas: veterano do exército que lutou na guerra civil salvadorenha exige benefícios do governo
Para Laura, o país não tem feito progressos na erradicação das causas do conflito armado, já que as enormes brechas da desigualdade social ainda são persistentes na vida dos salvadorenhos. A taxa de desemprego está em 7,3% e o crescimento líquido da nação em 2011 foi de 1,7%, depois das reduções da instabilidade financeira global e das consequências dos fenômenos climáticos. Além disso, a violência generalizada deixou uma média de 12 homicídios por dia e centenas de casos de extorsão, atribuído principalmente às gangues e traficantes de drogas.
Em 2009, Funes se tornou o primeiro presidente de esquerda desde que a FMLN se converteu em um partido político. Dois anos atrás, ele pediu desculpas em nome do governo salvadorenho por todos os crimes e violações cometidos durante o conflito. A ação foi rechaçada pela direita do país.
Para Mejía, não se pode falar de reconciliação nacional no país quando há vítimas que em 20 anos não receberam qualquer atenção psicosocial após o conflito. “Elas [vítimas] estão sozinhas, estão morrendo, as mães ainda esperam que seus filhos irão chegar, que irão sentir seu perfume. Elas dizem que os vêem nos ônibus e é uma tortura, é difícil de suportar.”
NULL
NULL
NULL