Ainda que a improvisada pista de corridas na Universidade de Istiklal, em Jericó, esteja lotada, não se vê nenhuma mulher entre a multidão. O ambiente exala testosterona. No entanto, isso não parece afetar as “Speed Sisters”, que competem neste campeonato local de carros de corrida e esperavam a vez para sair “queimando pneu”.
Susana Mendoza/Opera Mundi
A pilota palestina Mona Ennab (de macacão laranja) aguarda a vez para correr em pista montada em universidade de Jericó
As quatro palestinas, muçulmanas e cristãs, estão dando o que falar na Cisjordânia, para o bem e para o mal. Entre 21 e 31 anos, o sonho delas é competir em corridas profissionais. O troféu máximo seria a Fórmula 1, contam. “Como corremos há bastante tempo, as pessoas já se acostumaram, embora ainda haja gente que não goste. Pensam que não é lugar de mulher, acham perigoso”, explica ao Opera Mundi Mona Ennab, enquanto espera a vez ao lado do carro, adornado com listras vermelhas.
Ela conta que, no começo o pai se opôs à ideia, mas logo percebeu que esse era seu sonho. A família o acompanhou na decisão. “Mas ainda há muitas pessoas que nos criticam, inclusive com insultos”, diz Mona. “Acredito no que faço. Por meio da corrida reivindico os direitos das mulheres palestinas, o direito de decidir sobre sua vida”, completa a jovem, vestindo um ajustado macacão laranja e preto.
As “Speed Sisters” são a primeira equipe feminina de carros de corrida do Oriente Médio. Ainda que existam outras mulheres árabes no esporte, nenhuma obteve tanto destaque na mídia. “Somos uma raridade. Temos muitos fãs entre os homens também. Para eles há o ingrediente erótico: quatro mulheres usando macacões e dirigindo em alta velocidade”, ri Mona.
Machismo
Apesar da resistência que ainda podem encontrar na conservadora sociedade palestina, as quatro mulheres asseguram que, apesar do rechaço inicial, encontraram muito apoio entre seus companheiros desde que decidiram formar a equipe, dois anos atrás.
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A ideia de formar o grupo partiu do Consulado britânico em Jerusalém. O Consulado comprou o primeiro carro de corridas e convidou uma conhecida instrutora de rallies inglesa, Ellen Elstrop, para que ensinasse as quatro a dirigir esse tipo de veículo. Desde então, as “Speed Sisters” ficaram conhecidas e começaram a participar de competições na Cisjordânia e na Jordânia.
“É sempre difícil abrir espaço, principalmente nesse mundinho tão machista. No começo, tivemos problemas com colegas de profissão, que não queriam competir contra mulheres, mas agora que viram que somos profissionais, nos respeitam”, comenta Noor Daoud, outra integrante da equipe.
Mesmo a incompreensão do pai e da família não conseguiram frear Noor. Ela, inclusive, se animou para competir no ano passado na primeira corrida de carros oficial de Israel, ficando em terceiro lugar. A pilota, que nasceu em Jerusalém, pôde competir, já que seu documento de identidade é de Israel.
Susana Mendoza/Opera Mundi
Mona esquenta os motores antes da largada em Jericó: “por meio da corrida reivindico os direitos das mulheres palestinas”
Betty Sa'ade, uma loira exuberante de 31 anos, garante não ter encontrado nenhum obstáculo em sua carreira pelo fato de ser mulher. “Nunca nada negativo. Tenho seguidores por todo o mundo, até em Israel. Mas eles não podem vir ver as corridas, por estarem proibidos de entrar na Palestina”, lamenta a Lewis Hamilton feminina.
O quarto membro do grupo, Marah Zahalka, é mais jovem, com 21 anos. A caçula do grupo foi a que despontou mais cedo para a profissão. Na adolescência começou sua paixão por carros. Quando cumpriu 18 anos e pôde tirar a licença para dirigir, decidiu competir em corridas profissionais.
Apesar de Jenin, povoado natal de Marah, não ser o cenário perfeito para praticar corridas de carros, a jovem conseguiu conquistar seu espaço com base na determinação. “Recentemente nos convidaram para visitar um campeonato na Inglaterra, mas gostaríamos de competir”, diz Marah, enquanto se apressa em direção ao carro.
Torcida
Apesar do calor em Jericó, que pode chegar a 50 graus, centenas de fãs se aglomeram para torcer pelos pilotos. Ainda que o desempenho das “Speed Sisters” não tenha sido tão bom como o dos outros companheiros, ouvem-se assobios de apoio.
No momento, a competição é apenas um hobby para as quatro mulheres, que têm trabalho estável e dedicam seu tempo livre para praticar. Mas o sonho das meninas é conseguir se dedicar de maneira profissional a este esporte e competir nas corridas da Fórmula 1. Enquanto segue atenta à atuação de Noor na pista, Mona faz brincadeira sobre seu futuro: “Por que não Le Mans ou no Dacar?”.