Uma das primeiras ações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2010, após voltar das férias na próxima segunda-feira (11), deverá ser a escolha definitiva do fornecedor dos 36 caças para a FAB (Força Aérea Brasileira). A avaliação é do assessor especial para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia.
Quatro meses após Lula ter anunciado a preferência do governo pelo Rafale, da empresa francesa Dassault, o debate voltou a esquentar o cenário político. O jornal Folha de S.Paulo revelou na terça-feira passada que o relatório técnico da FAB teria uma avaliação contraria à do presidente. Segundo o informe, a classificação feita pelos militares colocaria o Gripen NG, da sueca Saab, em primeiro lugar, seguido pelo F-18 Super Hornet da norte-americana Boeing. O Rafale de Dassault chegaria na terceira e última posição.
O principal argumento da FAB seria o preço. “Já que os três caças são ótimos para o Brasil, porque não pegar o mais barato?”, questionou em conversa com o Opera Mundi a jornalista Eliane Cantanhêde, responsável pela revelação do conteúdo do informe. “Como Lula vai justificar que ele compra um avião pelo dobro do preço e o dobro do custo de manutenção? Só porque existe um acordo entre Lula e Sarkozy? Mas o Lula vai embora no final do ano, e o Sarkozy depois”, seguiu, lembrando que a vida de um caça dura 30 anos.
“O presidente Lula levará em conta a opinião do ministro da Defesa e o relatório da FAB, mas a decisão é exclusivamente dele”, pontuou Garcia ao Opera Mundi. “Não se trata de ir um shopping e comprar um helicóptero, um submarino. A decisão é conseqüência de uma estratégia, que tem como objetivo principal construir uma indústria de defesa nacional”.
Revólver sem balas
Segundo Garcia, quando o governo insiste em repetir que é uma decisão política, “isso não significa favorecer amigos”. “É uma escolha política que tem a ver com a utilização soberana dos equipamentos comprados”.
O governo brasileiro quer evitar o problema vivido por vários clientes dos Estados Unidos, que foram impedidos de desenvolver seu material militar. Foi o caso do Chile, que adquiriu 18 aeronaves F-16 da Boeing, mas sem direito de acesso aos equipamentos para o lançamento de mísseis modernos, seguindo uma exigência de Washington.
Sem querer citar nenhum país, Garcia confirma que esse é o temor do Brasil. “A gente não quer comprar um revólver sem ter acesso às balas”. A outra preocupação do governo é a possibilidade de construir a maior parte dos caças no país, assim como vendê-los para quem quiser.
Há cinco anos, um contrato de venda de aviões Supertucanos (fabricados pela empresa brasileira Embraer) para a Venezuela foi cancelado por causa de um veto dos EUA, já que a aeronave tem um componente norte-americano. O Congresso em Washington pode proibir a venda desse produto a clientes vistos como “pouco amistosos”.
Política externa
O especialista em questões militares Pedro Paulo Rezende confirma a preocupação. “Se o Brasil optar pelos aviões da Boeing, então pode esquecer qualquer possibilidade de vendê-lo à Venezuela”. Para ele, o problema se estende ao Gripen, cujo motor é também de origem norte-americana. “Isso significaria seguir dependendo dos EUA”, assegura Rezende, que é assessor da comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado .
Garcia diz que a diretoria da Saab, ciente desse problema, especificou recentemente que poderia trocar o motor norte-americano por um componente britânico. Dado o alinhamento quase total de Londres com Washington em relação à política externa, o argumento parece não ter convencido o assessor especial.
O governo não está, porém, insensível à questão financeira. “É verdade que o Rafale é caro, queremos conseguir novas quedas no preço. Acredito que vamos negociar até o último momento”, revelou Garcia. O diferencial de custo é provocado pela valorização da moeda européia em comparação com o dólar.
“A proposta francesa é 30% mais cara, seja para a compra ou para a manutenção dos equipamentos”, calcula Rezende. É um peso importante para a FAB, acostumada a restrições orçamentárias muito rígidas.
Equipamentos obsoletos
Rezende lembra que a novo plano militar acabou com essas limitações. “No ultimo orçamento, ficou claro que não tinha mais limites para as compras de material para as forças armadas.”
“Qualquer que seja a solução final, vai melhorar muito a situação da aeronáutica brasileira, que é muito obsoleta”, analisa Garcia. “Não existe uma corrida armamentista na América Latina. Na maioria dos países os equipamentos eram muito antigos”, acrescenta.
De acordo com o assessor presidencial, o Brasil precisa de forças armadas modernas para pleitear a um papel diplomático maior. “Se tivermos forças armadas, elas têm que ser equipadas corretamente. Não vejo o interesse de manter forças armadas só para os desfiles militares. Até porque, no Brasil, temos desfiles muitos mais divertidos!”, conclui, rindo.
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